Bolsonaro liga momento atual à ditadura: ‘O que tentaram nos roubar em 64 tentam nos roubar agora’

Em discurso a empresários cheio de palavrões, o presidente disse que, ‘por Deus que está no céu’, nunca será preso

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Por Eduardo Gayer e Giordanna Neves
Atualização:
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BRASÍLIA E SÃO PAULO - Em discurso cheio de palavrões e com gritos, o presidente Jair Bolsonaro comparou o momento atual com 1964, ano do golpe militar, para dizer que a liberdade está ameaçada no País. “O que tentaram nos roubar em 64 tentam nos roubar agora. Lá atrás pelas armas, hoje pelas canetas”, afirmou o presidente em um evento com empresários nesta segunda-feira, 16, em São Paulo. “A liberdade é mais importante que a nossa própria vida.” O presidente voltou a enfrentar o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), citando a possibilidade de eleições “conturbadas”.

A suposta proteção às liberdades individuais e democráticas foi a justificativa utilizada pelos militares para derrubar o então presidente João Goulart e instalar o regime de exceção, que durou 21 anos no País. No mesmo discurso, Bolsonaro voltou a minimizar a defesa de golpe militar - o que é inconstitucional - em manifestações pró-governo. “Entendo tudo isso como liberdade de expressão”, declarou, chamando em seguida de “psicopata” e “imbecil” quem classifica os atos bolsonaristas como antidemocráticos por suas bandeiras.

O chefe do Executivo ainda disse se sentir um “prisioneiro sem tornozeleira eletrônica” no comando do País e descartou que um dia possa ser preso. “Por Deus que está no céu, eu nunca serei preso. Não estou dando recado para ninguém”, afirmou no evento da Associação Paulista de Supermercados (Apas).

O presidente Jair Bolsonaro participa de evento da Associação Paulista de Supermercados (Apas), com o ministro Paulo Guedes (à direita) e o ex-ministro e pré-candidato Tarcísio de Freitas (na ponta à esquerda).  Foto: Isac Nobrega/PR

Eleição ‘conturbada’ e inflação

Bolosnaro afirmou ainda que as eleições deste ano podem ser conturbadas. “Vocês (supermercadistas) foram excepcionais nessa pandemia, mas tudo pode acontecer. Poderemos ter outra crise. Poderemos ter eleições conturbadas. Imagine acabarmos as eleições e pairar para um lado, ou para o outro, a suspeição de que elas não foram limpas? Não queremos isso”, disse. “Só Deus me tira de lá [Presidência]. Não adianta inventar canetada.”

Em discurso com palavrões, Bolsonaro voltou a dizer que as eleições não podem ter qualquer suspeição. “Já vi falando que eu vou perder a eleição, vou perder minha família toda. Tá achando que vai me intimidar dando recado? Ou nós decidimos no voto, pra valer, contabilizado, auditado, ou a gente se entrega. E se entregar, vocês vão dar 50 anos ou mais pra voltar a situação que está hoje em dia”, afirmou o presidente, que, sem provas, levanta dúvidas sobre a lisura do sistema eleitoral brasileiro. Ele rechaçou, no evento, ser um ditador.

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Para o presidente, pré-candidato à reeleição pelo PL, as eleições deste ano são vistas como um “ponto de inflexão” para o Brasil e para o mundo”. “Alguns querem a volta à cena do crime”, afirmou Bolsonaro, em referência a uma frase do ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSB) nas eleições de 2018. Hoje, Alckmin é o pré-candidato a vice do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

No discurso, Bolsonaro reconheceu o impacto da inflação na disputa pelo Palácio do Planalto. Embora sem citar Lula nominalmente, Bolsonaro mostrou acreditar que o eleitor faz comparações entre passado e presente na hora de escolher seu candidato. “Uma parte da população não sabe ver diferença. Olha na ponta da linha como está o preço na gôndola do supermercado e vota de acordo com o que está vendo, achando que vai voltar o diesel a R$ 3, a lata de óleo a R$ 5″, disse o presidente, pré-candidato à reeleição.

Bolsonaro, no entanto, voltou a jogar a culpa da inflação na crise trazida pela pandemia da covid-19 e nas medidas de contenção do coronavírus.

O presidente disse ainda estar “buscando uma solução” para o preço dos combustíveis. “O mundo árabe nos adora, a recíproca é verdadeira”, disse o presidente, afirmando ter uma “excelente política externa”

Marco temporal

Mantendo o clima de tensão institucional, o presidente voltou a pedir que o Supremo Tribunal Federal não rejeite a tese do marco temporal e a ameaçou descumprir uma eventual decisão da Corte nesse sentido.

“O que sobra pra mim se o Supremo aprovar isso? Eu tenho que pegar a chave na Presidência e entregar no Supremo, ou falar ‘não vou cumprir’”, repetiu. “Não se pensa no Brasil de jeito nenhum, o Brasil que se exploda, essa é a máxima.”

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A revisão do marco temporal está paralisada no STF e, se aprovada, tem o potencial de ampliar o número de terras indígenas demarcadas no País. Hoje, o entendimento legal é de que povos indígenas só podem requerer demarcação de terras se comprovarem ocupação do território na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988.

O presidente ainda voltou a celebrar a queda de multas do Ibama e a defender o armamento da população. “Eu não durmo sem uma arma do meu lado”, disse o presidente.

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