Efeito Oscar: Confeitaria que foi cenário de Ainda Estou Aqui tem aumento de 20% no faturamento

Confeitaria Manon já tem oito décadas de história e serviu como locação para duas cenas do filme vencedor do Oscar

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Foto do author Geovanna  Hora

Inaugurada em 1942 por um grupo de portugueses, no coração do Rio de Janeiro, a Confeitaria Manon presenciou momentos históricos do Brasil. Mas, no ano passado, ela fez parte de um novo capítulo importante para a história do país, ao servir de locação para Ainda Estou Aqui, o primeiro filme brasileiro a ganhar um Oscar.

Há quase uma década, Fabiula Gonzalez Lopez, de 55 anos, que é filha do dono da Manon, se divide entre a vida de médica e a gestão da confeitaria. Ela conta que o espaço já tinha servido como cenário para outras produções, incluindo o filme A Vida Invisível de Eurídice Gusmão, que ganhou o prêmio de Melhor Filme da mostra Um Certo Olhar, no Festival de Cannes, em 2019.

Primeira cena de Ainda Estou Aqui gravada na Manon mostra família Paiva reunida em momento de celebração. Foto: Sony Pictures/Divulgação

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Fabiula afirma que a repercussão de Ainda Estou Aqui, especialmente depois que Fernanda Torres conquistou o Globo de Ouro de Melhor Atriz, atraiu novos clientes para a Manon e impulsionou o faturamento em 20% nos últimos três meses. “Eu não imaginava um impacto tão grande assim. O centro do Rio de Janeiro costuma ficar vazio em fevereiro, porque o foco é o Carnaval, mas neste ano foi diferente”, comenta.

No longa-metragem dirigido por Walter Salles, a Manon foi adaptada para se parecer com a lanchonete Chaika, que era frequentada pela família Paiva, mas fechou as portas em 2012.

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Ela é o plano de fundo de duas cenas importantes: a primeira mostra uma celebração entre o ex-deputado Rubens Paiva, a esposa dele, Eunice Paiva, e os filhos, enquanto a segunda retrata uma nova reunião da família, mas, dessa vez, sem a presença do patriarca, que foi preso e morto durante a ditadura militar.

Segunda cena de Ainda Estou Aqui registrada na Manon mostra a personagem de Fernanda Torres emocionada ao voltar a lanchonete sem o marido. 

“A minha percepção, como comerciante, é que o filme melhorou o movimento em todo o centro histórico. Ele despertou a curiosidade das pessoas, que vêm para cá almoçar, mas circulam por toda a região, para conhecer mais a história”, diz Fabiula.

Ela conta que os clientes pedem para sentar e tirar fotos na mesa em que a família Paiva se reuniu. “Tem gente que até chora, sinto que virou um ponto turístico”, afirma.

Segundo a médica, o público não é composto apenas por moradores do Rio de Janeiro, mas também por turistas de outros Estados e países, como Rússia e Zâmbia.

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Manon já tem oito décadas nas ruas do Rio de Janeiro

A Manon foi fundada por portugueses há mais de 80 anos, mas foi comprada por um grupo de espanhóis na década de 1960. Nessa época, o pai de Fabiula, Benito Gonzalez Lopez, de 90 anos, entrou no negócio. Ele veio para o Brasil depois da Guerra Civil Espanhola e passou por alguns empregos, até ser convidado por um compatriota para se tornar sócio da confeitaria.

Benito Gonzalez Lopez se tornou sócio da Confeitaria Manon na década de 1960 e, há quase 10 anos, sua filha, Fabiula Gonzalez Lopez, é responsável pelo negócio.  Foto: Divulgação/Confeitaria Manon

A médica conta que o pai trabalhou por alguns anos sem receber nenhum dinheiro, só para pagar a sua parte da sociedade. Aos poucos, Lopez também comprou a parte dos sócios na empresa, até se tornar o único dono da Manon.

A decoração do espaço é uma réplica do navio português Serpa Pinto, e a maior parte da estrutura original foi preservada ao longo de oito décadas.

“As colunas, os espelhos franceses e toda a arquitetura é a mesma de sempre”, conta. Contudo, algumas mudanças foram necessárias: “Antes, tinha um balcão no centro da confeitaria, onde eram vendidos salgados e sucos, mas precisamos tirar para colocar mais mesas e cadeiras. Adaptações são necessárias para sobreviver”.

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A confeitaria Manon já tem oito décadas de história no Rio de Janeiro. Foto: Divulgação/Confeitaria Manon

O prédio onde a Manon está localizada, na Rua do Ouvidor, foi tombado pela Prefeitura do Rio de Janeiro em 1993, devido a sua importância arquitetônica, histórica e cultural. Ele chegou a abrigar outros negócios nos andares superiores, mas atualmente a confeitaria é a única a ocupar o espaço.

Pãozinho espanhol com goiabada é o item mais vendido

A Manon tem um restaurante aberto para almoços e jantares, com um cardápio especial para cada dia da semana, além de pães, doces e sorvetes. Mas o carro-chefe da casa é o madrilenho, um pão de origem espanhola, coberto com creme, açúcar de confeiteiro e goiabada. Segundo Fabiula, são vendidas cerca de 4 mil unidades do doce por dia, a R$ 7,90 cada um.

A receita do madrilenho foi ideia da esposa de um dos sócios de Benito, que trazia o fermento utilizado na massa da Espanha para o Brasil de navio. “Se não tiver madrilenho, não é a Manon”, comenta a médica. Ela conta que outro destaque da confeitaria é a torrada de Petrópolis, servida com geleia ou manteiga - esta última versão é a mais popular e custa R$ 19,90.

Madrilenho (à esquerda) é o doce mais vendido da Manon, que também tem torrada de Petrópolis (no centro) e bomba de pistache no cardápio.  Foto: Divulgação/Confeitaria Manon

Para manter a tradição alinhada com as novidades, Fabiula aposta em doces antigos, como bomba e mil folhas, mas com novos sabores, como pistache. “Tudo é produzido aqui dentro”, afirma.

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Ela diz que pretende abrir outra unidade da Manon, ainda no centro do Rio de Janeiro, mas em um espaço menor, para vender os pães e doces. Contudo, a empresária prefere esperar por um momento em que a economia esteja mais estabilizada.

Para marcar a participação da confeitaria em Ainda Estou Aqui, Fabiula pretende colocar uma foto que mostra as cenas gravadas na Manon em cima da mesa utilizada no longa-metragem e outra, em tamanho maior, na parede. “Vamos marcar o filme que ajudou as pessoas a lembrarem da Manon. Se você não é visto, você não é lembrado”, conclui.

Avaliação dos clientes

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A Confeitaria Manon recebeu uma classificação média de 4,5 de 5 estrelas no Google, com 4.401 avaliações até a publicação desta matéria. Os comentários positivos destacam a qualidade da comida, os preços e a decoração do espaço. Já os negativos abordam problemas com atendimento e alguns pratos.

Os autores das notas concedidas não podem ser verificados. Eventualmente, avaliações positivas ou negativas podem ser uma ação a favor ou contra a empresa.

A empresa não tem um perfil verificado no Reclame Aqui.

Consumidor valoriza conexão emocional com as empresas, diz especialista

São poucos os negócios que têm o privilégio de servir como cenário ou ter a sua marca exposta em filmes e novelas, mas empresas de todos os setores podem se beneficiar de ações relacionadas a produções culturais, como bandas, séries e personagens.

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A gerente de Conhecimento e Competitividade do Sebrae-RJ, Margareth Carvalho, explica que os clientes valorizam negócios que despertam uma conexão emocional. “Os consumidores buscam o resgate da história, daquilo com que eles se identificam. Se o empreendedor consegue trabalhar esse sentimento por meio dos produtos, do serviço ou até da forma de se comunicar, ele tem mais chances de atrair esse público”, diz.

Contudo, há uma lista de cuidados necessários. Segundo a especialista, o primeiro passo é ter atenção aos direitos intelectuais, para não acarretar problemas jurídicos. Um exemplo citado por Margareth é o filme Barbie. O longa-metragem lançado em 2023 levou a uma onda de produtos relacionados ao universo da boneca, mas, as empresas que não tinham permissão para usar a marca da Barbie conseguiram se adaptar à tendência ao apostar em itens da cor rosa.

Depois, é essencial ter um planejamento para não frustrar a experiência do cliente. “Há o risco de o empreendedor simplesmente colocar um cartaz de algum filme na sua loja, por exemplo, mas ao entrar no espaço, o consumidor não encontrar mais nada relacionado àquele universo ou que desperte a identificação”, pontua.

Para entender quais produções culturais podem ajudar o seu negócio, é importante entender quem é o seu público, o que ele procura e quais são as tendências. Margareth afirma que, se o empresário sabe as respostas para essas perguntas, tem mais chances de tomar decisões acertadas - e fugir de modas passageiras, que não correspondem às expectativas do seu consumidor.

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“Uma empresa que não se preocupa em monitorar o mercado, o que inclui também o perfil de consumo, está fadada a não sobreviver”, avalia a especialista.

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