O fenômeno da corrupção e da lavagem de dinheiro afeta praticamente todos os países do mundo e está impregnado, sem distinção, tanto nas instituições públicas quanto em corporações privadas. Em linha com a orientação internacional, no Brasil, não é de hoje que autoridades públicas, sobretudo aquelas investidas de poder persecutório e de inteligência (policial e financeira) vêm concentrando esforços na prevenção de ilícitos - e não mais somente na repressão - através da delegação às empresas e setores obrigados de responsabilidade pela construção de programas de integridade, os quais, na prática, devem funcionar como ferramenta de contenção à atos ilícitos de seus colaboradores e parceiros.
As empresas acabam, no fim do dia, funcionando como verdadeiras "gatekeepers" - torres de vigia - do Estado. Em meio a este contexto de permanente vigilância e prevenção que atua o COAF, a unidade de inteligência financeira brasileira. O COAF possui, precipuamente, duas atribuições: (i) a produção de inteligência financeira que nada mais e do que o tratamento de dados financeiros com o cruzamento de informações variadas que possibilitam a formulação de relatórios de inteligência financeira; e (ii) a atividade de supervisão de setores obrigados, regulamentando e monitorando a implementação de procedimentos e controles para que as empresas e atividades inseridas nos setores obrigados não sejam utilizadas como meio para o cometimento de ilícitos por quem delas se utiliza (em especial a lavagem de capitais).
Justamente por isso que, investido na condição de supervisor, o COAF, tal como já tinha observado em 2012, novamente voltou os seus olhos de atenção à atividade econômica de fomento mercantil (factoring), editando-se, para tanto, a Resolução nº 41/2022 - que dispõe sobre o cumprimento dos deveres de prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo e da proliferação de armas de destruição em massa, legalmente atribuídos a empresas de fomento comercial ou mercantil (factoring).
Para a atividade de factoring e assemelhadas, a Resolução nº 41/2022 veio para repaginar a antiga Resolução nº 21/2012, editada na época também para regulamentar a atividade de fomento mercantil.
Na prática, a nova resolução funcionará como importante ferramenta de modernização e aprimoramento de programas de conformidade voltados à contenção da lavagem de capitais.
Das principais inovações - em rápida comparação com a antiga resolução - se percebe: (i) importante ampliação de seu objeto e âmbito de aplicação em todo o espeque de atuação e negócios praticados por empresas de fomento mercantil e suas assemelhadas, ou seja, inova com rol mais abrangente de atividades de fomento mercantil obrigadas a seguir este novel regramento; (ii) o aprofundamento e detalhamento do que se espera das empresas e atividades obrigadas sobre efetiva política de governança voltada à prevenção à lavagem de dinheiro; (iii) imprime novos mecanismos a serem observados na criação da matriz de risco das empresas obrigadas; (iv) a ampliação dos procedimentos destinados à conhecer os clientes (Know Your Client - KYC), bem como impõe novas ferramentas a serem observadas no conhecimento de funcionários, parceiros e prestadores de serviços terceirizados; e (v) introduz novos critérios de monitoramento, seleção, registro e comunicação de operações (suspeitas ou não);
Por fim, a Resolução nº 41/2022, com o seu aprofundado conteúdo, prestará relevante serviço de orientação prática e balizamento sobre o que deve ser observado no dia a dia de programas de conformidade que se destinam às atividades de fomento mercantil, ou seja, entregando aos obrigados deste setor moderna gama de ferramentas para estarem e se manterem em compliance.
*Bruno Borragine é advogado, sócio do Bialski Advogados, mestrando em Direito Penal Econômico e especializado em compliance pela Fundação Getúlio Vargas-FGV
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.