Todas as classes de renda foram atingidas pela inflação mais acelerada em setembro. Para os grupos mais abonados, as perdas foram causadas principalmente pela alta da gasolina e das passagens aéreas e pelo encarecimento dos serviços pessoais. As famílias mais modestas foram afetadas mais duramente pelos aumentos de preços da alimentação e da energia elétrica e pela majoração dos aluguéis. O custo social da inflação foi portanto maior que nos meses anteriores, embora os custos ainda tenham subido menos para os consumidores pobres, como indica a análise mensal publicada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Um discreto sinal de alerta havia aparecido na semana anterior, quando foi conhecida a inflação oficial de setembro. No mês passado, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subiu 0,48%, depois de haver caído 0,09% em agosto. Com o novo impulso, a variação em 2018 chegou a 3,34% e a alta acumulada em 12 meses bateu em 4,53%, superando ligeiramente a meta anual de 4,5%.
Apesar da aceleração, causada principalmente pelo aumento de preços dos combustíveis, o mercado continuou projetando a manutenção da taxa básica de juros em 6,50% no fim de outubro, na próxima reunião do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC). O alerta deve permanecer ligado, mas, se continuar discreto, esses juros provavelmente serão confirmados na última reunião do ano, em dezembro. Os detalhes trazidos pela análise do Ipea mostram, no entanto, um quadro pouco mais feio que o exibido com a divulgação do IPCA.
Em setembro, a inflação foi inferior a 0,40% para as três classes mais pobres - de renda muito baixa, baixa e média-baixa. As taxas foram 0,34%, 0,36% e 0,39%. Todas foram superiores às de julho e agosto. Em julho, a maior variação foi de 0,29%. No mês seguinte, os números foram todos negativos. Em 12 meses, a inflação das famílias de renda média-baixa atingiu 4,25%. As dos grupos inferiores foram menores.
Os seis estratos considerados na análise do Ipea foram definidos com base em níveis de renda de 2009. No caso das três faixas mais pobres, a renda familiar máxima corresponderia a R$ 2.250. Essas famílias gastam proporcionalmente mais com alimentos do que aquelas com ganhos mensais médios e altos. De modo geral, quanto mais pobre a família, maior o peso dos alimentos em seu conjunto de gastos e, naturalmente, menos variada é sua lista de compras.
Desde o começo dos anos 1990 as instituições de pesquisa de preços, como o IBGE, a FGV e a Fipe, mudaram várias vezes a ponderação dos itens componentes do orçamento familiar. Isso é explicável basicamente por dois fatores. O primeiro é o ganho de produtividade da agropecuária. Desde os anos 1980 aumentou muito a eficiência da produção de alimentos. Como consequência, os preços da comida caíram em relação aos demais. Comer ficou mais barato. O outro grande fator foi a alteração do pacote de bens e serviços tipicamente consumidos. A inclusão do telefone celular entre os bens de milhões de famílias dá uma ideia da transformação.
Apesar das mudanças, os diversos itens continuaram com participações diferentes nas diversas classes de orçamentos. A alimentação, embora muito mais barata que há 30 anos, permanece como item de grande peso para as famílias mais pobres. Por isso, uma agropecuária eficiente, bem financiada e sem entraves para produzir, transportar e vender continua essencial para o dinamismo econômico e para a distribuição social do bem-estar.
As autoridades negligenciaram esse dado, quando aprovaram a criação legal do cartel do frete, impedindo produtores e transportadores de negociar livremente o custo do transporte rodoviário. Preços abaixo da tabela oficial são proibidos e a violação dessa norma pode resultar em punição. O cartel do frete prejudica a produção, a exportação, o abastecimento interno e o bem-estar principalmente dos pobres. O novo governo fará um bom trabalho inicial se negociar com o Congresso o fim dessa aberração.