Recentemente, o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento sobre os limites da competência da 13ª Vara Federal de Curitiba em dois casos emblemático, o HC 193.726, Lula, julgado pelo plenário em 23.06.2021 e a Reclamatória 36.542, Guido Mantega, julgada pela Segunda Turma em 20.04.2021; e ambas reconhecendo o abuso na atração da competência dos casos da Lava Jato para a 13ª Vara Federal de Curitiba.
No mesmo sentido, o STF decidiu pela incompetência da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro na Lava Jato carioca, no HC 203.261, determinando a livre distribuição na Justiça Federal em relação às ações penais relativas às Operações "Fatura Exposta", "Ressonância" e "Operação S.O.S", onde o juiz competente, nos termos do art. 567 do CPP, deverá decidir sobre a convalidação, ou não, dos atos decisórios.
O TRF2, após as decisões do STF já decidiu em três casos, pela incompetência do Juízo da 7ª Vara Criminal Federal, cuja conexão se firmava pela colaboração decorrente de Operações conexas a Lava Jato, mas que nada possuem de conexão, como o caso das ações penais decorrente das Operações Favorito, Unfair Play e Mascate.
Segundo o art 567, CPP, a incompetência do juízo anula somente os atos decisórios, e nesta linha, importante destacar que inúmeras colaborações premiadas foram celebradas em decorrência dessas ações penais, e com cláusula expressa de que " está sendo processado pelo cometimento de crimes de pertencimento à organização criminosa, evasão de divisa e lavagem de dinheiro, dentre outros ( da ação penal referida e conexa), e poderá ser investigado por outros fatos citados nos anexos que instruem o presente acordo".
Neste sentido, o reconhecimento da incompetência do Juízo da 7ª Vara Criminal do Rio de Janeiro para as ações citadas, e a anulação dos atos decisórios do mesmo, também anulam as homologações das colaborações celebradas até a data em que foi reconhecida a incompetência do Juiz.
Desta forma, necessário se faz encaminhar todas as colaborações conexas a essas ações penais à livre distribuição, para que o Juiz competente possa homologá-las, de acordo com a lei 12.850/2013 e suas alterações com o pacote anticrime.
A participação do Juiz no acordo de colaboração tão somente se dá no ato decisório da homologação do acordo, e justamente para que se mantenha a imparcialidade na homologação, sendo necessário que o magistrado verifique a regularidade, a legalidade e a voluntariedade do colaborador, e para isso é necessário ouvi-lo na presença do seu defensor, antes da homologação do acordo.
A nova redação do § 7º, do art. 4º da Lei 12.850/2013 estabelece que os autos serão enviados ao Juiz, para, antes de homologar o acordo de colaboração, analisar o respectivo termo, as declarações do colaborador e cópia da investigação, devendo ouvir sigilosamente o colaborador, acompanhado de seu defensor, oportunidade em que analisará a regularidade e legalidade, adequação dos benefícios e penalidades, a voluntariedade, especialmente nos casos em que o Colaborador esteve ou está sob efeitos de medidas cautelares.
Muitos Juízes entendem que antes da Lei nº 13.964, de 2019), que tornou obrigatória a audiência sigilosa do Juiz com o colaborador, prevista no §7º, do art. 4º, a audiência preliminar era facultativa, o que dava ao Juiz a larga interpretação da legalidade, regularidade e voluntariedade do acordo tão somente pela leitura do acordo.
Todavia, com a entrada em vigor da Lei 13.964/2019, e declarada a incompetência do Juízo da 7ª Vara Federal, é necessário que também haja novo ato decisório de homologação, e mais que isso, especialmente nos casos que o colaborador esteve sob efeitos de medidas cautelares, seja ouvido pelo Juiz competente. Oportunidade em que o magistrado analisará a regularidade e legalidade, adequação dos benefícios e penalidades, a voluntariedade
O Juiz não pode extrair de sua convicção que a voluntariedade do réu em colaborar se extrai da sua assinatura e do seu patrono, a vontade e voluntariedade devem ser ditas expressamente pelo colaborador ao Juiz.
A audiência para ouvir sigilosamente o colaborador, possui a finalidade de evitar indevidas pressões e coações ao delator, possibilitando o controle efetivo da regularidade do acordo e de seus termos, e o pretenso colaborador ser questionado novamente acerca de sua conformidade expressa com o acordo.
O ato de dizer a vontade e a voluntariedade é um direito personalíssimo do colaborador!
O direito personalíssimo, amparado pelo Código Civil, possui como característica a intransmissibilidade, a irrenunciabilidade e a indisponibilidade, sendo perfeitamente cabível novo ato decisório de homologação, vez que quando foram celebrado certos acordos de colaboração, os colaboradores tiveram tolhidos seu direito personalíssimo.
Por fim, conclui-se que o art. 567 do CPP também abrange os atos conexos às ações penais, em que a incompetência do Juízo da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, ou seja, a homologação dos acordos de colaboração celebrados em decorrência das mesmas e distribuídos ao Juízo por conexão, cabendo ao novo Juiz competente cumprir a regra do §7º, do art.4º, da Lei 12.850/2013.
*Fernanda Pereira da Silva Machado, advogada, professora universitária, mestranda em Direito Econômico e Desenvolvimento pelo IDP, pós-graduação em Inteligência Aplicada e Investigação Criminal pela FEMPERJ-MP, pós-graduação em Criminalidade Complexa e Direito Penal Econômico pelo IBMEC, membro da CEVA- OABRJ - Comissão de Enfrentamento Contra a Violência a Advogados, membro Comissão Prerrogativas da OABRJ, membro do IPGI - Instituto de Prerrogativas e Garantias Individuais
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