Ao assumir o terceiro mandato de presidente da República, já apelidado de “mandato tríplex”, Luiz Inácio Lula da Silva pretende fazer uma “revolução” na economia e na política. A grande questão, que anima ou desespera, dependendo do freguês, é o tipo de revolução que Lula, tão atingido pela Lava Jato, quer e pode fazer neste momento de tantas turbulências e nenhuma definição de futuro.
Na economia, Lula ficará forçosamente espremido entre duas visões de mundo e duas alternativas opostas de solução para a crise. Em 2002, energizado pela vitória, pelo personagem “paz e amor” e pelo slogan “a esperança venceu o medo”, Lula teve vontade e força política para jogar fora o que o PT sempre pregou para a economia e adotar, sem o menor pudor, a política econômica do antecessor Fernando Henrique Cardoso - que cunhou, cruel e injustamente, de “herança maldita”.
E agora? Lula tem força política para enfrentar as pressões da sua “base”? Ele vai ser o Lula do primeiro mandato, seguir os fundamentos da economia, dar prioridade às contas públicas e focar na recuperação da confiança perdida? Ou vai ceder à pressão dos últimos moicanos que se animam a ir para as ruas defender o projeto do PT, adotando uma política econômica populista e da gastança?
Se sucumbir à opção populista, Lula poderá gerar uma outra revolução no governo: a debandada da equipe econômica, liderada pelo presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, e seguida por presidentes e diretores de bancos públicos e estatais que não aceitam trocar os interesses do País pela conveniência de um partido e de um governo que adernam.
São muitas dúvidas que nascem em Brasília, percorrem o País e transbordam para outros continentes sobre o que ocorre e poderá ocorrer no Brasil, país que já foi o queridinho do mundo e hoje está à beira do terceiro ano seguido de recessão, com milhões de desempregados e milhões de insatisfeitos nas ruas.
Nessa barafunda, há dois outros fatores decisivos. Esta quarta-feira, 16 de março de 2016, não marca apenas a volta de Lula ao poder, mas também a definição, no Supremo Tribunal Federal, sobre o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados. Isso cria uma corrida desenfreada, em sentido contrário. Todos os lados têm pressa.
De um, Lula vai ter que usar tudo o que lhe resta de carisma, de verve e de força política para amarrar o PMDB a qualquer custo, gerar algum ânimo na economia e disseminar a percepção de que “agora, vai!”. Do outro, a oposição não terá alternativa se não tapar o nariz e agarrar-se ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha, para tocar o impeachment com a maior rapidez possível. Nessa corrida, a aritmética continua sendo favorável a Lula e Dilma: bastam 171 dos 513 deputados para inviabilizar o impeachment.
No meio da confusão, as duas equipes e nós, da arquibancada, só não podemos esquecer que nada muda na Lava Jato. Lula pode fazer o que bem entender e a oposição pode acelerar o impeachment, mas as investigações do Ministério Público, da Polícia Federal, da Receita e da Justiça continuam. Já foram longe demais, não têm volta e vão continuar avançando. O que é uma péssima lembrança para Lula, que reúne duas condições muito complicadas para se explicar dentro e fora do país: é, simultaneamente, o presidente de fato e a estrela da Lava Jato.
E Michel Temer? Entre as muitas piadas que se multiplicam nessas horas, a mais primorosa é que Lula atropelou o vice. Se a oposição era acusada de querer um “golpe” para empossar Temer, Lula foi mais rápido, articulou a renúncia branca de Dilma e deu um golpe a seu favor. Antes, Temer tinha de enfrentar Dilma. Agora, vai ter de passar por cima de Lula. Convenhamos, é bem mais difícil.
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