A volta dos EUA ao Acordo de Paris reforça o multilateralismo diante de um tema que afeta todos os países. Juntamente com China, Índia e União Europeia, representam quase 50% das emissões globais de gases de efeito estufa (GEEs). O Brasil responde por 3%.
O ano de 2021 marca o início da contabilização das ações nacionalmente determinadas (NDCs) dos países no Acordo de Paris. E as negociações a caminho da COP-26, em Glasgow, têm como maior desafio definir como será o novo mercado de carbono.
Em paralelo, discute-se como aumentar a ambição das metas para limitar o aumento da temperatura em, no máximo, 1,5 grau Celsius. Mais de cem países já anunciaram compromissos de neutralidade de emissões até 2050. Para a China isso deverá ocorrer até 2060.
Considerando o envolvimento histórico do Brasil na agenda climática, as expectativas quanto à participação brasileira na Leaders Summit on Climate, convocada pelo presidente Joe Biden para os dias 22 e 23 de abril, bem como na COP-26, são enormes.
O aumento do desmatamento, a falta de uma política estratégica para coibir desmatamento ilegal e a interrupção do Fundo Amazônia ensejam pressões de várias frentes. Vale lembrar que o compromisso voluntário de reduzir desmatamento na Amazônia até 2020 não foi alcançado.
A NDC enviada em 2020 confirmou a meta de reduzir 43% das emissões até 2030, e apontou que é factível buscar a neutralidade até 2060, condicionada ao recebimento de US$ 10 bilhões por ano. No entanto, não trouxe sinalização alguma quanto às estratégias e políticas que serão adotadas para tanto.
As negociações em curso, na expectativa de receber recursos a fim de manter as florestas, parecem restringir a agenda climática brasileira no afã de captar recursos para controlar desmatamento.
A experiência de financiamento climático mostra que é preciso implementar políticas consistentes para usufruir os recursos que, de acordo com as regras da Convenção, devem ser repassados pelos países desenvolvidos aos países em desenvolvimento.
A aposta no mercado de carbono florestal é prematura. Depende, por exemplo, do apetite pela compra de créditos florestais e de definições sobre o artigo 6.º do Acordo de Paris. Vale ponderar que a demanda de créditos de carbono, incluindo o mercado voluntário, exigirá salvaguardas e políticas que assegurem integridade ambiental.
Flertar com esse mercado é uma estratégia arriscada. Basta ver, por exemplo, que em 2019 o mercado voluntário de carbono florestal movimentou perto de US$ 159 milhões.
É inegável que a extensa área de vegetação nativa é um ativo do Brasil e existe financiamento climático que poderá voltar a ser canalizado para fomentar não somente o combate ao desmatamento ilegal, mas ações que favoreçam e impulsionem o desenvolvimento das regiões com florestas.
Mas o Brasil tem muito mais do que florestas na agenda climática. Até a COP-26 o País deveria apresentar um conjunto de estratégias voltadas para implementar suas ações levadas ao Acordo de Paris. Espera-se isso das partes.
O RenovaBio é um ótimo exemplo de política climática, pois visa a incentivar a produção e o consumo de biocombustíveis e contempla a precificação positiva de carbono como forma de catalisar esse mercado.
O Plano Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano ABC), em revisão pelo Ministério da Agricultura, merece ser apresentado como a estratégia da relação entre agropecuária e mudanças do clima. As tecnologias e práticas do Plano ABC já cobrem mais de 60 milhões de hectares e seu papel para impulsionar a produção sustentável vai além da redução de emissões, pois permite aumentar produtividade, aprimorar práticas produtivas e favorecer a adaptação dos sistemas produtivos a eventos climáticos adversos.
A agenda de energias renováveis, da qual o Brasil é líder, merece destaque. A participação de fontes renováveis na matriz elétrica foi de 83% em 2019, com crescimento significativo das fontes eólica e solar. A geração de bioeletricidade com bagaço e palha de cana-de-açúcar, além de outras fontes de biomassa, tende a crescer.
O tratamento de dejetos é outra agenda em evolução. Biogás e biometano produzidos com resíduos de suínos, de frangos, de citricultura e vinhaça potencializam a agenda de energias renováveis, um enorme ativo no debate climático global, que tem a maior fonte de emissões global justamente no setor de energia (73%).
A reunião em Washington pretende elevar o tom e os compromissos políticos quanto à urgência climática. A estratégia brasileira deve ser alicerçada no capital que o País traz para o debate global sobre neutralidade de emissões.
É preciso planejar e pôr na mesa as estratégias e políticas que permitirão navegar no multilateralismo climático, receber recursos, participar do mercado de carbono, criar projetos que fomentem mitigação e adaptação, atrair investidores e comprovar que, sim, o Brasil contribui para o esforço de combate ao aquecimento global.
SÓCIO-DIRETOR DA AGROICONE. E-MAIL: RODRIGO@AGROICONE.COM.BR