Marco Antonio R. Nahum, Advogado, ex-presidente do IBCCrim, ex-desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, consultor de Rubens Naves Santos Jr Advogados
Semana passada foi firmado um "Termo de Cooperação sobre Acordos de Leniência", celebrado entre o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), com a Advocacia-Geral da União (AGU), a Controladoria-Geral da União (CGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU).
O Termo de Cooperação prevê que, constatado o envolvimento de uma empresa em fatos ilícitos pelo Ministério Público ou pela Polícia, as provas devem ser enviadas para conhecimento da CGU e da AGU, salvo quando o compartilhamento possa colocar as investigações em risco.
Não há definição do que possa definir a expressão "colocar em risco as investigações".
O objetivo da proposta é criar um "balcão único" para que empresas acusadas de cometer ilícitos façam um acordo só, com a participação de todos os órgãos, e não precisem fazer diversas negociações separadamente, como ocorre hoje.
Portanto, a princípio, a medida visa a trazer maior segurança jurídica para os acordos de leniência. Porém, não está prevista a participação do Ministério Público nesse "balcão único".
A 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal recomendou ao procurador-geral da República que não assine o termo de cooperação sobre acordos de leniência. Entre vários argumentos, alega: "O Acordo de Cooperação Técnica separa injustificadamente o processo de celebração do Acordo de Leniência com pessoas jurídicas, da Lei nº 12.846/2013, como instrumento de obtenção de provas de corrupção, daqueles procedimentos consensuais próprios à esfera criminal, como é a colaboração premiada, da Lei nº 12.850/2013. Com isto, retira a potencialidade jurídica do acordo de instrumento com a função de alavancagem probatória, ensejando uma inaceitável submissão de investigações criminais de atos de corrupção a acordos que estão reservados a CGU-AGU, sob controle externo do TCU". Realmente, a medida, sem a participação do Ministério Público, não resolve a insegurança jurídica que já havia antes.
E não havia segurança jurídica em razão da multiplicidade de órgãos titulares, assim como pela ausência de uma regulamentação dos critérios e limites para a atuação de cada um deles, o que gerava, inclusive, uma verdadeira confusão jurídica de atribuições.
Agora, o "balcão único" permite metodologia e parâmetros únicos. Além disso, há uma distinção entre empresas e empresários no que tange à responsabilidade das ações. Porém, se a intenção é unificar a decisão do acordo, não se justifica a ausência da participação do Ministério Público Federal nas negociações, tendo em vista o 'interesse direto e legítimo' da instituição, inclusive na colheita de provas.
Pior, insiste-se, é que a ausência do MPF na assinatura da proposta, mantém a insegurança jurídica para aquele que faz o acordo. Os procuradores possuem a independência necessária para não seguirem as diretrizes definidas no acordo firmado no "balcão único", e poderão continuar acionando judicialmente essas empresas e os empresários.
Em resumo, os acordos de leniência, previstos na Lei Anticorrupção de 2013, formalizam a admissão de crimes por parte de empresas e seu compromisso de prestar informações, com a contrapartida da atenuação das sanções administrativas e civis, nos termos do acordo firmado no "balcão único". Mas, e as sanções penais? Sem a participação do Ministério Público, o impasse da legislação anterior continua, já que problema dos acordos de leniência reside na resistência ao pactuado pelos diversos órgãos. Às vezes, até mesmo no âmbito da instituição que o celebrou. E isso o "balcão único" não resolve e agrava, ao excluir o Ministério Público.
Além disso, o governo pode ter interesses políticos em brecar uma negociação. O 'balcão único' formado apenas por AGU, CGU e Ministério da Justiça, seria extremamente suspeito nesta hipótese.