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Opinião | Para fortalecer os direitos das mulheres, precisamos aprender uma linguagem comum

Identificar consensos, superar barreiras e criar soluções que representem a diversidade feminina no Brasil são caminhos para evitar retrocessos

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convidado
Por Carolina Althaller

Num Brasil onde as tensões ideológicas ainda dominam o debate público, compreender as percepções e experiências das mulheres é essencial para evitar retrocessos na agenda de direitos e avançar na construção de uma sociedade mais inclusiva e representativa.

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Como as mulheres brasileiras percebem o feminismo e seus valores? De que forma essas ideias impactam suas vidas cotidianas, na prática, em suas escolhas e aspirações? Quais são as prioridades de quem enfrenta desafios sociais tão distintos, desde a violência doméstica até as desigualdades econômicas? E como essas realidades moldam suas demandas e relação com as políticas públicas voltadas aos seus próprios direitos? São perguntas que podem nos ajudar a compreender a riqueza das experiências femininas no Brasil, indo além das diferenças políticas, geográficas e de classe para revelar uma diversidade que reflete a dimensão e a pluralidade do nosso país.

Há avanços visíveis. Em dezembro, a Câmara dos Deputados aprovou um importante pacote de medidas – entre elas a tipificação do crime de violação virtual de domicílio, o aumento da punição para o registro não autorizado de intimidade e a concessão de guarda provisória de menores em casos de violência doméstica e familiar. Outras iniciativas incluem a criação do Programa de Reconstrução Dentária para Mulheres Vítimas de Violência Doméstica no SUS e a implementação de diretrizes para combater a violência contra mulheres em ambientes universitários.

Ainda assim, a ameaça de retrocessos persiste. A sub representação feminina nos espaços de poder político limita o alcance de pautas voltadas à equidade de gênero, enquanto os altos índices de feminicídios e outras formas de violência continuam a expor a insuficiência de medidas preventivas e protetivas. A Lei Maria da Penha, marco no combate à violência doméstica, é frequentemente alvo de tentativas de alteração legislativa. Embora mudanças recentes, como a concessão imediata de medidas protetivas, reforcem sua aplicação, propostas que priorizam punições em detrimento de ações preventivas podem enfraquecer sua eficácia.

Compreender o que as mulheres brasileiras pensam sobre os feminismos e suas prioridades é primordial nesse cenário. Essa escuta, orientada por dados confiáveis e comprometida com o diálogo, pode equilibrar discursos e construir pontes entre diferentes visões, ampliando o alcance e a legitimidade da causa.

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Pois, apesar das divergências políticas e sociais, há fortes indícios de que consensos importantes unem as mulheres em torno de questões fundamentais – como igualdade salarial, divisão do trabalho doméstico e enfrentamento à violência de gênero. Essas prioridades compartilhadas foram identificadas em pesquisa encomendada ao Ideia Big Data pelo projeto Mulheres em Diálogo, do Instituto Update, às vésperas das eleições de 2022, com análise da cientista social Esther Solano e da cientista política Camila Rocha.

O estudo mostrou que mulheres à direita também se consideram feministas, ou melhor, apoiam pautas centrais dessa agenda, embora rejeitem o rótulo de “ativistas” – especialmente quando associado ao estereótipo daquelas que, nas palavras de diversas entrevistadas, saem às ruas para protestar e “exibir seus corpos”. Essas informações, muito balizadas por códigos morais e religiosos, revelam a complexidade das identidades femininas no país e apontam para a necessidade de uma abordagem que leve em conta tanto as nuances quanto os preconceitos que dificultam o diálogo e a cooperação.

São essas concepções equivocadas que, aliadas à desinformação e às fake news, alimentam barreiras artificiais entre grupos que, na prática, compartilham objetivos comuns. Reconhecê-las e compreendê-las é o primeiro passo para suavizar divisões e fortalecer o trabalho em prol dos direitos das mulheres.

Ao mesmo tempo, essa diversidade de experiências pode ser encarada como uma base valiosa para o diálogo, capaz de gerar soluções coletivas que reflitam as necessidades de diferentes realidades. A escuta ativa e a valorização da pluralidade são indispensáveis para superar preconceitos e encontrar caminhos que, em vez de dividir, aproximem. O que precisamos agora é aprender a falar essa linguagem comum e considerar que só a experiência feminina pode transformar, ajudando a construir espaços diversificados e justos na sociedade, além de medidas mais adequadas para os problemas que enfrentamos atualmente.

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Diretora executiva do Instituto Update. Foto: Clara Sthel
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