Bruno Soller analisa o comportamento do eleitor brasileiro com base em big data e pesquisa

Opinião | Fragmentação da direita exige liderança de Bolsonaro

Caso realmente pretenda voltar ao poder, seja direta ou indiretamente, Bolsonaro precisa mais do que nunca agir ou sua posição no jogo poderá ser bastante prejudicada

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Foto do author Bruno Soller

Faltando pouco menos de dois anos para a escolha do próximo presidente da República, a incerteza eleitoral no campo da direita chama a atenção. Com o fraco desempenho do governo Lula, seria natural a oposição estar razoavelmente organizada em torno de um projeto e de um nome capaz de enfrentar um adversário difícil, mas ferido, em função dos resultados insatisfatórios de seu governo até o momento. Jair Bolsonaro, ex-presidente, mesmo inabilitado juridicamente, é o guardião natural desse espectro político e deveria ser o condutor desse processo, todavia, o que se vê é a pulverização de nomes, com surgimento de novos atores e uma fragmentação que pode ser fatal para o futuro do bolsonarismo.

As mais recentes pesquisas de opinião têm trazido cenários em que pelo menos oito nomes da direita são testados para presidência e há um movimento no Congresso Nacional para tentar viabilizar um nono nome, que é impedido por questão etária de participar do jogo, o deputado federal mineiro Nikolas Ferreira. Entre os nomes, dois parentes de Jair Bolsonaro, sua esposa Michele e seu filho Eduardo, quatro governadores de Estado, Ronaldo Caiado, de Goiás, Tarcísio de Freitas, de São Paulo, Romeu Zema, de Minas Gerias e Ratinho Junior, do Paraná, além do empresário e ex-candidato a prefeito de São Paulo, Pablo Marçal e o cantor Gusttavo Lima. Cada um com uma característica, mas todos num guarda chuva de votos que em sua imensa maioria escolheu Bolsonaro, em 2022.

Jair Bolsonaro, ex-presidente da República Foto: Wilton Junior/Estadão

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Donald Trump conseguiu uma imensa vitória nas prévias dos Republicanos, mas todo o processo exigiu muita liderança e capacidade de articulação para fazer nomes que o incomodavam diretamente nas pesquisas a recuarem e apoiarem seu projeto. O governador da Flórida, Ron de Santis é o maior exemplo disso. Ambos tiveram diversos desentendimentos públicos, principalmente na questão da pandemia e De Santis chegava a marcar 26% de intenção de votos em algumas pesquisas, como a da Siena College. Por oito meses ambos se enfrentaram, mas a derrota em Iowa, foi fundamental para que De Santis não só deixasse de ser candidato como declarasse apoio a Trump, mesmo tendo outras candidaturas postas, como a da ex-governadora da Carolina do Sul, Nikki Haley, a quem chamou de um “pacote reembalado de corporativismo”, colocando-a como uma representante do velho GOP.

O resultado eleitoral da prévia de Iowa foi determinante para mostrar a força de Donald Trump, mas os seus gestos para De Santis foram tão ou mais importantes do que isso. Liderança e força aliadas conduziram Trump a ter uma vitória acachapante nas prévias, que se iniciaram com 11 postulantes. Nesse sentido, Bolsonaro não tem mostrado nem uma coisa e nem outra, e isso pode ser fatal para seu futuro político. Suas decisões na eleição municipal tanto de gestos como de apoios mostraram um cenário não positivo para ele. Algumas brigas locais, sem sentido, fizeram-no sair derrotado por aliados que agora parecem ser possíveis adversários. Em Goiânia, a maior expressão desse erro político, Bolsonaro foi presencialmente apoiar um candidato de seu partido contra o candidato de Caiado, mesmo todas as previsões apontando para uma vitória tranquila do candidato do governador.

Das 11 cidades em que fez campanha no segundo turno das eleições municipais do ano passado, Jair Bolsonaro viu seus candidatos serem derrotados em oito delas. Um aproveitamento pífio, de menos de 30% de taxa de sucesso. O cenário pode ser considerado ainda pior, quando em São Paulo, uma em que seria possível creditar a vitória a seu apoio, a realidade mostrou uma campanha que o escondeu na maioria das vezes, tendo sido Tarcísio de Freitas, o governador do Estado, o cabo eleitoral mais prestigiado pelo vitorioso Ricardo Nunes.

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O recente episódio sobre a negativa da sua saída do País para prestigiar a posse de Trump mostrou um Bolsonaro ainda mais fragilizado. Chorando copiosamente no aeroporto, Bolsonaro não demonstrou a força e a garra para lutar contra o sistema, como sempre propõe em suas falas, mas revelou com seu ato alguém ferido e sem grande poder de reação. Reativando suas aparições mais frequentes nas redes sociais, Bolsonaro saiu a público para fazer revisões sobre seu governo, cobrar fidelidade de aliados, como o senador Marcos Pontes, o astronauta, que tenta bancar uma candidatura de lobo solitário no Senado Federal, expondo ainda mais a escolha pelo sistema, feita por Bolsonaro, ao apoiar Davi Alcolumbre, mesmo candidato de Lula, além de dar indiretas a Nikolas Ferreira ao comentar que “fica aparecendo ali, querendo likes” e “querendo reduzir a idade”. Nikolas teve uma explosão de interação nas redes após a publicação de um vídeo, considerado essencial para fazer o governo recuar sobre o projeto que tratava a respeito das fiscalizações de movimentação do Pix.

Brigando contra o passado e mostrando fragilidade em unificar os aliados no presente, Bolsonaro quase não fala do futuro. O ex-presidente precisa reformar sua estratégia comunicacional para romper uma barreira de rejeição, que já se demonstrou implacável, quando derrotado por Lula, em sua própria reeleição. Ampliar, liderar e mostrar força, tendo tantos aliados em cargos fundamentais, governando os principais PIBs do País e enfrentando um governo capenga, com poucas entregas e que tem visto sua desaprovação aumentar exponencialmente, deveriam ser os lemas de Bolsonaro, que mesmo sem poder se candidatar, reúne as condições necessárias para ser o dono dessa raia oposicionista.

A construção de imagem de Eduardo Bolsonaro como um chanceler da direita, alguém que se relaciona e transita bem nos fóruns internacionais do movimento conservador, levam a crer que o terceiro filho de Bolsonaro, está sendo preparado para a missão em substituí-lo como candidato presidencial. A ida a posse de Trump, as demonstrações de proximidade com Javier Milei e mostras de carinho à figura do pai são algumas dessas ações que tem repercutido e aumentado seu cacife para uma candidatura. No entanto, para conseguir reunir o apoio necessário a seu pupilo, Bolsonaro precisará trabalhar muito para conter os demais postulantes.

Lula quando preso, incentivou sua candidatura até o final, mas já tinha clareza e unidade em torno de um nome que o substituiria. Assim foi com Haddad, em 2018, quando a campanha dizia que Haddad é Lula. Mesmo sabendo da dificuldade que seria a vitória naquele momento, o resultado de Haddad foi satisfatório e muito acima daquilo que tinha de capacidade para o pleito. Bolsonaro precisa liderar essa oposição, apoiando-se em seu apelo popular, na força de seu partido político e ainda na baixa dimensão nacional dos candidatos que postulam sua herança. Bolsonaro precisa ser mais Trump, na lógica de que não há espaço para outrem em um campo dominado. O empresário da mídia americana, Donald McGannon certeiramente disse: “liderança é ação, e não posição.” Dessa forma, caso realmente pretenda voltar ao poder, seja direta ou indiretamente, Bolsonaro precisa mais do que nunca agir ou sua posição no jogo poderá ser bastante prejudicada.

Opinião por Bruno Soller

Bruno Soller é estrategista eleitoral. Especializado em pesquisas de opinião pública, é graduado em Relações Internacionais pela PUC-SP, com especialização em Comunicação Política pela George Washington University. Trabalhou no governo federal, Câmara dos Deputados e Comissão Europeia.

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