PUBLICIDADE

Foto do(a) blog

Notícias e artigos do mundo do Direito: a rotina da Polícia, Ministério Público e Tribunais

STJ determina devolução integral do valor do veículo, decisão pode gerar enriquecimento indevido

PUBLICIDADE

Por Bruno Monfardini Vuolo
Atualização:
Bruno Monfardini Vuolo. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O Superior Tribunal de Justiça afastou, recentemente, a pretensão de uma montadora de veículo, que pediu a rescisão contratual de compra e venda de automóvel com base no valor de mercado do bem e não com a restituição da quantia paga pelo produto. O caso foi analisado no julgamento do Recurso Especial nº 2.000.701 - PR (2022/0130632-5).

PUBLICIDADE

De acordo com o entendimento do STJ, a pretensão da montadora recorrente não se mostra adequada. Isso porque "autorizar apenas a devolução do valor atual de mercado do bem e não o montante efetivamente despendido pelo consumidor quando da sua aquisição significaria transferir para o comprador os ônus, desgastes e inconvenientes da aquisição de um produto defeituoso".

Todavia, em que pese o entendimento exarado, a decisão encontra contradições na legislação vigente e na própria prática mercantil. Como se sabe, veículos sofrem desvalorização pelo simples fato de serem retirados da concessionária.

Ainda que a desvalorização não tenha um percentual fixo após a retirada do bem pelo proprietário, a quantia, em regra, varia entre 10% e 30%, podendo oscilar de acordo com diversos fatores. Entre eles, o tempo de uso, a condição do produto, o poder de comercialização do veículo, além de tantos outros. Entretanto, fato é que o veículo jamais terá o valor de nota fiscal novamente no mercado, como vem impondo o Superior Tribunal de Justiça.

Além disso, comumente, o mercado automotivo utiliza como parâmetro para avaliação de veículos usados a tabela Fipe. São realizados levantamentos de dados primários para a elaboração de índices, tabelas de preços médios e de quantidades de uma série de variáveis econômicas para precificar um veículo, fatores esses adotados em todo território nacional e que rege a relação do mercado automotivo no país.

Publicidade

Deste modo, impor aos fornecedores e fabricantes a devolução integral do valor pago pelo veículo pode se traduzir em verdadeiro enriquecimento indevido ao consumidor, ao contrário do que dispõe o artigo 884, do Código Civil.

É importante ressaltar que não se pretende a negar vigência aos direitos dos consumidores previstos no Código de Defesa do Consumidor, tampouco qualquer prerrogativa. Todavia, a restituição da quantia integral paga pelo bem viola a própria proibição de enriquecimento indevido, na medida em que, independentemente de eventual existência de vício ou defeito, como dito acima, os produtos já apresentam desvalorização inerente. Tal fato é incompatível com anos que uma demanda pode levar para transitar em julgado.

Vale destacar que, ao contrário do decidido, recentemente o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná decidiu que a quantia a ser restituída ao consumidor deve ocorrer de acordo com a tabela Fipe, considerando o uso de um ano do veículo pelo proprietário. O julgamento do processo nº 0021264-06.2010.8.16.0001 ocorreu na 17ª Câmara Cível, em 27 de agosto de 2020.

Na mesma linha, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul destacou inclusive que a devolução do valor de mercado do produto é feita com base em precedentes (Apelação Cível, nº 70074662875, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em 15 de março de 2018, assim como o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo igualmente decidiu em situação análoga na Apelação nº 1039146-40.2014.8.26.0002, na 36ª Câmara).

Tais decisões, ao mesmo tempo que consagram os direitos previstos no CDC, garantem que o enriquecimento indevido não seja caracterizado, preservando a razoabilidade e proporcionalidade.

Publicidade

Portanto, diante do contexto, as decisões nesse sentido encontram óbice no enriquecimento indevido, na medida em que as características inerentes desse segmento devem ser levadas em conta.

*Bruno Monfardini Vuolo é advogado associado ao escritório Meira Breseghello Advogados

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.