O procurador-geral de Justiça de São Paulo, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, avalia que o governador do Estado, Tarcísio de Freitas (Republicanos), foi induzido ao erro ao assinar um decreto que lhe dava poderes inconstitucionais. Ele é taxativo ao afirmar que “o erro foi redacional e não houve má-fé do governador”, e ao dizer que “não há crise” entre as instituições Ministério Público e Poder Executivo estadual.
O texto que criou o Comitê de Assessoramento Estratégico para Políticas de Segurança Pública (Caesp) colocava o Ministério Público como órgão de assessoramento do Executivo e autorizava Tarcísio a convocar o procurador-geral. O governo publicou outro decreto nesta terça-feira, 11, para corrigir a redação.
Em entrevista à Coluna do Estadão, o procurador defendeu a criação do comitê e disse que participará das ações como convidado. “A minha indignação foi com os termos do decreto e jamais com a iniciativa”, ressaltou ao comentar uma troca de mensagens, revelada pela Coluna, em que Paulo Sérgio reclama da “trapalhada” do governo e explica aos pares que participou das discussões para criação do Caesp mas não viu a redação do decreto. “Eu falei com o governador e ele, imediatamente, falou: “puxa vida, não tem o menor sentido esse tipo de questão”.
O procurador lamentou que o mal-estar tenha vindo à tona. “O Ministério Público é um ambiente político intenso, de disputa eleitoral interna e é evidente que um ou outro opositor aproveita uma bola dessa que está lá em cima e corta essa bola. E aí começou toda essa discussão, querendo criar uma crise”, reclamou.

Confira os principais trechos da entrevista:
Qual foi o contexto da mensagem que o senhor enviou sobre o decreto do governador?
Eu queria contextualizar uma coisa. É muito correta a decisão do governador de criar um ambiente onde as pessoas, olhando nos olhos uns dos outros, possam definir demandas e ajudar na construção de uma política pública necessária para nós, que diz respeito à segurança pública. Inclusive, a participação do Ministério Público nesses ambientes de discussão é um dever constitucional. Não há nenhum problema em o Ministério Público participar. No final do ano passado, o governador me convidou pra participar disso, conversamos pessoalmente. A gente estava elaborando a Operação Verão, ele convidou para a gente opinar, e foi um momento muito bom porque ele definitivamente mostrou muito empenho, muita boa vontade de ouvir as outras pessoas. Ele falou: “doutor, estou querendo criar um grupo de discussão com instituições e com a sociedade civil pra gente falar de segurança pública, e quero contar com o senhor”. Eu falei: “o senhor pode contar comigo porque isso também é dever institucional do Ministério Público”.
E depois?
Acontece que isto foi tramitando internamente dentro do governo e eu fui informado de que sairia um decreto que iria materializar esta questão. E aí eu dei um ok. Só que aquilo não tramitou aqui dentro (do MPSP). E sequer o governador, na burocracia de governo, tem acesso aos termos, aos cuidados em relação às atribuições de cada órgão envolvido. E o decreto não observou que no tocante ao Ministério Público, nós temos a nossa independência, nossa autonomia e não ficaria bem se mantivesse o termo “assessoramento”, porque nós não assessoramos, não damos consulta pra órgão público e também a gente não pode ser convocado, porque isso é uma prerrogativa de lei orgânica. A minha indignação foi com os termos do decreto e jamais com a iniciativa.
O senhor concorda a criação do comitê.
Eu jamais manifestei indignação com a ideia, com a proposta. Eu aplaudo a iniciativa e vou estar presente. Não há nada em relação à decisão do governador.
A redação do novo decreto encerra a crise entre o governo do Estado e os procuradores?
(Segunda-feira,10) às 7h53 da manhã, eu mandei um WhatsApp para a pessoa responsável e pedi essa alteração. E hoje (terça-feira, 11) saiu a alteração. Esta alteração coloca o Ministério Público como quem pode, a convite, ser ouvido e poder participar de discussão a respeito de temas específicos quanto a isso. Eu permanentemente encontro o governador, permanentemente ligo para ele, a gente conversa, a gente discute. Não houve crise.
O senhor recebeu reclamações de procuradores sobre o decreto?
Várias pessoas me ligaram e perguntaram o que aconteceu. Eu esclareci o dia inteiro. Falei: “foi um equívoco redacional”. E de fato foi um equívoco. Não houve má-fé. Por isso que eu usei a expressão atrapalhada. É uma burocracia de Estado, normal. Apenas um equívoco de redação que a gente buscou corrigir. Mas algumas pessoas aqui, naturalmente, usam isso politicamente. A nossa política interna é intensa. Mas crise, zero.
Mas o senhor acha que o novo decreto supera completamente a crise - não entre o senhor e o governador, mas entre o corpo do MPSP e o governo?
Claro, supera completamente. Desde as 7h53 de ontem, eu já havia me associado a todas as críticas dos promotores, tanto que no final da mensagem eu disse o seguinte: “a apreensão de vocês foi a minha apreensão. Então, desculpe se esta questão que veio de lá gerou alguma suspeita de que nós estávamos transigindo nas nossas atribuições”. E o governador não criou nenhuma obrigação não constitucional para mim porque houve um equívoco de redação de pessoas que fizeram. Ele não tem a formação jurídica para isso, ele não tem uma formação administrativa para isso. A intenção dele sempre foi desta redação de agora, que é o convite para sociedade civil e para outros órgãos. Eu falei com o governador e ele, imediatamente, falou: “puxa vida, não tem o menor sentido esse tipo de questão”. Houve, sim, algumas críticas internas. O Ministério Público é um ambiente político intenso, de disputa eleitoral interna e é evidente que um ou outro opositor aproveita uma bola dessa que está lá em cima e corta essa bola. E aí começou toda essa discussão, querendo criar uma crise. Essa questão da criminalidade exige que todo mundo supere questões de palanque, questões de ideologia e que a gente sente todos juntos e encontre as melhores soluções.
O governador acabou sendo induzido ao erro ao assinar ao decreto?
Exatamente, eu diria isso. Não houve nenhum problema com o governador. O governador tem um Estado para governar. Ele apresentou uma ideia, o equívoco redacional levou a essa situação. Tanto que imediatamente conversamos e falou “isso vai ser corrigido imediatamente”. Deu a ordem para a correção disso e vida que segue. Eu insisto no seguinte: temos realizado inúmeras ações conjuntas em termos de inteligência nas ações de segurança. As 164 ações que o Ministério Público, através do Gaeco, realizou com a Polícia Militar, com a Polícia Civil, com a Polícia Federal, Receita Federal, não teve um único tiro de borracha e o êxito dessas ações foram extraordinários, como nós vimos semana passada, no presídio da Polícia Civil, nas empresas de ônibus, em vários lugares.