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Temor de implosão

Apoio internacional responde ao interesse legítimo de ajudar a Argentina. Mas tem limite

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Por Notas & Informações
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Há consenso tácito mundo afora de que a Argentina não pode, de novo, quebrar. Por mais difícil que seja a reversão do atual contexto de hiperinflação para um ambiente de sustentabilidade, veem-se há meses gestos de países, credores e organismos internacionais muito claros em favor de uma saída para o caos econômico já instalado. As apostas feitas superaram as incertezas sobre a eleição presidencial e a distância dos candidatos remanescentes ao bom senso na gestão da macroeconomia. Sobretudo, reforçam a visão de que abandonar Buenos Aires à sua própria sorte adiciona riscos a um cenário global já conturbado por guerras e restrições monetárias.

Por interesses objetivos, o Brasil não tem se furtado de contribuir para o equacionamento da crise – na medida do razoável para não esfolar o Tesouro Nacional. Suas movimentações em favor do desembolso de US$ 7,5 bilhões pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), logo depois das primárias eleitorais de agosto, encontraram eco no governo dos Estados Unidos, sem o qual os recursos jamais seriam liberados. Também a articulação de Brasília por um empréstimo para a Argentina de US$ 1 bilhão do Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe, a antiga CAF, no mesmo período denota o elevado grau de compreensão sobre os riscos a que o Brasil e a região estão sujeitos se a Argentina passar do ambiente de recessão e hiperinflação à ingovernabilidade. O caos iniciado em dezembro de 2001 no país não foi esquecido.

Considerar as decisões do FMI e da CAF como socorro eleitoral em favor do candidato peronista à Casa Rosada, Sergio Massa, pode até animar as redes sociais direitistas, mas ignora o que realmente está em jogo. Convém lembrar que, quatro meses antes de tais deliberações, sete países desenvolvidos do Clube de Paris haviam acordado com a Argentina o refinanciamento de uma dívida de US$ 2,4 bilhões. O fundamento de tais iniciativas está no interesse legítimo de cada um desses atores de impedir uma debacle total da Argentina. No caso do Brasil, ancora-se em genuíno interesse nacional.

Por maiores que sejam as falhas de Massa e dos que conduziram a economia argentina nas últimas décadas – e as medidas eleitoreiras e inflacionárias adotadas antes do primeiro turno estarão entre elas –, aceitar passivamente uma perspectiva de ruína e desgoverno não está presente na equação de países influentes e de organismos financeiros. Cabe ao peronista e a seu adversário “antissistema” Javier Milei fazer jus à ajuda recebida. Isso significa abandonar seus programas inócuos e/ou catastróficos e apresentar projetos factíveis de redução do déficit público, de correção das políticas monetária e cambial, de controle da inflação inercial e de elevação do grau de segurança jurídica.

Não há novidade aqui para enfrentar o pior dos males econômicos e sociais, a hiperinflação. Quem quer que vença em 19 de novembro conhece bem o caminho a não ser trilhado e terá responsabilidades iniludíveis. Sobretudo, a de entender que toda a boa vontade externa tem limite.