A Receita Federal aposta as fichas na permissão de usar os dados da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) para encurtar o caminho da fiscalização na busca dos sonegadores. O resultado do cruzamento de dados da CPMF com as declarações do Imposto de Renda (IR) de 1998 desencadeou cerca de 2 mil dossiês para fiscalização de pessoas físicas e jurídicas que apresentaram grandes distorções entre a renda declarada e a movimentação financeira. As investigações foram pedidas pelos ministérios públicos (MPs) de 16 Estados. Pela via judicial, os procuradores pediram ao Fisco todos os dados, como o Cadastro da Pessoa Física (CPF) e o nome dos contribuintes dos Estados, que se declararam isentos (com renda anual de até R$ 10.800,00), mas que movimentaram milhões nas contas bancárias durante 1998. "A possibilidade de usar os dados da CPMF nas investigações encurta o caminho da fiscalização, pois aponta com mais facilidade os desvios de comportamento tributário de vários setores", disse um técnico do órgão. Os integrantes do Fisco acreditam que, com o uso das informações da CPMF, que são fornecidos trimestralmente à Receita Federal pelas instituições financeiras, também será possível reduzir substancialmente o número de ações fiscais que não resultam em autuação. Em 2000, por exemplo, aproximadamente 10% das 26 mil fiscalizações foram frustradas porque os indícios de sonegação não se confirmaram. Com isso, há grandes possibilidades de aumentar a quantidade de créditos tributários que, em 2000, chegou a R$ 30 5 bilhões. A lei que permite à Receita usar as informações da CPMF nas investigações foi sancionada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso no início de janeiro. Agora, a estratégia do Fisco é concentrar os esforços no cruzamentos desses dados com os de variações de patrimônio e de renda tanto de pessoas físicas como jurídicas. De acordo com técnico do órgão, um programa de informática mais completo, que inclui a CPMF, está funcionando em fase experimental e poderá fazer análises mais aprofundadas de todos os dados coletados pelo Fisco. Um dos focos da fiscalização com o novo sistema será descobrir empresas "laranjas" que sejam constituídas apenas para a lavagem de dinheiro. Casos como o de empresas que se qualificam como integrantes do Simples (o sistema simplificado de recolhimento de tributos para empresas que faturam até R$ 1,2 milhão ao ano), mas têm uma movimentação financeira expressivamente alta, podem indicar esse tipo de irregularidade. Será possível também verificar se o valor de um patrimônio vendido e indicado pelo contribuinte na declaração do IR é compatível com o depósito feito na conta bancária na época da venda. Caso haja distorções significativas, não está descartada a possibilidade de o Fisco pedir ao Banco Central (BC) ou às instituições financeiras as informações das contas bancárias do contribuinte fiscalizado. O novo sistema ainda permitirá que mais de 1 milhão de profissionais liberais sejam monitorados com maior rigor. O Fisco quer descobrir os contribuintes, como médicos, advogados e dentistas, que sonegam rendimentos para pagar menos impostos. De acordo com estudo elaborado pelo órgão, do total de 11,066 milhões de contribuintes que entregaram a declaração de IR em 1999, 9,4% eram profissionais liberais. É nessa fatia de declarantes que a Receita quer concentrar os esforços de fiscalização porque estima que exista um alto índice de sonegação. A fiscalização será feita apenas para contribuintes que fazem as declarações de IR completas e, portanto, deduzem gastos com despesas médicas e educação dos rendimentos anuais para pagar menos impostos ou ainda receber restituições. Os contribuintes que optam pela declaração de IR simplificada contam com a possibilidade de uma dedução automática de até R$ 8 mil e não precisam descrever os gastos no ajuste anual. A escolha de um contribuinte que será fiscalizado não é feita de forma aleatória. É o próprio programa eletrônico da Receita Federal que, ao cruzar os dados, seleciona as pessoas físicas e jurídicas que apresentam os maiores indícios de irregularidade tributária. O sistema também cria um dossiê que será entregue ao fiscal junto com o Mandado de Procedimento Fiscal, documento obrigatório para o início de uma fiscalização. O sistema faz o cruzamento de todas as informações que constam das declarações de IR e de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), além de operações imobiliárias, e de dados enviados pelos Departamentos de Trânsito, Capitania dos Portos, nos quais constam os proprietários de embarcações, Departamento de Aviação Civil (DAC), que informa quem comprou aviões, e instituições financeiras sobre o recolhimento da CPMF. Além disso, o Fisco tem convênios com os governos estaduais para poder ter acesso às informações sobre o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). É com todas as informações que chegam à base de dados que o Fisco consegue saber se a variação patrimonial do contribuinte é condizente com a renda declarada.