O relator da reforma tributária na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), finalmente apresentou o relatório preliminar que será submetido aos deputados. Até a votação, prevista para ocorrer na primeira semana de julho, o texto deverá ser “espancado” e modificado para contemplar os interesses do setor produtivo e dos entes federativos. O debate é sempre necessário e bem-vindo, mas não será possível avançar se cada uma das partes não aceitar ceder. Isso seria lamentável, tendo em vista que se trata da melhor chance em anos de rever as disfuncionalidades que se tornaram marca do sistema tributário nacional.
Como esperado, a proposta de Ribeiro propõe a fusão de cinco tributos federais, estaduais e municipais que incidem sobre o consumo em um novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual, com uma parcela administrada pelo governo federal e outra por Estados e municípios. Ele terá uma alíquota única como regra geral, que será 50% menor para alguns setores, como saúde, educação, transporte público coletivo, medicamentos e produtos do agronegócio. Alguns segmentos ficarão isentos; outros terão um imposto seletivo para desestimular o consumo. Acertadamente, Ribeiro não definiu as alíquotas do imposto, discussão que já inviabilizou reformas anteriores, e deixou essa etapa para uma fase posterior.
O maior desafio, como já se imaginava, será a obtenção do apoio dos governadores à proposta. Para viabilizar a reforma, a União está disposta a aportar, no máximo, R$ 40 bilhões anuais para compensar as perdas de Estados e municípios. O dinheiro serviria para bancar os benefícios convalidados, que correspondem a incentivos tributários dados no passado, no âmbito da guerra fiscal, e que continuarão em vigor até 2032, e para o custeio do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), cuja intenção é reduzir desigualdades regionais.
Os Estados, por sua vez, querem mais recursos – no mínimo, R$ 75 bilhões anuais da União. Há resistências, também, ao comitê de gestão compartilhada da arrecadação e à divisão dos recursos entre os entes federativos. O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, quer que o comitê cuide apenas das receitas geradas por operações interestaduais. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado, teme que os Estados percam autonomia. “Não queiram dizer a mim, que fui eleito pelo voto, que eu viva de mesada. Não vou viver”, disse, em entrevista ao Estadão.
Chama a atenção que as divergências em relação à proposta de reforma tributária não venham dos Estados mais pobres, mas daqueles que figuram entre os mais ricos do País. Isso mostra que sua prioridade é não perder recursos, uma disposição que não condiz com o espírito de uma reforma tributária ampla como a que o País precisa, em que cada um perde um pouco para que todos ganhem ao final.
Já ficou claro que o País não terá a reforma perfeita, mas a reforma possível. Se a intenção fosse simplificar a tributação sobre bens e serviços, o correto seria insistir no IVA único, e não no dual, que já foi uma concessão do governo federal. Ademais, regimes especiais como o Simples e o da Zona Franca de Manaus serão mantidos, embora seus efetivos resultados nem sempre compensem seus custos.
Ainda assim, não há dúvidas de que a proposta apresentada pela Câmara já seria muito melhor que o sistema atual. Entre as suas muitas vantagens está a garantia de que não haverá mais cumulatividade, ou seja, que os contribuintes não mais pagarão tributo sobre tributo, e ainda poderão aproveitar esses créditos para abater sua fatura final. Isso, por si só, já seria um excelente motivo para aprová-la, mas há outros.
Por isso, como disse o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), os governadores precisam ser pragmáticos para permitir o avanço da proposta, deixando divergências e detalhes para as etapas seguintes. “Ninguém vai ter, Caiado, a reforma ideal. É um apelo que eu faço”, afirmou Lira, segundo reportagem do Estadão. O apelo não é só de Lira, mas de toda a sociedade brasileira. É hora de os governadores cederem também.