O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), terá o desafio de lidar em seu segundo mandato com nove vereadores de direita e extrema direita que se colocam como independentes e serão decisivos para que ele consiga aprovar projetos de lei na Câmara Municipal.
Embora tenham proximidade ideológica com o prefeito, que se intitula como centro-direita e se alinhou ao bolsonarismo na campanha de 2024, esses vereadores prometem analisar projeto a projeto e podem votar contra o governo do emedebista se discordarem das propostas.
É o caso de Lucas Pavanato (PL), Sonaira Fernandes (PL), Zoe Martínez (PL), Amanda Vettorazzo (União Brasil), Rubinho Nunes (União), Adrilles Jorge (União Brasil), Sargento Nantes (PP), Janaina Paschoal (PP) e Kenji Palumbo (Podemos).
“Nós acreditamos que com todos os citados nós temos uma ampla margem de concordância do ponto de vista político e ideológico. Vejo muito mais pontos de convergência do que de divergência”, disse Enrico Misasi, secretário da Casa Civil, ao Estadão. Ele afirma ter tido “diálogos de altíssimo nível” com os vereadores com quem se reuniu até o momento e que eventuais “divergências pontuais” fazem parte do processo político.

Os independentes não formam um grupo ou uma bancada coesa, variam no grau de proximidade com a Prefeitura e não atuam, pelo menos até o momento, de forma coordenada. Mesmo assim, têm potencial para dificultar a vida de Nunes, que conseguiu aprovar todos os projetos apresentados no primeiro mandato.
As siglas que apoiaram o prefeito elegeram 36 vereadores. A Prefeitura precisará do apoio de ao menos um independente para aprovar projetos de lei que exigem maioria absoluta (28 votos), como Orçamento municipal, concessões de serviços públicos, mudanças tributárias e autorização para tomar empréstimos.
Os votos desses vereadores também serão necessários caso o Executivo deseje mudar o Plano Diretor e as regras para uso e ocupação do solo (33 votos) ou emendar a Lei Orgânica – espécie de Constituição municipal que necessita de 37 votos para ser alterada.
“Tem alguns vereadores que são base de governo mesmo e, independentemente do projeto, votam sempre a favor”, disse Kenji Palumbo. “Eu sou funcionário público de carreira há quase 30 anos. Não voto contra os servidores de jeito nenhum”, acrescentou.
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Janaina Paschoal considera que pode discordar da Prefeitura sobre privatizações, concessões e parcerias. “Eu não tenho preconceito com a iniciativa privada, mas sou mais criteriosa nessas questões”, disse.
Ao lado de Adrilles Jorge, ela organiza a criação de uma bancada para defender o que o vereador descreve como “movimento de artistas livres que não querem se submeter a cotas raciais e sexuais de uma cultura woke [politicamente correta]” que na visão dele tem dominado a gestão cultural na capital paulista.
Por outro lado, o vereador, que se reuniu com o recém-nomeado secretário de Cultura, Totó Parente (MDB), para discutir o assunto, concorda com a decisão de Nunes de barrar o transporte de passageiros por motocicleta oferecido pela 99Moto. “Vou julgar caso a caso. Não quero ficar nem atado diretamente à Prefeitura nem ser uma oposição irresponsável, atacar por atacar”, resumiu Adrilles Jorge.
A gestão Nunes tem conversado com os vereadores da base, inclusive os independentes, para escolher os próximos subprefeitos, cargo que cuida das administrações regionais. Como mostrou o Estadão, houve atrito entre Zoe Martínez e Lucas Pavanato, que disputaram a influência sobre a Subprefeitura de Pinheiros.

Pavanato acabou recuando sob a justificativa de manter a independência para fiscalizar o governo. “Acho que o Nunes tende a fazer 99% alinhado com aquilo que eu acredito. Se tiver algo que eu discorde, vou votar contra”, afirmou. Como o colega, Zoe acredita que o vice-prefeito, Mello Araújo (PL), indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), pode servir como um elo importante na relação com a Prefeitura.
“Não se trata de carimbar tudo o que vem do governo, mas de agir com responsabilidade, buscando sempre o equilíbrio entre cooperação e compromisso com o que é certo para a população”, disse a vereadora.
O cientista político Lucas Gelape, do Centro de Política e Economia do Setor Público da FGV, aposta que os vereadores passarão por um período de aprendizado e testes para saberem o tamanho da liberdade que têm para de fato exercerem a independência sem sofrer retaliações ou repreensões tanto da Prefeitura como dos próprios partidos que apoiam Nunes.
“Eu acho que a questão do União Brasil é a mais interessante no momento atual. O Milton Leite [ex-presidente da Câmara e cacique do partido] saiu dos holofotes, mas o quanto ele ainda vai conseguir organizar essa bancada [nas votações], que tem membro do MBL e o Adrilles, por exemplo? Será interessante tentar entender”, disse.

“Tenho carta branca”, disse Amanda Vettorazzo, vereadora do União Brasil que integra o Movimento Brasil Livre. Ela pontua que o deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil), outro integrante do MBL, sempre teve a mesma liberdade na sigla. “Pretendo manter o diálogo, mas não tem obrigação de voto sem apreciar o projeto. Vou analisar impacto orçamentário, se pode ou se não pode”, acrescentou.
Gelape, que também vê uma proximidade ideológica entre Nunes e o grupo dos independentes, aponta que a postura dos vereadores dependerá, em última instância, de quais projetos o prefeito apresentará. “Quais pautas vão realmente mobilizar o eleitorado desses vereadores de forma a pressioná-los a mudar o voto? Quantas vezes eles vão, de fato, enfrentar esses dilemas nos próximos anos?”, questionou.
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Sargento Nantes apoiou Pablo Marçal (PRTB) na eleição, mas considera que isso ficou no passado e quer trabalhar com Nunes. “Não terei problemas em votar qualquer projeto do governo, desde que seja bom para o povo”, afirmou o vereador, que fez elogios ao primeiro mandato do emedebista pela entrega de moradias populares e pelos investimentos na segurança pública.