Todas as vezes que ocorre um crime que atinge pessoas das classes sociais mais altas e mexe com o brio dos políticos, surge a seguinte indagação: o que podemos fazer para reduzir a criminalidade no Brasil, que é uma das maiores do mundo?
Tenho a minha receita na seara jurídica, mas claro que há necessidade de melhorar diversas outras áreas, como educação, saúde, esporte, lazer, trabalho, dentre outras para que o ser humano possa viver com dignidade.
Enquanto o Estado deve observar regras rígidas de conduta e processuais para prender e condenar os criminosos, estes não estão vinculados e nem devem obediência a nenhuma regra criada pelo homem, apenas ao direito natural de sobrevivência em que aquele que for mais forte e violento prospera.
Por isso, todas as vezes que as regras processuais são alteradas de modo a dificultar as investigações e a condenação dos criminosos, cada vez mais eles se sentem livres para agir e se mostram mais ousados e violentos, crentes na impunidade ou nas punições pífias para alguns crimes.
Vejam o que ocorreu no mega assalto em Araçatuba e no Shopping Iguatemi Esplanada em Sorocaba. Olhem o tamanho da violência e da ousadia.
E, do mesmo modo, o que aconteceu no “Mensalão”, na “Lava-jato” e em enormidade de situações análogas em que o crime organizado, o mecanismo corrupto que sobrevive há décadas, mostrou suas garras e poder.
E, hodiernamente, abundam os incêndios criminosos realizados pelo Primeiro Comando da Capital (PCC), organização criminosa cada vez mais poderosa e que não para de crescer, que enfrenta os órgãos de segurança pública sem nenhum tipo de receio.
Isso sem falar no império do tráfico no Rio de Janeiro, modelo que está a ser exportado para todo o país, contando com a colaboração das Cortes Superiores, que tratam esse fenômeno com desdém, criando cada vez mais empecilhos para as ações policiais e dificuldades para se chegar a um édito condenatório, a pretexto de proteger direitos individuais dos marginais e relegando a segundo plano os direitos coletivos dos cidadãos de bem. É a forma preponderando sobre o conteúdo, o que tem levado à anulação de processos e a consequente absolvição dos traficantes, mesmo quando flagrados com elevada quantidade de drogas.
Diferentemente de muitos outros países, nossa legislação engessa as investigações e o processo, que pode perdurar por anos a fio, até mesmo décadas, e, ainda assim, quando chegar ao final, por questões processuais, que muitas vezes não causaram nenhum prejuízo ao réu ou foram criadas de última hora por algum Tribunal, contrariando o que até ali era decidido, ser anulado desde o início.
E pior, muitas vezes, depois de tramitar por longo tempo, o crime ser atingido pela prescrição, o condenado já ter morrido ou estar tão velho ou doente que lhe é imposta prisão domiciliar em uma demonstração de total impunidade, tudo isso alinhado com penas ridículas para muitos crimes de suma gravidade, como os de corrupção, peculato, tráfico de drogas (réu primário e de bons antecedentes) e outros do gênero.
O resultado disso tudo é sermos conhecidos mundialmente como o país da impunidade em que o crime compensa.
É necessária uma reforma urgente de nosso sistema processual, reduzindo o número de recursos existentes, que leva à eternização dos processos; que o STF passe a ser apenas um Tribunal Constitucional; que seja autorizado o início do cumprimento da pena após a condenação ou sua manutenção em segunda instância; fim do foro privilegiado ou reduzido apenas para os chefes de Poderes; e que qualquer condenação seja anulada somente quando advier prejuízo concreto para o réu.
Além dessas reformas processuais, faz-se necessário que, no âmbito do direito material, sejam cominadas e impostas sanções rigorosas para os crimes mais graves, assim entendido não apenas os cometidos mediante violência e grave ameaça à pessoa (estupro, roubo, homicídio etc.), mas também aqueles que causam prejuízo, direto ou indireto, à toda coletividade, isto é, que violem bens jurídicos coletivos e difusos de suma importância, como o tráfico de drogas (saúde pública), corrupção (administração pública) e outros do gênero, cujos malefícios são enormes para a população de bem.
Claro que de nada adianta tudo isso se o sistema de execução penal não deixar de ser um faz de conta, com tantos benefícios que as penas chegam a ser reduzidas da metade (remição, indulto e comutação), e que haja o efetivo cumprimento da reprimenda prisional, já que, em razão do sistema progressivo, o tempo de encarceramento mostra-se insignificante em muitos casos.
Evidentemente, o Poder Executivo também tem de dar a sua contribuição com a construção de novas unidades prisionais condignas para o cumprimento da pena, sem o que ela é despropositada e se torna mera vingança estatal, que longe está de ser sua finalidade.
Essas são apenas algumas sugestões que tenho certeza de que a imensa maioria da população espera sejam implementadas para o bem de toda coletividade e para que deixemos de ser o país da impunidade.
Não desconheço que a maioria das sugestões demanda alteração constitucional e legislativa.
Por outro lado, muitas das sugestões dependem apenas da mudança da jurisprudência, notadamente dos Tribunais Superiores, que a cada dia que passa flexibilizam o direito penal e endurecem o processual penal, de modo a dificultar as investigações e condenações e, quando estas ocorrem, a reduzir drasticamente o tempo de encarceramento dos sentenciados, normalmente dos que cometeram crimes graves ou teimam em delinquir, já que para o restante são aplicadas penas restritivas de direitos, que, se bem executadas e fiscalizadas, são excelentes para a prevenção e repressão aos crimes mais leves.
Não tenho muita esperança de ver alguma alteração na jurisprudência, na legislação e muito menos a construção de novas unidades prisionais para que o Brasil deixe de ser o país da impunidade, posto que o mecanismo instalado não as quer.
A intenção de vários dos ministros das Cortes Superiores, de acordo com o externado em artigos, entrevistas, palestras e mesmo em seus votos, é o esvaziamento do sistema prisional com a consequente soltura de inúmeros marginais, que, decerto, colocarão a sociedade em maior risco do que já se encontra. Isso sem contar a sensação de impunidade e o mal-estar causado pela soltura dos piores marginais que este país já viu, muitos dos quais condenados por corrupção, lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e outros crimes de suma gravidade,
No mesmo sentido estão os parlamentares, que, na maioria das vezes que mexem no direito penal e processual penal, é para piorar para a sociedade e para beneficiar os bandidos, bastando ver as recentes alterações legislativas, que não canso de abordar nos artigos escritos, que se encontram na Rede.
E, por fim, tem-se o Poder Executivo, tanto na esfera federal quanto na estadual, que, em regra, não se dispõe a abrir novas vagas no sistema prisional ou, ao menos, reformar as unidades existentes para que uma das principais finalidades da pena seja alcançada, qual seja, a ressocialização do condenado, visto que essas medidas não angariam votos, pelo contrário.
Infelizmente, a receita é fácil de idealizar, mas muito difícil de executar pelos mais variados motivos, alguns inconfessáveis.
Convidado deste artigo
As informações e opiniões formadas neste artigo são de responsabilidade única do autor.
Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Estadão.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.