RIO - O senador Marcelo Crivella, candidato à prefeitura do Rio de Janeiro pelo PRB, já foi fichado na polícia. Ele foi levado à 9ª Delegacia de Polícia, em 18 de janeiro de 1990, acusado de invasão de domicílio. Então pastor da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), da qual hoje é bispo licenciado, Crivella teria tentado expulsar um morador de terreno da Iurd.
O caso foi revelado pela revista Veja, que obteve as fotos de Crivella feitas pela polícia. O inquérito, no entanto, não foi à frente e nem está nos arquivos da Polícia Civil: os registros foram entregues pelo próprio delegado para Crivella.
Em um vídeo divulgado por sua campanha, Crivella nega que tenha sido preso e fichado. Veja abaixo:
"Eu repito: nunca fui preso. Nunca respondi a nenhum processo. E posso provar com todas as certidões que apresentei no momento em que me inscrevi para ser candidato a prefeito do Rio de Janeiro. Fiquem tranquilos. Eu sou ficha limpa."
Ele não explica, na gravação, por que o inquérito não foi arquivado pela Polícia Civil, como deve ocorrer após o encerramento de investigação.
O próprio Crivella cedeu à Veja cópia do inquérito, ao ser procurado por repórteres que haviam recebido as fotos feitas pela polícia. Referiu-se ao registro policial como um "espinho na minha carne".
Caso. De acordo com o inquérito, a Universal havia comprado imóveis no bairro de Laranjeiras, na zona sul.
Nilton Linhares, de 29 anos, ficou morando em um dos terrenos como vigia, em casebre construído com material fornecido pela igreja. Quando a Iurd tentou retomar o imóvel, Linhares reivindicou o direito de posse e recusou-se a sair.
À Veja, Crivella contou ter ficado "revoltado" e seguiu para o terreno com "uns dez homens". "Peguei os caminhões que a gente tinha e fui para lá. Arrebentei aquela cerca. Comecei a tirar as coisas dos caras e botei em cima do caminhão. Mas não toquei nas pessoas."
No inquérito, Linhares diz que Crivella chegou com seguranças armados de revólveres, arrombou o portão com o pé de cabra e ameaçou a mulher e as duas filhas de Linhares.
A polícia foi chamada e o grupo foi levado à delegacia. O então pastor passou o dia na 9ª DP, foi liberado à noite, com a condição de retornar no dia seguinte, onde passou mais quatro horas detido. Em representação contra o delegado por suposto abuso de poder, a advogada da Universal, Maria do Socorro Costa, reclama que Crivella foi mantido em uma sala "fechada e sem ar condicionado por mais de quatro horas, onde foi humilhado, tachado de 'pastor ladrão' e fotografado".
À revista, Crivella diz que o delegado João Kepler Fontenelle, já morto, entregou-lhe o inquérito, incluindo os negativos das fotos, porque foi ameaçado de processo pela igreja.
"Fiz isso para te constranger, mas estou arrependido", teria dito o delegado, segundo Crivella. A Polícia Civil não esclareceu por que o inquérito não está nos seus arquivos. Em nota, informou que a Delegacia de Acervo Cartorário está fazendo pesquisa "para apurar as informações veiculadas pela imprensa sobre um procedimento instaurado em 1990, envolvendo um candidato a prefeito".
Neste sábado, o candidato não deu entrevista nem teve agenda pública. A campanha preferiu divulgar vídeo do senador.
"Vocês devem estar se perguntando sobre a capa da revista Veja. Nunca fui preso. O que ocorreu é que há 26 anos atrás, como engenheiro, eu fui chamado para fazer inspeção em um muro que caiu e tinha risco de machucar as pessoas. O terreno era da Igreja Universal, mas estava invadido. E os invasores não deixaram eu entrar. Deu uma confusão danada. Foi todo mundo para a delegacia. Lá, o delegado resolveu identificar a todos. Por isso, essa foto que você viu na capa", afirmou. "Mas não deu processo, nada. Pelo contrário. Eu é que iniciei processo contra ele por abuso de autoridade."
A assessoria de Crivella também divulgou nota sobre as fotos. "A explicação é bem menos emocionante do que muitos esperam. Na ocasião, Crivella, como engenheiro, tentou entrar em um terreno da Igreja Universal que tinha sido invadido em Laranjeiras. Na confusão, acabou sendo levado para a delegacia, onde o delegado mandou fazer as fotos para identificá-lo. A única investigação aberta foi para investigar o abuso de poder do delegado", disse o texto.
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