PUBLICIDADE

Casos criminais são maioria em plenário do STF

Das decisões colegiadas do Supremo em 2017, 56,5% foram sobre matéria penal, segundo estudo da FGV; alta começou em 2007

PUBLICIDADE

Prestes a retomar o julgamento da prisão após condenação em segunda instância, o Supremo Tribunal Federal (STF) está abrindo cada vez mais espaço em sua pauta para questões criminais. Quando se levam em conta apenas casos levados ao plenário e às duas turmas, mais da metade das decisões conjuntas dos ministros são em matéria penal, como habeas corpus.

Na prática, isso faz com que a mais alta Corte do País se dedique a questões individuais, que não geram repercussão para outros casos, enquanto juristas defendem que o colegiado deveria se ocupar mais das matérias constitucionais, cujo impacto atinge a todos. 

Para juristas, Supremo deveria se concentrar em questões constitucionais Foto: Nelson Jr./SCO/STF

PUBLICIDADE

A partir de 2007, os julgamentos de assuntos criminais no Supremo crescem em velocidade maior que outros tipos de processos. O aumento é mais acentuado entre 2016 e 2017, segundo a pesquisa “A realidade do Supremo Criminal”, divulgada no início do ano. Realizado pelo grupo Supremo em Números da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o estudo analisou a atuação da Corte neste tipo de caso desde 1988 e concluiu que, em 2017, 56,5% de todas as decisões colegiadas foram de matérias penal. Na série histórica, foi a primeira vez que mais da metade dos julgamentos colegiados avaliaram matérias penais. Embora não tenham incluído as sessões dos dois últimos anos no levantamento, os pesquisadores notaram uma tendência de alta. 

O estudo da FGV levanta algumas hipóteses para explicar o crescimento da proporção de casos criminais no Supremo. A adoção das sessões virtuais, em que não há debate, restringiu ao plenário as pautas mais importantes. Além disso, nos últimos anos, a operação Lava Jato começou a ser mais presente no Supremo, a partir da análise de casos que envolvem políticos com foro privilegiado. 

Nem todas as ações que chegam ao Supremo, porém, são resolvidas em plenário. Além das sessões virtuais, os ministros podem tomar decisões monocráticas. Analisando-se todo o acervo de 31.476 casos que estão atualmente na Corte, a proporção de assuntos ligados a matérias criminais é menor: são cerca de 18%, ou 5.581 ações, de acordo com dados do próprio STF atualizados ontem. Dentro da classe criminal, 75% dos casos são habeas corpus. 

“No ‘Supremo Criminal’, a tendência é de uma certa privatização de suas atividades”, afirma o estudo da FGV. Como consequência, a Corte fixa poucas teses em matérias criminais. Há dois anos, dos 44 casos escolhidos pelos ministros para, eventualmente, servirem de entendimento para todas as ações daquele tipo, a chamada repercussão geral, apenas três eram de matéria penal.

Outra constatação do estudo da FGV é que quase metade das decisões de matéria criminal no Supremo é justificada com citações à lei (46,8%), sem questionar se a legislação é ou não constitucional. “O Supremo trabalha predominantemente com a legislação ordinária e, neste aspecto, pode-se dizer que atrai para si a competência do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e a duplica”, conclui o estudo. 

Publicidade

Para o professor Cláudio Langroiva, da Pontifícia Universidade Católica (PUC), a Constituição faz com que o STF julgue mais matérias da Justiça comum do que outras cortes superiores no mundo, que se dedicam exclusivamente a questões constitucionais. “O STF acaba perdendo a sua natureza constitucional, passando a ser um tribunal de natureza regular ou ordinária, o que desconfigura a sua principal função, que é de guarda da Constituição.” 

Já o professor Gustavo Badaró, da Universidade de São Paulo (USP), lembra que, mesmo sob vigor de Constituições anteriores, o Supremo nunca foi exclusivamente uma Corte constitucional. Segundo ele, muitos casos chegam ao Supremo porque instâncias inferiores desrespeitam decisões da Corte. Para resolver o problema, seria necessária uma mudança de cultura no Judiciário. “É um problema sistêmico”, disse.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.