O progresso tecnológico tem acarretado alterações inevitáveis nas relações de trabalho, tanto públicas como privadas. No entanto, tratando-se de serviço público, os impactos da automação são, necessariamente, sentidos mais lentamente, considerando o privilégio da dita "estabilidade" dos servidores, já que o Estado atualmente não pode dispor livremente sobre o encerramento das carreiras e o consequente desligamento daqueles admitidos mediante concurso público.
Com a reforma administrativa, no entanto, esse cenário poderá mudar, quando vislumbramos a nova realidade, segundo o estudo do economista Willian Adamczyk, doutorando da PUC-RS, em coautoria com Leonardo Monastério, coordenador-geral de ciências de dados na Escola Nacional de Administração Pública (Enap), e Adelar Fochezatto, professor na pós graduação em economia da PUC-RS, que será apresentado no Encontro Nacional de Economia da Associação Nacional dos Centros de Pós-Graduação em Economia (Anpec), em dezembro deste ano, de acordo com matéria publicada no Valor Econômico, que concluiu que o Executivo federal tem 105 mil servidores alocados em posições com alta probabilidade de automação.
De acordo com a matéria, "as funções mais 'automatizáveis' são, em geral as de escolaridade mais baixa", considerando o "maior impacto da automação sobre profissões de menor qualificação e menor nível salarial".
Assim, quando se vislumbra a iminente reforma administrativa, que intenta, sobretudo, extirpar a estabilidade dos servidores que ingressarem sob a égide da nova legislação, sob a alegação de redução de custos e elevação de produtividade, o que se observa é a clara possibilidade de extinção de algumas funções e até carreiras, com a consequente redução dos concursos públicos.
Tais impactos já são, há muito, uma realidade, como, por exemplo, vem ocorrendo com as tarefas dos digitadores, que estão sendo substituídas gradativamente por tecnologias mais avançadas.
Por outro lado, nas atividades em que, por sua própria natureza, o elemento humano afigura-se imprescindível, a automação tende a assumir um caráter complementar, causando menos impactos, como ocorre nas áreas de pesquisa e saúde.
Diante da concretização das inovações e o aumento do campo de abrangência da automação sobre as carreiras dos servidores, em geral, o judiciário poderá se deparar com situações nunca antes debatidas e levadas ao seu crivo, quando instado a apresentar soluções de conflitos surgidos com a nova realidade, em contrapartida aos rígidos princípios que regem as carreiras dos servidores públicos.
*Laís Pinto Ferreira é advogada e sócia da Unidade Salvador do escritório Mauro Menezes & Advogados
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