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‘A falta de valorização que a sociedade dá para a advocacia preocupa’, diz nova presidente da AASP

Renata Mariz de Oliveira assumiu neste ano a direção da Associação dos Advogados de São Paulo com a meta de projetar a entidade para fora do Estado e de alcançar jovens advogados

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Foto do author Rayssa Motta
Foto: Arquivo pessoal
Entrevista comRenata Mariz de OliveiraAdvogada criminalista e presidente da AASP

Ainda criança, Renata Mariz de Oliveira acompanhava o pai, o criminalista Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, nas provas orais – hoje extintas – do exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), teste que habilita os bacharéis em Direito a exercer a advocacia. Era um momento para disfrutar a presença paterna. O interesse pelo universo jurídico foi forjado de maneira natural na convivência familiar. Além do pai, a mãe o avô paterno também são advogados. “Nunca quis ser outra coisa. Sempre soube que seria advogada”, afirma em entrevista ao Estadão.

O pai é uma celebridade no universo jurídico, o “decano” da advocacia, com mais de 50 anos de carreira. Profissional dedicado, sempre envolvido nos processos, fazia de tudo para passar momentos de qualidade com os quatro filhos, mesmo nas temporadas mais frenéticas de trabalho. Acabou inspirando Renata a seguir seus passos no Direito Penal. “É um privilégio ter nascido em uma família do Direito e ter essa vocação”, diz a advogada.

Aos 52 anos, ela assume a presidência da Associação dos Advogados de São Paulo (AASP), cargo que já foi ocupado por seu pai e seu avô. É a segunda mulher a assumir a direção da associação em 82 anos e espera deixar um legado para outras advogadas.

“A sala do conselho da AASP é enorme. Tem uma parede com as fotos de todos os presidentes desde 1943. É chocante ver apenas uma mulher ali”, conta. “É preciso ter diversidade no comando das instituições. Acho que nós estamos numa construção.”

Parte de uma nova geração de advogados, Renata tem planos arrojados para a entidade. Uma das metas é projetar a associação para fora de São Paulo - 93% dos 70 mil associados estão no Estado. Apesar do nome, que conserva desde sua criação, a AASP atua em todo o País.

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Outro objetivo é alcançar e capacitar a jovem advocacia. A associação tem parcerias com universidades e oferece condições especiais para recém-formados. “Eu acho que, nesse campo, tem que democratizar. Tem muita gente que não tem acesso. E, sozinho, tudo é mais difícil. Acredito muito na força da associativismo.”

Renata Mariz de Oliveira, nova presidente da AASP, é a segunda mulher a assumir o comando da entidade. Foto: Arquivo pessoal

Fundada em 1943, a Associação dos Advogados de São Paulo, maior associação da advocacia na América Latina, surgiu para monitorar as intimações judiciais que eram veiculadas nos Diários Oficiais. As publicações eram recortadas manualmente e distribuídas aos escritórios de advocacia. O serviço de intimações ainda existe, mas hoje é totalmente eletrônico.

Com o tempo, a tecnologia foi incorporada a outros projetos. Quando um advogado é intimado em um processo, por exemplo, a inteligência artificial já é capaz de selecionar casos semelhantes na biblioteca de jurisprudências da AASP e encaminhar ao associado para facilitar suas pesquisas.

A associação desenvolveu ainda ferramentas eletrônicas como um software gerenciador de processos, um streaming de cursos e até uma plataforma de cálculos trabalhistas e judiciais. “Precisamos usar a tecnologia a nossa favor”, defende Renata.

Com perfil conciliador, a advogada busca um alinhamento com outras entidades da advocacia e com órgãos do sistema de Justiça. Um dos objetivos é formar uma coalização para assegurar o direito dos advogados às sustentações orais – momento em que a defesa expõe seus argumentos antes do julgamento.

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A prerrogativa está prevista no Estatuto da Advocacia, que tem status de lei, mas os tribunais superiores têm impedido as sustentações em algumas modalidades de recursos e pedidos, como os agravos, embargos, petições de suspeição e medidas cautelares. A regra foi incluída nos regimentos internos do Supremo Tribunal Federal (STF), do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

“Lutando junto, a fala fica mais forte. Tenho esperança que vamos reverter esse quadro”, diz a presidente da AASP.

Renata concilia a presidência da associação com os processos em que atua. Ela continua a despachar no escritório da família, onde comparece todos os dias, sempre depois de praticar alguma atividade física. A criminalista recebeu a reportagem na sala de reuniões, de onde é possível ver um trecho da avenida Paulista. Além dela, o pai, o irmão, a mãe, o primo, o cunhado e o ex-marido trabalham no escritório.

A primeira experiência profissional da advogada foi na Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso (Funap), como estagiária. Depois disso, deu aulas em presídios de São Paulo. “Me sinto bem dentro do presídio. É estranho falar isso, até porque eu posso sair, mas pelo menos sei que lá dentro eu posso ajudar.”

A crise do sistema carcerário, que passa pela superlotação dos presídios e a dificuldade de ressocializar os presos, é um dos temas sensíveis para a advogada. “Quando a pessoa é presa, ela vira um nada. Ela não é ouvida, ela vira um número. As pessoas não se preocupam com a causa do crime, elas se preocupam com o crime depois que aconteceu. E eu acho que isso é o pior problema da humanidade.”

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Questionada sobre o que mais a preocupa no momento atual da advocacia, Renata afirma: “A sociedade entender o papel do advogado. O que me preocupa é a falta de valorização que a sociedade dá para a advocacia.”

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