Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Saúde mental é primordial na luta contra exclusão social nas universidades

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Por Redação
 Foto: arquivo pessoal.

Leon Victor de Queiroz Barbosa, Advogado, Cientista Político, Professor da UFPE e Diretor de Ensino de Graduação da ABCP

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As políticas de cotas buscaram incluir e democratizar o acesso à educação superior, gratuita e de qualidade para uma parcela da população que jamais conseguiria vencer a competição aberta. Entretanto, a forma como essa política pública foi implementada continua a gerar desigualdades. Os estudantes cotistas, que não tem infraestrutura de estudos adequada em casa, continuam a sofrer essa estrutura na universidade. E, ao ver ficarem para trás, adoecem. É um sonho que se transforma em pesadelo, pois ao adoecerem não tem condições de arcar com os custos de tratamento psiquiátrico, psicológico e farmacológico.

Tenho acompanhado a discussão levantada por meu colega de UFPE, Prof. Érico Andrade Marques de Oliveira (Filósofo, Psicanalista e Presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia), sobre a distribuição de recursos na pós-graduação. Em artigo publicado em 16 de abril (Folha de S. Paulo), ele questiona como pessoas com dificuldades psíquicas ou com algum grau de deficiência cognitiva deveriam receber mais recursos públicos para a sua vida acadêmica. Érico utiliza esse exemplo para discutir a reprodução de desigualdades sociais dentro do sistema nacional de pós-graduação. Ele indaga o nome aperfeiçoamento, presente na sigla da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), agência federal vinculada ao Ministério da Educação (MEC) que coordena a política e recursos de programas de pós no Brasil. 

Se é para aperfeiçoar, como focar a distribuição de recursos apenas com base na excelência acadêmica, sem considerar as pessoas com algum tipo de vulnerabilidade? Segundo Érico "[... a ideia é que a agência fomente uma qualificação das pessoas." Em artigo no mesmo jornal em 20 de abril, oito professores escreveram o texto intitulado "Excelência e inclusão social andam juntas", onde defendem que a excelência acadêmica não exclui a inclusão e que "atacar a busca de excelência é sabotar um dos pilares do desenvolvimento social e econômico contemporâneos [...]". 

Acredito que Érico não propôs abandonar a excelência, mas também não deixou claro o porquê de a excelência ter sido tratada de forma tangencial. Em artigo publicado no dia 7 de maio, no mesmo meio de comunicação, Érico argumenta que questionar a excelência é importante para ampliar seu escopo e discutir sua natureza. Para ele, "[...] a qualidade de nossas produções deve balizar a política pública. Isso é inegociável". Continua ao afirmar que a excelência como principal critério na distribuição de recursos públicos se relaciona com o fato de que a busca por esse conceito (não explicado) de excelência pode ser adoecedora e excludente. 

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É preciso se falar em problemas regionais. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) por si só não é o melhor indicador por ser uma média. O Recife, por exemplo, tem regiões com IDH igual ao da Dinamarca e outros próximos ao da Líbia. A média disso gera distorções quanto à distribuição de recursos que não controlem o IDH por indicadores de desigualdade, como o coeficiente de GINI, por exemplo. Para além da questão de saúde mental (já falo sobre) tem o problema da infraestrutura física e o calor. Estudo de autoria de Park, Goodman, Hurwitz e Smith publicado no American Economic Journal: Economic Policy em 2020[1] demonstra que o calor inibe a aprendizagem. Regiões mais quentes do país sofrem com falta de infraestrutura quando um aparelho de ar-condicionado é visto como luxo e não como necessidade de primeira ordem, como água, como fica evidenciado nesse estudo de Renato Hayashi[2], egresso do Mestrado Profissional em Políticas Públicas (UFPE). 

As universidades públicas sofrem há décadas com uma deficiência estrutural gritante com problemas de aparelhos de ar-condicionado, falta de controle de animais, falta de insumos básicos para laboratórios, escassez de material elementar de secretaria e até comida inadequada nos restaurantes universitários, etc. Para além desses problemas de estrutura física e precária, essa infraestrutura débil impacta fortemente na competição entre instituições e na saúde mental da graduação. O debate da pós é de suma importância, mas se não tratarmos do problema da saúde mental na graduação, ficaremos apenas nos paliativos na pós.

Como coordenador de um curso de graduação, observo as crises de ansiedade, as dificuldades de se manter e de terminar o curso justamente pela infraestrutura precária que de alguma forma gera grandes frustrações que são somadas às questões familiares, financeiras e às violências simbólicas às quais as pessoas menos favorecidas economicamente estão submetidas no cotidiano. Cuidar da saúde mental é primordial, são talentos e grandes mentes que se perdem na falta de empatia do próximo, na falta de compreensão e na falta de ajuda da estrutura universitária. Fortalecer os órgãos de atendimento à saúde, disponibilizar mais psiquiatras e fortalecer as clínicas psicológicas devem fazer parte, de forma urgente, da implementação das políticas de cotas, caso contrário, estaremos sim a reproduzir desigualdades e condenar talentos ao adoecimento mental. 

Notas

[1] Artigo de Park, Goodman, Hurwitz e Smith (2020) disponível em: https://rjisungpark.com/wp-content/uploads/2020/10/park_et_al_2020aejep_heat_and_learning.pdf

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[2] Dissertação de Renato Hayashi disponível em: https://repositorio.ufpe.br/bitstream/123456789/35521/1/DISSERTA%C3%87%C3%83O%20Renato%20Hayashi%20Correia%20de%20Oliveira.pdf

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