Conversas encontradas no celular do desembargador Helvécio de Brito Maia Oliveira, do Tribunal de Justiça do Tocantins, colocaram o advogado Thiago Marcos Barbosa de Carvalho e o procurador de Justiça Ricardo Vicente da Silva, do Ministério Público do Estado, na mira da Polícia Federal. Eles são suspeitos de envolvimento em um esquema de comércio de decisões e informações de processos sigilosos do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O Estadão busca contato com suas defesas.
O telefone do desembargador foi apreendido em agosto de 2024 na Operação Máximus, que investiga denúncias de venda de sentenças no Tribunal do Tocantins. Mensagens trocadas entre o magistrado e o advogado acenderam o alerta nos investigadores da Polícia Federal.
Os diálogos “denotam a atuação de Thiago Barbosa como intermediador do repasse de informações sigilosas, com a ciência e/ou anuência do procurador de Justiça Ricardo Vicente da Silva”, apontou a PF.

O advogado foi preso nesta terça-feira, 18, em uma nova fase da Operação Sisamnes, que investiga as suspeitas de venda de decisões no STJ. Ele é auxiliar do procurador Ricardo Vicente no Ministério Público do Tocantins. O procurador foi alvo de buscas.
O ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), é o relator da investigação. Após receber o relatório da Polícia Federal sobre as conversas, ele afirmou que as mensagens sugerem “uma trama que envolve a participação de servidores do Superior Tribunal de Justiça, de modo a fornecer acesso indevido a dados sigilosos, inclusive no âmbito de investigações criminais em andamento, em contextos apuratórios em curso acerca da suposta conduta de desembargadores e até do Governador do Estado do Tocantins”.
As conversas são de junho de 2024 e se deram no contexto de uma investigação sigilosa do STJ que atingiu os magistrados do Tocantins. O advogado alertou o desembargador Helvécio de Brito sobre o inquérito. Thiago afirma que ficou sabendo do processo por meio de “companheiros” em Brasília que “ficam aí 24 horas monitorando” e “tendo acesso sempre às informações”.
“Eu sempre sou daquela linha do seguinte, se tem e se tiver alguma investigação, alguma coisa, é sempre bom estar por dentro, estar em alerta”, afirma o advogado.

Thiago se oferece para detalhar o que sabe pessoalmente. “A gente não sabe como que tá essa questão de uma eventual interceptação telefônica, né, mas assim, independente de qualquer coisa eu fiquei interessado para pegar esse material até era para avisar para o senhor, porque o Dr. Ricardo tem o senhor igual um irmão, e o irmão do Dr. Ricardo é um tio pra mim, porque o Dr. Ricardo é um segundo pai que eu tenho, então, o meu interesse é de ter acesso, passar.”
Segundo a Polícia Federal, após a Operação Máximus, que atingiu o desembargador, Helvécio e Thiago passaram a se comunicar pelo aplicativo de mensagens Signal, que armazena o mínimo possível de dados e não mantém registros de mensagens, chamadas ou arquivos compartilhados.
O advogado é sobrinho do governador Wanderlei Barbosa (Republicanos). Em uma das conversas, ele afirma que vazou uma investigação sigilosa ao tio. Thiago disse que teve acesso ao inquérito nº 1650, autuado no Superior Tribunal de Justiça um ano antes, por meio de “pessoas que têm ligações fortíssimas no STJ”. A investigação, segundo ele, teria relação com contratos para a compra de cestas básicas e envolveria o acordo de colaboração premiada de um dos fornecedores do governo do Tocantins. O advogado afirma que foi até para Brasília para conseguir uma cópia da investigação e que compartilhou o material com o governador para “ajudar” e “tomar alguma providência se for necessária”.

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Wanderlei Barbosa não foi alvo da operação da PF. Procurado, o governador negou ter recebido informações privilegiadas. Ele alega que sua defesa teve acesso regular ao inquérito mencionado nas mensagens. “Eventuais desdobramentos são de exclusiva responsabilidade dos investigados, não cabendo qualquer tentativa de vinculação ao governador por atos individuais de terceiros”, afirma (leia a íntegra da manifestação ao final da matéria).
Ao autorizar a operação, o ministro Cristiano Zanin classificou como “indispensável” a prisão de Thiago. “A atuação do investigado Thiago Marcos Barbosa de Carvalho é demonstrada de forma veemente nos autos, destacando-se a facilidade com que o investigado demonstra ter acesso a inquéritos sigilosos em trâmite no Superior Tribunal de Justiça.”

A decisão menciona mencionou o vínculo do advogado com o governador do Tocantins. “O investigado, parente próximo do governador e entremeado a figuras de poder na estrutura judiciária local, com influência sobre Tribunal Superior, denota possibilidade elevada de reiteração da prática delitiva, em seu próprio benefício.”
O ministro afastou Thiago das funções no gabinete do procurador Ricardo Vicente da Silva e os proibiu de manter contato. Seus passaportes também foram apreendidos.