A Força Integrada de Combate ao Crime Organizado (FICCO), da Polícia Federal, deflagrou na manhã desta quinta-feira, dia 12, a Operação Latus Actio II, que prendeu um investigador, fez buscas nas casas de um delegado e de outro investigador da Polícia Civil e atingiu artistas e influenciadores digitais - entre eles os MCs Brisola, GHdo 7 e Paiva. A ação aumenta a crise na Segurança Pública de São Paulo, já sacudida por denúncias de violência policial envolvendo PMs e achaques feitos por policiais civis contra integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC).
De acordo com as provas colhidas pelos federais, os MCs teriam pagado propinas de R$ 20 mil a R$ 100 mil a policiais civis em troca de vista grossa às rifas ilegais que eles promoviam nas redes sociais. Os policiais também enviavam relatórios de investigação confidenciais para proteger os criminosos a fim de os pressionar para obter o dinheiro dos artistas.
O Estadão busca contato com as defesas de policiais e MCs citados no inquérito da PF em manifestação da Promotoria. O espaço está aberto. Tanto a Secretaria da Segurança Pública quanto a Polícia Civil acompanham o desenrolar das investigações.
O investigador Rodrigo Barros de Camargo, o Rato, do 6.º Distrito Policial de Santo André, na Grande São Paulo, teve a prisão decretada pelo suposto recebimento de propina para “evitar ou interromper investigações relacionadas às rifas ilegais promovidas por artistas da Love Funk”.
O investigador Camargo, o ‘Rato’, foi o alvo principal da Operação Latus Actio II. A nova ofensiva apura a ligação de artistas e empresários de funkeiros com a lavagem de dinheiro de integrantes do PCC, sonegação de impostos, loterias ilegais e ocultação de patrimônio via compra de carros de luxo, fazendas, adegas e barras de ouro.
De acordo com a Promotoria, ‘Rato’ seria a peça central de uma “rede criminosa que demonstrou estrutura organizada, com divisão de tarefas, uso de empresas para movimentação de recursos e articulação entre empresários, artistas e agentes públicos, evidenciando a prática de corrupção ativa, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e exploração de jogos de azar”. Ele foi preso nesta manhã.
Quatro promotores subscrevem manifestação do Ministério Público apoiando os pedidos da PF na Operação Latus Actio II - Juliano Carvalho Atoji, Carlos Bruno Gaya da Costa, Fábio Ramazzini Bechara e Eduardo A. Velloso Roos Neto. Eles são integrantes do Gaeco, o Grupo de Combate ao Crime Organizado. O documento aponta indícios de envolvimento de outro policial, Adriano Fernandes Bezerra, o ‘Espanhol’, parceiro de ‘Rato’ no 6.º DP de Santo André.
Segundo os promotores, os dois policiais foram mencionados em mensagens de WhatsApp como “articuladores da corrupção passiva para proteger os envolvidos nos crimes de contravenção penal e lavagem de dinheiro”. O delegado Alexandre Custódio Neto, diretor da FICCO, obteve ainda na Justiça o afastamento da função pública de Rato, e dos outros dois policiais investigados: Espanhol e o delegado Gilmar Camargo Bessa, que os chefiava.
Os diálogos que levaram à abertura da ofensiva foram recuperados durante a primeira fase da Operação Latus Actio, em março. Como mostrou o Estadão, no celular de um dos investigados - o empresário Vitor Hugo dos Santos -, foram achados registros de pagamentos de propinas a policiais.
Em uma ocasião, Vitor Hugo escreveu. “Então, eles queriam 1 milhão e meio, já baixamos para 800, depois foi para 500 e agora eu falei para eles que vão mandar um café lá para eles 50 mil.”. Em outra, um MC indicou qual o percentual das rifas que seria encaminhado aos investigadores sob suspeita. “Polícia eu pago 7%, porém eu fechei 150 mil.”
‘Rato’ e ‘Espanhol’ foram alvos de diligências da Polícia Federal nesta quinta, 12. A PF também vasculhou endereços ligados ao delegado Gilmar Camargo Bessa, titular do 6º DP de Santo André. Segundo o inquérito, o nome de Bessa aparece em documentos identificados ao longo da investigação, “levantando a hipótese de conhecimento ou participação nos atos ilícitos relacionados à ocultação de provas e proteção aos responsáveis pelas rifas ilegais”.
Os diálogos que respingam em Bessa foram mantidos entre Victor Hugo e Mc Brisola. Na conversa, este último fala sobre um suposto pagamento de propina de R$ 20 mil para policiais civis de Santo André com o intuito de arquivar uma investigação registrada em boletim de ocorrência lavrado no 6º DP.
No diálogo, o MC manda para o empresário uma foto do relatório da Polícia sobre o caso. O caso envolvia a rifa de uma Fiat Toro Branca via o Instagram do influenciador. Victor Hugo então bradou: “Mas você não tá pagando um polícia lá? Não né? Esses caras ficam louco. Você tem que ganhar um dinheiro aí e dar uma sumida. Os caras ficam atrás de dinheiro, até o dia 10, dia 20 é uma loucura”.
O empresário então questionou “o que queriam” os policiais. O MC responde: “200 mil reais”. Ele emendou que não pagou o valor total. “Vou paga 10%”. O diálogo ocorreu em novembro de 2023, meses antes da primeira fase da Operação, ocorrida em março deste ano.
MCs
A operação também mira três MCs: Brisola (Silas Rodrigues Santos), Paiva (Davi José Xavier Paiva) e MC GHdo7 (Gustavo Henrique Ramos Toledo).
A Promotoria aponta que, ao passo de usar sua influência para turbinar as rifas ilegais e atrair participantes, Silas direcionava parte dos recursos do jogo de azar para “finalidades ilícitas”, incluindo propinas a policiais para garantir a “continuidade de suas atividades criminosas”.
Mc Paiva teria sido beneficiado por “negociações ilícitas nas quais propinas foram pagas a policiais civis para evitar ou interromper as investigações em curso”.
GH do 7 seria uma “das figuras centrais nas práticas ilegais relacionadas ao esquema” de rifas ilegais.
Segundo o Ministério Público, seu advogado passou a negociar com o investigador ‘Rato’ com vistas a barrar as investigações sobre as rifas ilegais. Dessa forma, a Promotoria aponta não só o envolvimento do MC na “prática de contravenções penais, mas também sua conexão com estratégias de obstrução à justiça, incluindo o uso de corrupção ativa”.