Desde o início do ano de 2024, a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, passou a disciplinar, com exclusividade, sobre normas gerais de licitação e contratos para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Municípios e também o Distrito Federal.
Sancionada ainda em período de pandemia, no ano de 2021, a Nova Lei de Licitações é a substituta da Lei nº 8.666/93. A ideia é tornar os processos de licitação e contratação mais eficientes, transparentes e competitivos por práticas mais modernas (dentre várias alterações que trazem as contratações públicas para um ambiente mais contemporâneo e moderno vale mencionar a preferência pela licitação na forma eletrônica, a criação do Portal Nacional de Contratações Públicas, o sistema de registro cadastral unificado dos órgãos e entidades da Administração Pública, dentre outros). Contudo, junto a este regramento moderno, são enormes as dificuldades para que se tenha a implementação desse regramento pelos diversos órgãos e entidades por todo o país.
Ilustra a gravidade deste atraso o fato de pesquisa recente do TCU (Tribunal de Contas da União) ter tido repercussão praticamente nula com relação aos números que trouxe acerca do assunto. O tribunal de contas, com o auxílio de outros órgãos, elaborou questionários para avaliar como as instituições públicas de todas as esferas têm evoluído na aplicação da Lei 14.133/21, aferindo-se o seu grau de maturidade.
O estudo foi dividido em etapas, sendo que a primeira buscava avaliar se os principais pontos da nova lei de licitações foram regulamentados e se os sistemas necessários para isto estavam prontos. Já a segunda etapa, processada ao longo dos meses de maio e junho/2024, foi responsável por reunir e analisar dados do Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) e da plataforma de compras do governo federal.
E o resultado foi claramente insatisfatório, muito aquém do necessário: 61% dos entes estão no nível de implementação “insuficiente” (“que indica a existência de lacunas relevantes nos procedimentos de contratações públicas, em sua estrutura, governança, transparência ou no correspondente sistema de controle”); 30% no nível “básico”; 5% no nível “intermediário” e apenas 1% no nível “avançado”.
Lamentavelmente, constataram-se claros indicativos de deficiência (notadamente dos entes municipais que representam mais de 90% do público-alvo da pesquisa) pela ausência de implementação das novas regras. Resta a dúvida, então, sobre quais pontos justificam a dificuldade na implantação da nova lei por órgãos e entidades. E são diversos os motivos.
Um dos cenários vividos atualmente se dá pelo fato de que muitos dos servidores que lidam com licitações trocam de função com frequência, como foi constatado pela própria pesquisa do TCU. Para além disso, é grave o fato de que em muitas entidades e órgãos não há servidores suficientes que atendam aos requisitos necessários para lidar com um volume acentuado de contratações.
Outro problema, ainda a respeito dos novos contratos, recai no fato de que muitos órgãos ainda não contam com um plano de contratações anual e ainda não há preocupação em fazer contratações sustentáveis. Além disso, poucos usam sistemas eletrônicos para gerenciar contratações, além de faltarem estudos técnicos antes de contratar plataformas privadas de licitação.
É notório que tudo isto aponta que os problemas vão desde a capacitação dos servidores públicos até a adaptação das companhias às novas regras. E é necessário que haja mais suporte aos municípios, um incentivo ao uso de sistemas públicos e a criação de mecanismos para fiscalizar melhor as plataformas utilizadas, garantindo que sigam as novas normas.
A criação de um regramento mais moderno para as licitações e contratações no Brasil foi um grande avanço, mas a verdade é que este irá apenas se concretizar quando a efetiva aplicação da lei se tornar realidade. Para isto, é necessário que o atraso em uma implementação como esta receba a devida atenção do Poder Público e da sociedade. Afinal, a insegurança jurídica caminha junto da retração econômica.
Por fim, a baixa adesão demonstrada pelo estudo do TCU, sobretudo em municípios menores e mais afastados, expõe lacunas significativas em capacitação, planejamento e infraestrutura tecnológica. Embora a nova legislação tenha o objetivo de modernizar e aperfeiçoar a gestão de recursos públicos, a pesquisa do TCU demonstra que sua adoção ainda está distante do esperado. Uma saída para esse cenário passa por ações coordenadas e mais investimento.