
A aprovação de Lula despencou para 24%, a pior marca de seus mandatos, e, para o cientista político Renato Dorgan, CEO do Instituto Travessia, o motivo é claro: a frustração dos eleitores com o alto custo de vida.
Segundo ele, a recuperação do governo parece improvável, e o desgaste do petista abre caminho para uma candidatura de centro ou centro-direita ganhar musculatura para 2026.
Veja os principais pontos da entrevista:
O que explica a aprovação de Lula cair para 24%, a pior marca de todos os seus mandatos, segundo pesquisa Datafolha?
A principal explicação é o aumento do custo de vida e a frustração dos eleitores. Em 2023, houve uma queda real nos preços dos alimentos, produtos de supermercado, energia e gasolina, o que gerou a expectativa de uma melhora. No entanto, em 2024, por volta do meio do ano, os preços voltaram a subir, atingindo patamares semelhantes aos de 2021 e 2022.
Lula venceu a eleição com um discurso centrado na melhoria do custo de vida, e essa promessa não está sendo cumprida. Além disso, a polêmica em torno da taxação do Pix impactou negativamente a percepção do governo. Mesmo com as explicações de que se tratava de uma fake news, ficou a sensação de que o governo aumentaria a taxação de forma indireta, fiscalizando o cidadão comum. O momento é muito ruim, e o mote da campanha de 2022 não está sendo entregue. Existe uma frustração significativa.

Por que a maior queda ocorreu entre seus próprios eleitores? Isso indica uma insatisfação momentânea ou uma ruptura mais profunda na base?
Assusta a queda na aprovação de Lula no Nordeste, que é real e vertiginosa, especialmente entre os eleitores de classe C2D, que garantiram a eleição dele. Bolsonaro conseguiu equilibrar muito a disputa em outras regiões, mas foi esse eleitorado que garantiu a eleição de Lula.
Sempre alertamos que quem venceu a eleição de 2022 não foi o PT, mas sim uma esperança na volta de dias melhores, principalmente relacionada ao custo de vida, e uma rejeição a Bolsonaro. O PT governou esses dois primeiros anos como se fosse adorado pelo povo e como se tivesse recebido um cheque em branco do eleitor para executar um governo com a sua cara, mas isso não era verdade. O fracasso do PT nas urnas nas eleições municipais já indicou isso.
Lula culpa a comunicação pela queda na popularidade. O governo tem errado na forma de comunicar suas políticas?
A comunicação do governo nesses dois anos foi antiquada e desconectada do eleitor comum. A linguagem utilizada não é moderna, de redes sociais, e ainda carrega um viés ideológico. O povo não queria isso; esperava um governo mais próximo das pessoas mais pobres, mais assistencial e focado na melhoria da qualidade de vida.
No entanto, o que se viu foram debates sobre pautas ideológicas, como a chamada “agenda woke”, além de embates diretos com algumas posições da direita. Isso frustrou o eleitor. Chegamos à metade do governo, e o eleitor está frustrado e vendo que a expectativa de melhoria do custo de vida não vai acontecer.
Há tempo hábil para reverter esse cenário? O que precisa ser feito?
O tempo é muito curto, e não será fácil reverter esse cenário. A mudança do custo de vida é muito séria. Há bastante emprego pelo País, só que um emprego que remunera muito mal. A folha salarial é pesada, cheia de impostos. O grande problema não é a falta de empregos, mas sim o salário baixo versus o custo de vida alto. Eu acho muito difícil a reversão desse cenário, a menos que o Brasil receba uma injeção de capital surpreendente neste ano. Fala-se de um novo “pré-sal”, mas são tentativas desesperadas.
Como a queda na aprovação de Lula pode influenciar o cenário para 2026?
A queda na popularidade pode influenciar totalmente a eleição de 2026, não tenha dúvida. A possibilidade de uma candidatura mais ao centro, ou centro-direita, é muito grande. As eleições municipais de 2024 já mostraram a frustração do eleitor com a esquerda, e seria, neste século, a quinta chance que a esquerda teve. Dificilmente veremos um sucesso da esquerda em eleições majoritárias por um tempo.
Mas, sim, pode influenciar totalmente o cenário de 2026. A vontade de votar em Lula talvez fique muito reduzida ao eleitor ideologicamente de esquerda, e não foi esse eleitor que garantiu sua vitória em 2022. Lula foi eleito, principalmente, pela rejeição à extrema direita, aos erros do governo Bolsonaro – especialmente na pandemia – e ao alto custo de vida.
O eleitor, mesmo sem formular isso claramente, busca um governo que ofereça serviços públicos melhores, uma carga tributária menor e um custo de vida mais acessível. Não acredito que a extrema direita tenha chances em 2026 para uma eleição presidencial majoritária. Ela pode até ter votos e alguma relevância eleitoral, mas não é isso que o eleitor busca. O eleitor procura uma solução pragmática para melhorar sua vida, o que passa pelo desenvolvimento econômico do país, melhor qualidade de vida, renda mais justa e uma moeda mais valorizada.