As pesquisas de intenção de voto têm demonstrado, até o momento, uma grande estabilidade na corrida eleitoral para presidente. O agregador de pesquisas do Estadão, que recalcula diariamente dados provenientes de 14 institutos de pesquisa e produz uma linha de tendência de cada um dos candidatos, sinaliza que o ex-presidente Lula tem mantido uma dianteira relativamente confortável.
Isso não quer dizer que o jogo eleitoral já esteja definido. Mas, inequivocamente, o jogo tem favorito. Surpresas eleitorais, entretanto, não são raras em democracias. Faltam 60 dias para o primeiro turno das eleições e a campanha eleitoral propriamente dita ainda não começou. Incerteza sobre quem de fato será o vencedor é, inclusive, um dos elementos chave que qualifica um país como democrático.
Como o risco do golpe finalmente perdeu sentido até mesmo para Lula, o que esperar de um terceiro governo do ex-presidente caso ele de fato venha a ser o vencedor?
Há, pelo mesmo, dois cenários possíveis.
Uma possibilidade é que seu governo estaria muito mais constrangido pela sociedade e pelas organizações de controle. Livre das ameaças de Bolsonaro contra as instituições democráticas, a luta contra a corrupção voltaria a ser prioridade.
Lula tem o contencioso de duas condenações por corrupção e lavagem de dinheiro nas costas que, mesmo anuladas por questões procedimentais, sempre vão rondar a sua vida trazendo uma lupa a potenciais novos desvios. Qualquer deslize, por menor que seja, traria a ira imediata da sociedade contra ele. Uma espécie de “espada flamejante” pronta para cair sob sua cabeça. As chances de comportamento desviante, portanto, tenderiam a diminuir.
Por outro lado, é possível que um eventual novo governo Lula venha a entregar uma série de políticas públicas que parcela importante do eleitorado valoriza e que considera negligenciada pelo governo Bolsonaro, como a defesa do meio-ambiente e proteção da Amazônia, controle de armas, políticas educacionais e de saúde mais inclusivas etc.
Quando as pessoas começarem a ver preenchidas suas demandas por tais políticas, tenderiam a ficar ainda mais tolerantes à corrupção. O risco é que eleitores venham a contrair uma espécie de covid longa, com a perda de olfato quase que permanente, e não mais percebam o mau cheiro dos potenciais novos escândalos de corrupção que um terceiro governo Lula venha a implementar.
Essas duas hipóteses são concorrentes. Caberá a Lula decidir como irá governar se for eleito. Se vai aproveitar mais uma janela de oportunidade e jogar para a “história” ou se irá sucumbir a tentação de reproduzir os erros do passado e ter seu legado irreversivelmente comprometido.