Em sessão extraordinária, o Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou uma resolução interna que visa regulamentar a prescrição para o exercício das pretensões punitiva nos processos de sua competência, de ressarcimento e executória.
Esse tema foi alvo de grandes discussões nos últimos anos a partir da mudança de entendimento e jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, especialmente após o julgamento do RE n. 636.886 (tema 899 de Repercussão Geral) e da Ação Declaratória de Inconstitucionalidade n. 5509.
No STF, o tema está pacificado, tendo a corte entendido pela aplicação da prescrição quinquenal (5 anos) das pretensões de ressarcimento e sancionatória das cortes de contas.
Por outro lado, no âmbito do TCU, até então prevalecia entendimento diverso. O Tribunal reiteradamente ratificava em suas decisões a imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário, bem como a aplicação da prescrição decenal (10 anos) para a pretensão punitiva, em sentido oposto ao entendimento do STF.
A análise da matéria no âmbito da Corte de Contas foi importante para alinhar o TCU à jurisprudência recente do STF, o que resultará em maior previsibilidade aos jurisdicionados e, consequentemente, maior segurança jurídica.
Contudo, apesar da resolução proposta estar em linha com o entendimento do STF no aspecto temporal - ocorrência da prescrição em 5 anos - alguns pontos carecem de maior esclarecimento:
- Qual deverá ser o marco inicial para a contagem dos prazos prescricionais?
Apesar da nova resolução do TCU ter adotado como base a Lei n. 9.873/99[1], diga-se de passagem, a mesma lei utilizada pelo STF, a Corte de Contas adaptou a redação original da Lei para a realidade do TCU e estipulou marcos distintos para considerar o início da contagem dos prazos para aplicar a prescrição.
Na visão do relator, Ministro Antonio Anastasia, as adaptações são necessárias em virtude de os processos de contas terem uma fase interna, ainda no âmbito do controle interno realizado em cada órgão da Administração Pública, que realiza os repasses de recursos públicos, assim como uma fase externa, quando o TCU passa a exercer sua função no julgamento das contas.
Se por um lado, a Lei 9.873/99 determina o início da contagem do prazo prescricional a partir da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado, de outro, a recente resolução aprovada pelo Plenário do TCU estipula quatro alternativas para a contagem da prescrição.
São elas:
- Da data em que as contas deveriam ter sido prestadas, no caso de omissão de prestação de contas;
- Da data da apresentação da prestação de contas ao órgão competente para a sua análise inicial.
- Do recebimento de denúncia ou da representação pelo tribunal ou pelos órgãos de controle interno, quanto às apurações decorrentes de processos dessa natureza;
- Da data do conhecimento da irregularidade ou do dano, quando constatados em fiscalização realizada pelo Tribunal ou pelos órgãos de controle interno;
Como é possível observar, há uma distinção entre considerar a data do fato e a data de conhecimento dos fatos apurados, que ainda provocará inúmeros debates em torno do instituto da prescrição no âmbito do Tribunal.
Há, ainda, um segundo aspecto a ser observado:
- Os marcos que interrompem a contagem da prescrição.
Na resolução proposta pelo TCU, diversas são as causas de interrupção do prazo. Notificação, oitiva, citação ou audiência, inclusive por edital, são alguns exemplos. O Tribunal, no entanto, foi além, ao considerar que os atos praticados pelos jurisdicionados do TCU, tais como os órgãos repassadores de recursos mediante transferências voluntárias e os órgãos de controle interno, entre outros, em processo diverso (fase anterior ao TCU), também são causas passíveis de interrupção.
Nesse ponto, o TCU extrapola os efeitos da novel resolução para os demais órgãos jurisdicionados, sabedor de que a morosidade de outros órgãos poderá interferir e prejudicar a atuação do TCU no futuro.
Na prática, isso torna a ocorrência da prescrição quase impraticável, diante das inúmeras situações de interrupção do prazo previstas na resolução.
Apesar de a resolução trazer uma orientação que se amolda ao entendimento do STF, inúmeras são as situações em que continuarão pairando dúvidas quanto ao instituto da prescrição, cabendo novamente ao judiciário enfrentar esse tema no futuro.
*Eduardo Lopes é advogado especialista em Regulação, Economia e Infraestrutura. Trabalhou por mais de 10 anos em renomados escritórios de advocacia, assessorando empresas nacionais e internacionais. É também membro da Comissão da Advocacia em Órgãos de Controle da OAB/DF e conta com larga atuação perante o Tribunal de Contas da União (TCU). Possui MBA em Regulação, Economia e Infraestrutura pela Fundação Getúlio Vargas (FGV)
[1] Estabelece prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta, e dá outras providências.