O ex-presidente da Odebrecht Marcelo Odebrecht disse nesta sexta-feira, 4, em depoimento à Justiça que seria "tremendamente injusto" condenar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por corrupção em uma ação envolvendo a liberação de financiamento do BNDES para obras da empreiteira no exterior. O motivo, segundo ele, são "contradições" existentes nas versões do ex-ministro Antonio Palocci e do empresário Emílio Odebrecht, pai de Marcelo, sobre a participação do ex-presidente no caso. A afirmação representou um recuo do ex-presidente da Odebrecht em relação a seu acordo de delação premiada.
A declaração de Marcelo foi dada em depoimento ao juiz Vallisney de Oliveira, da 10.ª Vara da Justiça Federal em Brasília, em processo que trata do pagamento de propina a integrantes do PT em troca de facilidades no governo à Odebrecht. Além de Lula e Palocci, o ex-ministro Paulo Bernardo é réu na ação.
"Tudo que eu soube de Lula foi através de meu pai, Palocci e Alexandrino (Alencar, ex-executivo da Odebrecht que também firmou delação). E os depoimentos deles estão cheios de contradições", disse Marcelo, que foi ouvido via videoconferência. Ele prestou o depoimento em Osasco.
Marcelo havia mencionado antes, em sua delação, ter sido procurado no fim de 2009 pelo ex-ministro Paulo Bernardo, a mando de Lula, para tratar de um pagamento de US$ 40 milhões em troca da liberação de uma linha de crédito de US$ 1 bilhão para exportação de bens e serviços. O dinheiro seria usado pela Odebrecht para obras em Angola.
Na audiência, porém, o empreiteiro citou um depoimento prestado no mês passado pelo pai, Emílio, que isentou Lula de qualquer pedido indevido para aprovação do financiamento à empresa. Como Marcelo se baseava em um relato de seu pai envolvendo Lula, ele disse não ter como sustentar a versão.
Contradição. Em depoimento no dia 27 de agosto na mesma ação, Emílio disse que, "em nenhum momento", tratou com Lula sobre o assunto. "Eu lhe confesso que tenho minhas dúvidas se ele estava efetivamente envolvido nisso. Não acredito, até pela relação de mais de 25 anos", afirmou o empresário.
"A essa altura do campeonato, eu não posso dizer nada. Porque eu digo uma coisa, meu pai disse que falou comigo, falou com o Lula outra. Então, eu acho que precisa esclarecer a participação de Lula especificamente. Precisa ser esclarecida por meu pai e por Alexandrino. Por meu pai e Palocci", disse Marcelo ontem. "Meu pai já disse que falava para mim uma coisa e falava para Lula outra. Ele disse que se esqueceu de um bocado de coisa."
No depoimento, Marcelo também corrigiu uma informação sobre os valores pagos como propina pela Odebrecht para obter o financiamento. Em vez dos US$ 40 milhões inicialmente informados, ele disse que foram US$ 36,5 milhões. Ele manteve a acusação de que o pedido partiu de Paulo Bernardo e que Palocci foi o responsável por gerenciar os valores indevidos destinados ao PT.
O advogado de defesa de Lula, Cristiano Zanin Martins, disse que os depoimentos de Marcelo e de Emílio, somados, deixam claro que "o ex-presidente não praticou nenhum ato ilícito que foi imputado a ele nessa ação."
"Não há como sustentar vínculo com o ex-presidente. Se ocorreu algum fato ilícito, não tem qualquer participação de Lula", disse Zanin.
O procurador Carlos Henrique Martins de Lima, que atua no caso, disse ainda não ser possível avaliar se há provas de envolvimento de Lula na negociação dos US$ 40 milhões. "Estamos numa fase da ação em que não acabamos de ouvir todas as testemunhas", afirmou. Ele lembrou que o próprio Palocci ainda não prestou depoimento na ação.
COM A PALAVRA, MARCELO ODEBRECHT
A defesa de Marcelo Odebrecht ressalta que ele sempre afirmou não ser o responsável pelas tratativas e pela relação da Odebrecht com Lula. Marcelo reafirma seu compromisso com a efetividade do seu acordo e com a verdade dos fatos.
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