Durou cerca de 24 horas a proposta de solução do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, para um problema de décadas. A decisão de remover a população do Jardim Pantanal, na zona leste da capital paulista, a pretexto de resguardá-la dos alagamentos recorrentes no bairro, foi adiada após seu padrinho político, o governador Tarcísio de Freitas, pedir mais “cautela” na formulação de projetos para a região.
O Jardim Pantanal, erguido na várzea do Rio Tietê nos anos 1980, está debaixo d’água há quase uma semana. E não é de hoje que basta cair uma chuva mais forte sobre a cidade para que o lugar inunde. No episódio mais grave, registrado em 2009, o Jardim Pantanal ficou mais de um mês alagado. Agora, com ruas transformadas em canais e casas tomadas pela água novamente, o prefeito resolveu falar em remoção, uma ideia tão simplista quanto equivocada.
Segundo Nunes, a Prefeitura realizou um estudo prévio para a construção de um dique de contenção do Rio Tietê na área afetada. A obra, contudo, não poderia ser realizada, na visão do prefeito, em razão do seu custo, da ordem de R$ 1 bilhão. Ademais, para Nunes, seria ocioso “lutar contra a natureza”.
No mesmo dia em que anunciou a ideia, Nunes se reuniu com Tarcísio para discutir o drama do Jardim Pantanal. Na ocasião, foram apresentadas três propostas de intervenção no bairro elaboradas pela Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras (Siurb). A melhor solução para o problema crônico dos cerca de 45 mil paulistanos que vivem no Jardim Pantanal, de acordo com o prefeito, seria removê-los de suas casas e deixar para trás suas histórias e seus vínculos afetivos, comunitários e econômicos, dando-lhes em troca uma “ajuda financeira” de R$ 20 mil a R$ 50 mil. Essa ação, porém, custaria quase R$ 2 bilhões ao erário – o dobro, portanto, do custo de construção do dique que o prefeito havia rejeitado um dia antes.
Outras duas propostas preveem obras de macrodrenagem a fim de manter os moradores onde estão – e a um custo menor para a Prefeitura de São Paulo. Por isso, no dia seguinte, em conversa com jornalistas, coube ao governador do Estado recomendar prudência, com toda a razão, na análise desses projetos. “Se a gente adotar, na pressão, uma solução que seja simplista, provavelmente a gente vai dar uma resposta errada”, disse o governador.
Diante de tanta incerteza, o prefeito Nunes afirmou que está “avaliando possibilidades” e que não havia “nada definido” sobre o que fazer no Jardim Pantanal. Por ora, o trabalho será focado em ações de assistência emergencial. A definição de um projeto definitivo para a região foi prometida para abril.
O que a Prefeitura poderia fazer de imediato é concluir as obras de drenagem no Jardim Pantanal que estão atrasadas há mais de um ano. Enquanto sofre, a população local espera pela instalação de um pôlder, espécie de muro para conter a água, lançá-la num reservatório e depois escoá-la por um córrego. Estivesse de pé, decerto essa estrutura teria ao menos atenuado os efeitos da última enchente.
Os alagamentos na região e em outras áreas da metrópole tendem a aumentar diante dos eventos climáticos cada vez mais extremos e recorrentes. Isso exigirá políticas públicas habitacionais e ambientais bem estruturadas, e não o improviso com que Nunes anunciou o fim de um bairro para dizer, um dia depois, que ainda analisará opções.
Os alagamentos no Jardim Pantanal não são mera reação da natureza, mas reflexo de decisões erradas sobre a ocupação do solo tomadas ao longo de muitos anos. Com ou sem os moradores, qualquer ação na região custará caro e não pode ser decidida no calor do momento ou apenas quando o bairro está debaixo d’água.
Seja qual for o projeto escolhido – construir diques, parques ou remover a população –, espera-se das autoridades uma solução eficaz e definitiva para o Jardim Pantanal e, sobretudo, para seus milhares de moradores.