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Uma boa escolha para presidir a COP

Lula convoca um experiente diplomata para dirigir o encontro, que acontece em meio a muito ceticismo. Que o presidente tenha a mesma sensibilidade para escolher quem negociará pelo Brasil

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Por Notas & Informações
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Foi boa a escolha do embaixador André Aranha Corrêa do Lago para presidir a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP-30). A cúpula de Belém será comandada por um diplomata de carreira do Itamaraty, com experiência em negociações, e será mesmo necessário ter muita ponderação para conciliar tantos interesses no atual debate ambiental.

Secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, Lago foi anunciado pelo presidente Lula da Silva para comandar a conferência, a ser realizada em novembro, em uma atmosfera global bastante instável. A discussão sobre o financiamento dos países ricos aos pobres para a mitigação dos efeitos das mudanças do clima, cujos eventos são cada vez mais recorrentes e extremos, voltará à pauta.

Em paralelo, o mundo assiste ao avanço de líderes negacionistas, entre eles Donald Trump, que, tão logo tomou posse, retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris. E a decisão do republicano é, por óbvio, estratégica.

A transição energética é custosa e lenta, e isso está claro tanto para negacionistas quanto para catastrofistas. Não à toa Trump e outros líderes defendem a exploração e o uso de combustíveis fósseis, hoje mais baratos, a despeito da necessidade de acelerar a mudança para fontes mais limpas. Em outra frente, o republicano se contrapõe à China, uma das campeãs em emissão de gases ao mesmo tempo que surfa na onda verde e inunda o mundo com tecnologia “sustentável”, sobretudo carros elétricos e placas fotovoltaicas para produção de energia solar.

O perfil conciliador de Lago pode ajudar na busca por convergências nessas disputas internacionais – e também ajuda a arrefecer as tensões no Brasil. Por isso, seu nome foi bem recebido pelo agronegócio.

Congressistas como a senadora Tereza Cristina (PP-MS) e o deputado Pedro Lupion (PP-PR), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), manifestaram alívio, haja vista que o setor temia a indicação de um ambientalista intransigente para um posto que requer capacidade de escuta, articulação e execução. Segundo Cristina, a COP-30 será a chance de o Brasil se reafirmar como potência agroambiental, ao focar em sustentabilidade, e não apenas no desmatamento da Amazônia, “como querem alguns”.

A mensagem da senadora e ex-ministra da Agricultura do governo de Jair Bolsonaro é clara: o agronegócio não pode ser apontado como vilão. Nesse sentido, em que pesem os elogios a Lago, que terá de equilibrar, com imparcialidade, as demandas de todos os países, preocupa quem serão os indicados por Lula para negociar os interesses e as políticas do Brasil na COP.

O pecuarista Pedro de Camargo Neto foi às redes sociais expressar essa apreensão – perfeitamente compreensível, haja vista que até hoje o Brasil não definiu prioridades nem tem, como ele afirmou, uma política de Estado para o meio ambiente que vá além das “desavenças da miúda política partidária”. Já a Sociedade Rural Brasileira (SRB), em nota pública, afirmou que “é essencial” que os negociadores brasileiros “compreendam a importância do agronegócio para a economia nacional e global, ao mesmo tempo que promovam iniciativas alinhadas à sustentabilidade e à preservação ambiental”.

Como se vê, não será uma COP fácil. Se no campo externo a demanda por energia barata explicita os custosos desafios da descarbonização, internamente o Brasil ainda tem muita lição de casa para fazer. O País carece de ações concretas para proteger seus biomas, como a Amazônia, que recentemente bateu recorde de queimadas, e ainda precisa encontrar formas de combater a grilagem, o garimpo ilegal e o crime organizado, que escoa drogas para o mundo a partir da região.

Somente uma política sustentável, com projetos que apresentem alternativas capazes de aliar proteção ambiental ao desenvolvimento econômico, sem extremismos, garantirá o sucesso do País como líder global. Até agora, no entanto, o Brasil patina na área, e seria muito ruim se Lula escolhesse “companheiros” cheios de vícios ideológicos e hostis ao agronegócio para serem a voz do Brasil nesse encontro.