A carga fiscal elevada é uma velha conhecida dos brasileiros há décadas. Aqui, nós pagamos muitos impostos praticamente sobre tudo o que consumimos, até sobre a cesta básica. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), o volume de tributos sobre a comida necessária para uma família sobreviver com o mínimo - sem regalias - é de 23%, enquanto em países desenvolvidos, ele não passa de 7%. A mesma lógica se impõe sobre combustíveis, eletrodomésticos, roupas, calçados...
Os governos têm notória sede de arrecadação, uma volúpia desenfreada em receber o máximo possível, numa sanha arrecadatória que pune o contribuinte, ou chega a usurpá-lo em casos como a falta da correção para a tabela do Imposto de Renda Retido na Fonte, "congelada" há mais de 25 anos, punindo o assalariado e assegurando aumento da arrecadação por uma via indireta.
O uso do dinheiro arrecadado com tantos tributos raramente se torna mensurável, ou seja, não volta para o contribuinte em benefícios ou políticas públicas pelos quais ele sente a mão e a eficácia do Estado como instituição. Em meio às complexidades dos interesses difusos que emperram a Reforma Tributária, as relações políticas - desdobramento desses interesses - estão, mais uma vez, desgastadas; o clientelismo insiste em dar as cartas formando a base de governabilidade e a democracia parece continuamente em xeque, distante do brasileiro comum.
Quando o assunto é remédio, o Brasil também é um ponto fora de curva em relação ao mundo desenvolvido, talvez civilizado. Estamos distantes de um universo melhor organizado e justo tributariamente neste sentido. Uma das provas do nosso endêmico Complexo de Vira Latas está na tentativa - algo de despertar perplexidade - de aprovar o fim das isenções fiscais para cerca de 20 mil empresas, o que representará mais dinheiro no caixa do governo e menor geração de empregos, já que o custo tende a crescer. Os remédios e os produtos de higiene pessoal podem ficar mais caros.
O relatório da Reforma do Imposto de Renda, apresentado pelo deputado Celso Sabino (PSDB-PA), pode tornar ainda mais caros os medicamentos, mais sal na conta do consumidor, do paciente, de quem precisa de um remédio. As entidades que representam esses setores, de olho na pressão dos custos para produzir, falam em repassar para os consumidores o aumento esperado.
Se a carga tributária sobre o preço dos medicamentos, que oscila de 18% a 42% aumentar, brasileiros com a renda mais restrita deixarão de fazer os tratamentos de que necessitam e, como resultado, o custo futuro de um eventual agravamento do quadro clínico deles será pago por cada um de nós ou pelo déficit público, um outro maremoto que nos deixa numa nau à deriva e afugenta investimentos externos.
Precisamos nos articular, nos sensibilizar: a sociedade civil já não aceita mais que um remédio que custa 200 reais tenha mais de 80 reais só de impostos. Isso interfere bastante no fluxo dos tratamentos, no dia a dia de tantas famílias e escancara a chaga de um Estado que parece insistir em dar as costas para o cidadão.
*Roberto Rufca, formado em Marketing, é especialista em gestão pública
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