"Não desperdice uma boa crise", disse Churchill.
Crise não é novidade para executivos brasileiros. No entanto, nunca lidamos com algo parecido com a covid-19. O futuro que conhecíamos não aconteceu. Que paradoxal! Não gosto de jargões, clichês e frases feitas. Por isso, implico com a expressão ´novo normal´. Quando você estiver se acostumando a ele, pode esperar: o mundo vai dar um cavalo de pau e arremessá-lo para longe. No colo do recém-novo, pós-novo...
Uma das pérolas do mundo corporativo, o "ah, mas aqui, sempre fizemos assim", partiu, sem deixar saudade. Estamos há quase 100 dias fazendo tudo diferente. Acredito que o experimento home office terá como resultado o amadurecimento da força de trabalho. As pessoas estão se dando conta de que são mais capazes, autônomas e independentes no trabalho. Se antes íamos a fábricas ou escritórios porque lá estavam os bens e insumos de produção, não é mais assim. Os fatores de produção agora são portáteis e acessíveis, pelo menos para os espécimes cujo habitat é (era?) o escritório. Poderemos trabalhar para quem desejarmos e de onde quisermos.
Os setores de artigos de luxo, vestuário e viagens perderam 90% de suas receitas. Por outro lado, tudo o que é e-commerce, logística de delivery, saúde e ensino a distância cresceu bastante. Mudanças de perfil de consumo... Startups de tecnologia demitiram de 20% a 50% de seus quadros. Jovens que faziam fila para trabalhar nessas empresas agora estão procurando empregos ´seguros´ em empresas tradicionais. Mudanças de propósito? Famílias estão mudando para o interior. Mudanças de estilo de vida. Tudo isso em menos de três meses. Imprevisível, né? Mas esse é o panorama de hoje. Não sei como será o amanhã. Virá o diferente e para sempre cambiante.
As empresas precisarão se reinventar já que a distribuição relativa do PIB buscará um novo ponto de equilíbrio. Mas sabe o quê? Estudos sobre crises anteriores mostram que apenas 15% delas conseguirão colocar em prática o conselho de Churchill. Estamos todos nos preparando para a retomada dos negócios. Queremos voltar a trabalhar. Fazer a roda girar, como sempre fizemos. Mas não vejo uma retomada. Vejo um novo início. O jogo começa de novo, zerado. São condições novas e iguais para todos. O mundo mudou, está mudando, mudará. As consequências dessa crise ainda não são conhecidas. Sabemos como era o mundo. Temos uma ideia incompleta do período de transição que estamos vivendo. Desconhecemos o que está por vir.
Essa readequação ao mercado consumidor exigirá um redesenho das organizações. As estruturas internas precisarão mudar para atender as novas demandas do mercado. O headcount e o talento interno das empresas também será redistribuído. O que fará sentido para o consumidor final? O produto ou serviço mudará? O que a empresa fazia que não é mais relevante? O talento precisará estar em marketing, operações ou design? Quais serão as competências essenciais para o sucesso da empresa? Que tipo de profissional será importante para cada negócio ou empresa? Que competências esses profissionais precisarão demonstrar?
Para enfrentar esses desafios, precisaremos todos ser empreendedores.
*Marcelo Nobrega é conselheiro da Vee