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Opinião | O combate à corrupção na nova era Trump: um retrocesso preocupante para o Brasil

Trump foi além: sua bandeira está na “restauração da competitividade das empresas norte-americanas” para que tenham “vantagens comerciais estratégicas em todo o mundo”. Ou seja, a lógica do combate à corrupção não apenas foi invertida, mas simplesmente deixou de existir

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Por Leonardo Ruiz Machado

Coincidência ou não, na última segunda-feira (10/2), logo após a Transparência Internacional (TI) – entidade de referência global no combate à corrupção – divulgar o Índice de Percepção de Corrupção de 2024 (veja detalhes aqui), o presidente norte-americano Donald Trump assinou mais um decreto presidencial, também na presença de jornalistas que estiveram no Salão Oval, determinando que Pamela Bondi, recém-empossada no cargo de Advogada-Geral do Departamento de Justiça Norte-americano (DOJ), “suspenda as ações e investigações com base na Lei Anticorrupção dos EUA (conhecida pela sigla em inglês FCPA), até que ela emita orientações revisadas de aplicação da FCPA que promovam a competitividade americana e o uso eficiente dos recursos federais de aplicação da lei” (veja a exposição de motivos publicada pela Casa Branca aqui).

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O interessante é que no dia 7 de fevereiro, Pamela Bondi já havia emitido um memorando específico que impôs mudanças na aplicação da FCPA (aqui), determinando que os procuradores do DOJ deveriam “passar a priorizar as investigações relacionadas ao suborno estrangeiro que facilita as atividades ilegais” de Narcotraficantes e Organizações Criminosas.

Ao que parece, Donald Trump não ficou satisfeito com as novas diretrizes de sua Advogada-Geral que apenas alteraram o foco das investigações para priorizar o suborno de autoridades públicas estrangeiras envolvendo o tráfico de seres humanos, de drogas e de armas.

Trump foi além: sua bandeira, mais do que proteger a segurança nacional, está na “restauração da competitividade das empresas norte-americanas” para que tenham “vantagens comerciais estratégicas em todo o mundo”.

Ou seja, a lógica do combate à corrupção da nova era Trump não apenas foi invertida, mas simplesmente deixou de existir.

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O retrocesso é enorme, já que a mensagem agora é clara: se uma empresa sujeita à FCPA está fazendo negócios num país em que a corrupção de agentes públicos é um fator competitivo, ela pode se sentir à vontade para fazer o mesmo sem temer as multas bilionárias e demais sanções que até então vinham sendo aplicadas nos Estados Unidos.

E isso certamente trará um impacto muito negativo para o ambiente corporativo global, principalmente em países como o Brasil, em que as leis e as autoridades locais, incluindo o Supremo Tribunal Federal, vêm demonstrando nos últimos anos um claro abrandamento na aplicação das leis que compõem o microssistema jurídico de combate à corrupção no mundo corporativo.

O momento não poderia ser pior, haja vista que o Índice de Percepção de Corrupção publicado pela TI na última segunda, revela que o Brasil alcançou a sua pior performance em toda a história deste ranking, desde o seu lançamento em 2012.

O que nos resta agora é esperar pelas novas diretrizes da Advogada-Geral de Trump e torcer para que ela tenha a habilidade para definir, com alguma coerência, o que seriam as “medidas comerciais comumente utilizadas” pelos concorrentes globais das empresas sujeitas à FCPA, sem que a corrupção passe a ser, deliberadamente, um instrumento de barganha que poderá ser utilizado em negociações com agentes públicos mundo afora.

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Leonardo Ruiz Machado
Sócio do Viseu Advogados, responsável pela área de Compliance e Gestão de Crises. Foto: Arquivo pessoal
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