
Filiado ao PSDB desde os 27 anos, o deputado federal Aécio Neves (MG) classifica como “desrespeitosa” a proposta de incorporação do partido e afirma que a legenda “não está à venda” nem pode ser medida apenas pelo tamanho “circunstancial” de sua bancada. Sem mencionar Gilberto Kassab, presidente do PSD e com quem os tucanos negociavam a incorporação, Aécio faz um alerta para que os tucanos não caiam no “canto da sereia” em razão de interesses regionais.
O PSDB está diante de uma encruzilhada: enquanto debate seu futuro, os governadores Raquel Lyra (PE), Eduardo Leite (RS) e Eduardo Riedel (MS) pressionam por uma definição e já flertam com outras siglas, ameaçando deixar o PSDB sem um Executivo Estadual.
“O PSDB não vai subordinar ou submeter seu futuro à satisfação de interesses regionais, por mais legítimos que sejam. Portanto, afirmo: o PSDB não será incorporado por nenhuma outra força política. O que estamos discutindo é a soma de forças, que pode eventualmente resultar em uma fusão com outros partidos de centro”, afirmou o deputado em entrevista ao Estadão.
Para Aécio, que disputou a Presidência em 2014 contra Dilma Rousseff (PT), a “avenida do centro” vem se ampliando e qualquer acordo do PSDB com outro partido deve garantir a independência da sigla para liderar um projeto alternativo no Brasil em 2026.

Por que o senhor se opõe à incorporação do PSDB a outro partido?
Eu sou absolutamente contrário à incorporação do PSDB por qualquer partido, porque eu compreendo que o PSDB ainda tem um papel extremamente relevante a desempenhar. Somos o único partido que se manteve distante do governo Bolsonaro. E pagamos um preço alto por isso. Não participamos do governo Bolsonaro nem do governo Lula, porque queremos construir um projeto alternativo para o Brasil. Se sucumbirmos a cantos da sereia em razão de questões regionais e submetermos esse projeto de País, estaremos traindo os ideais e a história do PSDB.
Acho que é possível construirmos uma aliança no centro, darmos musculatura a um projeto ao centro distante desses dois extremos, do que representa o lulopetismo e o bolsonarismo. Para isso, precisamos preservar o PSDB vivo. O PSDB não pode ser medido apenas pelo tamanho circunstancial de sua bancada ou pelo número de vereadores e de prefeitos, mas sim por sua história e pela coragem de se manter fiel aos seus princípios e à sua visão de Brasil. Não há possibilidade de o PSDB ser incorporado por nenhum partido.
Quando o senhor fala em sucumbir a cantos da sereia, está se referindo a Gilberto Kassab, presidente nacional do PSD?
Não. Acho que o PSDB não deve sequer abrir conversas em que a proposta seja de incorporação, pois isso não leva em consideração a dimensão da nossa história e o nosso papel no Brasil. É natural que conversemos com outras forças políticas, até por conta da legislação — que, inclusive, foi proposta por mim no Senado —, criando a cláusula de barreira e o fim das coligações proporcionais. (…) Essa proposta exatamente estimula a junção e a fusão de partidos que tenham alguma identidade.
O PSDB não vai acabar, não vai morrer, contra até o que torcem alguns. Ainda vamos construir um projeto ao centro, no qual tenhamos um papel ativo, com nosso programa, identidade e propósitos preservados. Até porque, ao contrário do que aconteceu em 2018 e 2022, acredito que a avenida do centro vem se ampliando. As eleições de 2024 mostraram isso: os extremos não foram vitoriosos. O PSDB precisa se manter ativo e altivo no fortalecimento desse campo de equilíbrio — que é o mesmo que votou em mim em 2014, que elegeu o presidente Fernando Henrique e que aguarda a apresentação de uma alternativa.
O Marconi Perillo tem conduzido essas conversas com os partidos e, com o PSD, a conversa, até então, era pela incorporação, já que eles não se interessam por uma fusão. O senhor vê erro do Marconi nessa condução?
Não, pelo contrário. O presidente Marconi tem ouvido a todos. Ele tem sua visão pessoal, mas sempre colocou o interesse do partido acima até de suas conveniências locais. O PSDB não vai subordinar ou submeter seu futuro à satisfação de interesses regionais, por mais legítimos que sejam. Portanto, afirmo: o PSDB não será incorporado por nenhuma outra força política. O que estamos discutindo é a soma de forças, que pode eventualmente resultar em uma fusão com outros partidos de centro, desde que três premissas sejam respeitadas.
Quais?
A primeira é a manutenção do nosso programa de governo. A segunda, a preservação da nossa independência para liderar um projeto alternativo de centro no Brasil. E, em terceiro lugar, a autonomia de comando, garantindo ao PSDB uma voz de liderança decisiva nas decisões que serão tomadas daqui para frente.
As conversas reais são aquelas que admitem essas três premissas: que estejam dispostas a construir um projeto ao centro e que preservem nossa autonomia e possibilidade de definir nosso próprio destino. Propostas que não atendam a esse pressuposto — de que temos liberdade para construir nosso projeto para o país — não serão sequer avaliadas.
Acho até que essa proposta de incorporar o PSDB chega a ser desrespeitosa com o partido e com nossa história. O PSDB é muito maior do que o número de deputados, governadores e prefeitos. Temos um projeto para o Brasil e vamos defendê-lo. Em síntese, o PSDB não está à venda, e nós vamos mantê-lo vivo e fortalecido.
Essa proposta de incorporação veio só do PSD?
Estamos conversando com vários partidos políticos. Mas as conversas que estão prosperando são aquelas que admitem a possibilidade de uma fusão — que significa resgatar e respeitar a história do partido, principalmente a sua perspectiva de futuro.
Acredito, e isso fica ainda mais evidente nos momentos de maior dificuldade, que o PSDB é absolutamente necessário ao Brasil. Não podemos viver em um país dividido entre lulopetismo e bolsonarismo. Quem se manteve incólume até agora foi o PSDB, que não se entregou ao governo do Bolsonaro e muito menos ao governo do Lula. Isso tem valor, é um ativo político importante. Uma parcela significativa da sociedade brasileira espera o surgimento de um projeto de centro — liberal na economia, responsável e inclusivo do ponto de vista social —, o projeto que o PSDB sempre defendeu.
Quando o senhor fala de interesses regionais, não está se referindo a Perillo, mesmo que ele tenha interesses regionais?
Não, não. Ele pode até ter suas preferências na política local, mas tem sido absolutamente correto. Tivemos longas reuniões esta semana e estamos absolutamente afinados nesse propósito de permitir que o PSDB continue sendo o PSDB e defendendo aquilo em que acreditamos.
Como o senhor vê o posicionamento dos governadores? Os três estão abertos à incorporação. Raquel, em particular, tem pressionado por uma decisão até o fim do mês.
Compreendo que os governadores têm suas circunstâncias locais. Tenho um carinho especial e um grande respeito pela Raquel. Fui eu quem a trouxe para o PSDB. Em 2016, quando presidia o partido, fui a Pernambuco e trouxe a Raquel para o partido porque o PSB, que era o seu partido histórico, negou a ela a legenda para compor a prefeitura de Caruaru. Estivemos juntos, demos apoio, ela foi uma prefeita brilhante, reeleita, e depois se elegeu governadora com o apoio do PSDB. As pessoas são as suas circunstâncias, e precisamos compreender isso. Se, para as circunstâncias locais dela, uma proximidade, por exemplo, com o governo Lula for necessária, temos que respeitar essa posição — e até respeitar que ela tome um outro caminho. Só não vamos submeter o projeto do PSDB a nenhuma questão regional, por mais legítima que seja.
Há várias opções sobre a mesa, e o senhor tem conversado com diferentes partidos. Pessoalmente, qual o melhor caminho? Seria uma fusão com o MDB? A ampliação da federação?
Temos mantido diálogo com todos esses partidos que você mencionou. Na próxima semana, também conversaremos com o Republicanos, que acena com ideias de uma fusão, e com o MDB, de quem quero ouvir qual é a proposta efetiva concreta. Tivemos conversas muito animadoras esta semana com o Podemos, que considero um partido complementar ao PSDB e que demonstra disposição em dar musculatura a esse projeto de centro. É uma alternativa que pessoalmente vejo com simpatia, mas, claro, ainda precisamos construir caminhos.
Além disso, estamos avançados — dependendo de questões jurídicas — de fazer uma federação com o Solidariedade. Todos esses caminhos estão sobre a mesa. O que não vamos abrir mão é de termos, de alguma forma, uma participação na definição do nosso próprio destino. Depois de quase 40 anos de existência, o PSDB não entregará seu futuro a ninguém que não sejam os próprios peessedebistas.
E no caso de o PSDB partir para uma fusão ou incorporação com o PSD, como fica o seu futuro?
O PSDB não será incorporado — e não é só pelo PSD, é por ninguém. Há, inclusive, uma avaliação equivocada de que eu teria problemas com o PSD em Minas. Pelo contrário. Vejo com enorme simpatia a possibilidade de Rodrigo Pacheco ser nosso candidato ao governo de Minas. Rodrigo sempre foi nosso aliado. Ele nasceu candidato numa aliança conosco. O próprio ministro Alexandre (Silveira, de Minas e Energia) começou no meu governo, no governo Anastasia.
Portanto, não há dificuldade nenhuma. A questão é: nós não vamos terceirizar a definição do nosso destino. Se fosse apenas pela questão regional, uma aliança com o PSD seria muito bom para mim. Mas o PSDB é um partido com um projeto nacional. A última vez que subordinamos o projeto nacional do partido a um projeto regional foi em 2022, quando fomos impedidos de lançar uma candidatura própria porque a direção da época privilegiou o projeto de São Paulo e decidiu que o melhor era não ter candidato. Deu no que deu.