O Poder Executivo Federal vem construindo – no gerúndio – uma PEC, chamada da Segurança Pública, para alterar os artigos 21 (competências da União), 22 (competência legislativa privativa da União), 23 (competências comuns da União, Estados, Distrito Federal e Municípios) 24 (competência legislativa concorrente da União, Estados e Distrito Federal) e 144 (dispõe sobre Segurança Pública) da Constituição Federal. Mas, apesar do esforço demonstrado, o que há de bom no que se viu até agora? Pouco, como propor a coordenação federal das políticas de segurança, incluindo-as nas prerrogativas da União. Assim como no SUS, que induz política de saúde para o país, a União traria as diretrizes do sistema único de segurança – SUSP - e a constitucionalização do Fundo de Segurança e do Fundo Penitenciário, destinados à área. Ponto. No mais, a PEC apenas amplifica o superado modelo atual de segurança, e naquilo que o tempo limitou a eficácia, inclusive nos estados, ao propor, por exemplo, a transformação da Polícia Rodoviária Federal - PRF em Polícia Viária Federal - PVF. Aqui um parêntese: as Polícias Militares dos Estados são instituições centenárias que já fazem o policiamento ostensivo, preventivo e repressivo. Hoje atuam no limite desse padrão atual. Isso observado, colocar a União com sua PVF nas ruas (estradas federais, hidrovias e ferrovias) o que acrescentaria de bom ao policiamento? Na prática, a PVF terá potencial de amplificar o (mau) confronto que já existe e que não funciona mais (aquilo que passa do limite atual). A PEC não caminha para novo modelo de segurança. Não propõe e não há avanço para um novo desenho de polícia judiciária, de investigação e inteligência, inclusive com necessárias alterações legislativas. Exemplo disso, ao que se sabe, o Ministério Público, destinatário final das investigações e titular das ações penais públicas, não foi ouvido na elaboração da PEC.
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O Brasil não é mais o país da década de 1980 (década da Constituição). Os agentes agressores não são mais delinquentes isolados. A criminalidade da década de 2020 é estruturada; confrontar os delitos de 1980 com ostensividade e repressão deu seu resultado. Hoje, 40 anos depois, esse confronto já não traz o mesmo efeito, ao contrário. Como o crime para se estruturar não depende de PEC ou Lei, avançou rápido e se organizou. Já o Estado mantém sistema anacrônico. Para enfrentar esse criminoso é necessário mudar, não amplificar o que já não funciona. A PEC que será discutida no Congresso deve partir para a preponderância da repressão qualificada. Como? Investigação. Proporcionar às agências de polícia judiciária melhores instrumentos legais. Sinergia com atuação da Polícia Federal (essa deveria ser ampliada), Polícia Civis de cada Estado e os Ministérios Públicos. A maior facção criminosa do país não está mais nas “biqueiras”. Está no tráfico transnacional. As ações passam pelos estados e envolvem da União.
O que se planeja, por exemplo, para cuidar da realidade de, atualmente, 800 mil presos e a estimativa de 5 milhões de ex-presidiários? O Estado brasileiro, com a Lei Antidrogas, entre outros equívocos, proporcionou crescimento exponencial desses presos, muitos dos que saem e se tornam mão de obra fungível do crime organizado (mesmo que a princípio não queiram). Qual política pública será aplicada? Qual a abordagem para a política de encarceramento de pessoas em massa e sem periculosidade?
Qual ação de Inteligência e regulação de mercados sensíveis? Seguindo o exemplo de São Paulo que fez com a lei dos desmanches de autopeças no final na década de 2000 colhendo bons resultados? E para outros segmentos, também sensíveis ao crime organizado? Os Estados não têm competência constitucional para legislar, e a União, que detém a competência legislativa, deveria enfrentar. O novo Código de Processo Penal que tramita há 13 anos! Drogas, Combustíveis, Comércio... A propósito, já poderia e deveria ter feito por meio de normas infraconstitucionais, nestes dois anos!
Espera-se, agora, que o Congresso Nacional substitua a PEC do confronto pela PEC de novo modelo de segurança pública, alterando o vetusto sistema vigente no país.