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Opinião | Governo Lula culpa comunicação por seu revés, em vez de avaliar se há tanto de bom para comunicar

Gestão está próxima de completar dois anos nos quais tem sido difícil lhe identificar um norte, mas escolhe o mordomo de sempre para apontar como responsável pelo fracasso

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Foto do author Carlos Andreazza

O governo Lula já identificou o problema. A culpa é da comunicação. Sempre é. Se a cousa não vai bem, ou não tão bem quanto forçaria a propaganda, a responsabilidade tomba sobre o mensageiro. Padrão. Será o máximo concedido à autocrítica. Indisposto – o que comunica mal – a avaliar o que haveria para comunicar. Indisposto – o que comunica mal – a avaliar se haveria tanta coisa (boa) assim para comunicar.

Não é a primeira vez que este governo atribui seus reveses – suas dificuldades – à comunicação. Terá talvez algo a ver com promessas-adiamentos de final de ano. Vai melhorar no que vem. Junto com a nova dieta. Junto com um pacote de corte de gastos que corte gastos. Junto com o BC socialmente sensível de Galípolo.

O presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ministro da Secom, Paulo Pimenta Foto: Wilton Júnior/Estadão

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Especula-se também sobre reforma ministerial. Para ter, por exemplo, mais União Brasil na Esplanada. De repente Elmar Nascimento ministro. Planta-se que foi superada a resistência à possibilidade de o deputado ganhar ministério. É uma forma de comunicação. Reforma ministerial para contemplar partido – confederação de patrimonialismos – que não é partido, que já está no governo e que não lhe dá base de apoio confiável. Comunica-se.

O governo está próximo de completar dois anos. Difícil lhe identificar o projeto – o norte. Quer se comunicar melhor, porém. “Começar inclusive fazendo uma licitação para que a gente tenha a questão da digitalização levada muito a sério” – disse o presidente. A licitação a respeito que se pôs na rua, de quase R$ 200 milhões, foi barrada em julho, pelo TCU, apontadas o que seriam ocorrências “de extrema gravidade” relativamente ao sigilo do certame.

Nova licitação virá. Lula se compromete: “Alguma coisa precisa ser mudada para que as pessoas tenham acesso àquilo que estamos fazendo”.

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O problema nunca é o objeto da comunicação. Jamais a qualidade daquilo “que estamos fazendo”. É o comunicador. O PT – o presidente à frente – insatisfeito não apenas com o trabalho de Paulo Pimenta. Também com o que seria a “timidez” dos porta-vozes do governo – os outros ministros, especialmente os do partido. Defenderiam pouco, com pouca vontade, as realizações de Dilma 3.

Seria o caso de se examinar por quê. Porta-voz tímido é porta-voz sem convicção. Não necessariamente desinformado. Porta-voz tímido não é exatamente um tímido. Está mais para realista. Porta-voz tímido porta-voz não é. Seria o caso de se examinar as realizações.

O jornalista Fábio Zambeli definiu a parada: “Quando a coisa vai mal, a culpa é da comunicação. É o mordomo da política”.

A comunicação é o mordomo da política. O mordomo é ruim de serviço mesmo. A questão é sobre se poderia ser diferente. Não existe comunicação ruim de governo bom.

Opinião por Carlos Andreazza

Andreazza foi colunista do jornal O Globo e âncora da Rádio CBN Rio, além de ter colaborado com a Rádio BandNews e com o Grupo Jovem Pan. Formado em jornalismo pela PUC-Rio, escreve às segundas e sextas.

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