Opinião | Prefeito, é hora de ampliar o sucesso das creches

Prefeitura de São Paulo tem a oportunidade de inaugurar um novo estágio, mais inclusivo, abrangente e avançado, nas políticas de acolhimento à primeira infância

Por Rubens Naves

Até 2017, a capital paulista convivia com uma longa e permanente fila de famílias à espera de vagas em creches. Nos últimos anos, a cidade tornou-se um exemplo de efetivação desse direito constitucional das crianças brasileiras. De acordo com um levantamento divulgado em agosto, baseado em dados da Pnad 2023, São Paulo é a capital brasileira com maior porcentual das crianças de 0 a 3 anos atendidas em creches (66%). Uma história de sucesso.

Para a sociedade, não há melhor investimento que o dirigido à proteção, acolhimento, cuidado e desenvolvimento das crianças. Avanços nessa área combinam atendimento de direitos humanos e constitucionais, valorização das famílias, redução de violência e desigualdade, democratização de oportunidades, progresso pessoal, comunitário e socioeconômico. Uma causa, portanto, que une todas as pessoas de boa vontade, qualquer que seja a sua localização no espectro político-ideológico.

O desafio de zerar a fila de espera acolhendo todas as crianças cujas famílias requerem vagas em educação infantil está praticamente superado. A Prefeitura informa que para o ano letivo de 2025 há mais 349 mil vagas para uma demanda de matrículas que hoje se encontra na casa de 279 mil. Mesmo sendo provável o aumento das matrículas e solicitações de vagas, a margem ainda ociosa deve garantir o atendimento de toda a demanda ativa.

Nesse cenário, a Prefeitura tem a oportunidade de inaugurar um novo estágio, mais inclusivo, abrangente e avançado, nas políticas de acolhimento à primeira infância. E uma administração recém-reeleita, experiente e com quatro anos de gestão pela frente pode fazer da cidade uma referência para o Brasil. E o caminho mais sensato e seguro de rumar nessa direção é atualizar e aprimorar a fórmula bem-sucedida criada sete anos e alguns meses atrás.

Em 2017, a partir de decisões judiciais, a Prefeitura e uma articulação de representantes das crianças e suas famílias (incluindo entidades da sociedade civil, Defensoria Pública, Ministério Público e advocacia engajada na causa) desenvolveram, sob a supervisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), um plano de expansão da rede de atendimento para zerar o déficit inicial de mais de 150 mil vagas em creches e na educação infantil.

Em acordo posterior, além do monitoramento do aumento do número de vagas por parte de entidades envolvidas, foram acrescidos critérios de qualidade do atendimento prestado. Cumprido por administrações de quatro diferentes prefeitos e três partidos políticos, o arranjo provou que a promoção de desenvolvimento humano e social pode avançar rapidamente, com sinergia entre sociedade civil, Executivo e sistema de Justiça, disposição inovadora focada em resultados e manutenção, por sucessivas gestões, de acordos e políticas públicas eficazes.

O caso da célere expansão das vagas públicas em creches virou propaganda de governo e trunfo eleitoral. Um bom sinal, pois a valorização de políticas públicas importantes e exitosas é boa para a sociedade e a democracia. Numa realidade complexa em constante mudança, como a de uma metrópole, entretanto, a continuidade de sucessos desse tipo demanda atualizações, aperfeiçoamentos e gestões que saibam diferenciar entre o que deve ser mantido e quando é preciso reavivar a disposição inovadora.

No caso da educação infantil, a evolução do cenário pede o alargamento da concepção e das metas de inclusão social – por meio da busca ativa de famílias e crianças ainda não atendidas e de direcionamento de investimentos que viabilizem esse atendimento (como a criação de novas creches nas regiões onde existe demanda invisibilizada). Também é preciso avançar na qualidade do atendimento prestado: cabe à Prefeitura aperfeiçoar os serviços, ampliar e atualizar os parâmetros de avaliação.

Uma terceira forma de fazer do atendimento nas creches um fator ainda mais potente de desenvolvimento social é a ampliação e fortalecimento da sua articulação e sinergia com outras políticas públicas de amparo à primeira infância e às famílias.

Para formular e tocar uma nova fase – mais avançada – de atendimento às necessidades das crianças e famílias paulistanas, a Prefeitura pode contar com as entidades e especialistas que ajudaram a construir os entendimentos de 2017 e a monitorar a sua implementação. Aquele pacto nasceu da ampla mobilização ensejada por uma audiência pública promovida pelo Poder Judiciário de São Paulo – chamamento que hoje, novamente, é a melhor forma de inaugurar um novo círculo virtuoso de diálogo e colaboração focado em resultados efetivos para a população.

Com a liderança da gestão municipal e a participação de outras entidades públicas e da sociedade civil, é hora de avaliar os resultados já conquistados, identificar os avanços necessários e começar logo o trabalho de aperfeiçoamento de um sistema de acolhimento às crianças que pode, em breve, se tornar exemplo e referência para o Brasil.

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ADVOGADO, CONSELHEIRO E EX-PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO ABRINQ, É INTEGRANTE DO COMITÊ DE ASSESSORAMENTO DA COORDENADORIA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE DO TJSP

Opinião por Rubens Naves

Advogado, conselheiro e ex-presidente da Fundação Abrinq, é integrante do Comitê de Assessoramento da Coordenadoria da Infância e Juventude do TJSP