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Opinião | STF dribla Lula e fortalece pacote da Segurança; Congresso dribla Bolsonaro e enfraquece anistia

Projeto que livra envolvidos nos atos de 8 de Janeiro não é a pauta da sociedade, do governo, do País

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Foto do author Eliane Cantanhêde

Enquanto Donald Trump desmorona o sistema internacional de comércio e implode os princípios e interesses mais basilares dos Estados Unidos, aqui no Brasil o Supremo mais uma vez preenche lacunas dos dois outros poderes e o Congresso confirma que, apesar de todos os gritantes pesares, não ultrapassa limites em questões cruciais. Nos dois casos, por decisões solidamente debatidas.

Ao aprovar a chamada “APDF das favelas”, o STF modulou o voto do relator Edson Fachin e fez o que o seu ex-presidente Ricardo Lewandowski, agora ministro da Justiça, tenta e é barrado tanto por governadores de oposição quanto pelo presidente Lula e seus “personal influencers”: atribuiu à Polícia Federal investigações de crimes de repercussão interestadual e internacional cometidos no Rio.

Plenário do STF aprovou voto modulado sobre ação de polícias nas favelas Foto: Antonio Augusto/STF

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Fachin teve o mérito de puxar para o Supremo, criar obstáculos e dar um basta aos abusos de policiais do Rio em operações nas comunidades, onde pretos e pobres são duplamente vítimas, do crime organizado e das próprias polícias. Seus colegas de toga, porém, concordaram com o “outro lado” de que Fachin pesou a mão e, em nome dos sempre fundamentais direitos humanos e individuais, tirou instrumentos e poderes indispensáveis para a ação das forças de segurança.

Assim, houve uma espécie de intervenção no voto de Fachin, para prever, por exemplo, uso de helicópteros, necessários em grandes operações; fim das restrições em perímetros de escolas, hospitais e creches, que poderiam se tornar bunkers de criminosos; limites para comunicação prévia de operações a agentes da comunidade, que, por óbvio, serve como porta escancarada de vazamentos para a bandidagem.

A entrada em ação da PF, porém, tem uma relevância particular e joga luzes sobre o pacote de segurança de Lewandowski, que, aliás, já vinha sendo desenhado e construído pelo seu antecessor Flávio Dino. Lewandowski saiu do STF e foi para a Justiça, Dino fez o caminho contrário, mas ambos lideram a cruzada para um arcabouço jurídico que permita a entrada das forças federais, à frente PF e PRF, no combate ao crime organizado – que, hoje, não é mais estadual, é nacional e transnacional.

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Governadores de oposição atacam o pacote, alegando falsamente que caracteriza “ingerência política do governo federal nos Estados”, e o próprio Lula é orientado a “não atrair para si” o maior problema do País neste momento, mesmo com a ameaça Trump: a violência e a infiltração do crime nas instituições. Erro grave dos dois lados, porque os governadores estão perdendo a guerra e Lula, queira ou não, é cobrado pela calamidade.

Samira Bueno, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, foi precisa em entrevista à Rádio Eldorado: “O problema afeta a população inteira e o governo federal precisa fazer a sua parte. É um erro de figuras do governo que se opõem a que Lula sinalize uma priorização para essa agenda. Não é uma questão se o Lula vai abraçar ou não esse tema porque isso vai virar um problema para ele; já virou um problema. Para a população, não importa se é atribuição do presidente, do governador ou do prefeito. A questão é saber se o Lula vai ser essa pessoa que diz que resolve ou não.”

Já o Congresso, a instituição mais mal avaliada nas pesquisas, deu dois exemplos de boa política na mesma semana: aprovou rapidamente e por unanimidade o projeto da Reciprocidade, para dar instrumentos ao governo para negociar com os EUA, e empurrou com a barriga o projeto de anistia para os criminosos de 8/1 e, previamente, para Jair Bolsonaro.

Os líderes não assinaram, a assinatura dos vice-líderes não vale, o apoio individual de deputados não foi suficiente para aprovar a urgência. Fica para depois, sabe-se lá quando. Não é a pauta da sociedade, nem do governo, nem do País. Ponto para Hugo Motta no seu primeiro desafio na presidência da Câmara.

Opinião por Eliane Cantanhêde

Comentarista da Rádio Eldorado, Rádio Jornal (PE) e da GloboNews

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