Imagens de mulheres dançando e se divertindo tomaram de assalto as redes sociais ao longo desta semana. O movimento é um desagravo à primeira-ministra finlandesa, Sanna Marin, duramente – e injustamente – criticada por vídeos em que aparece com amigas numa festa privada. A hashtag associada às imagens é #solidaritywithsanna.
“É claro que a reação seria diferente se Sanna fosse um homem”, diz a escritora Inês Pedrosa, entrevistada no minipodcast da semana. “O popularíssimo presidente de Portugal em toda parte dança, e ninguém o põe em causa por isso.” Inês Pedrosa é uma das escritoras portuguesas mais lidas no Brasil – autora, entre outros, de Fazes-me Falta, estrondoso sucesso de público e crítica, Dentro de Ti Ver o Mar e O Processo Violeta.
Vale para a Finlândia, vale para o Brasil – que neste ano terá um recorde de mulheres concorrendo a cargos eletivos. No campo da esquerda, a deputada Tabata Amaral sofreu ameaças de agressão por parte do ator José de Abreu, apoiador do PT. À direita, a senadora Simone Tebet foi alvo do machismo condescendente de seu colega Tasso Jereissati, no dia em que se lançou candidata à Presidência pelo MDB. São apenas os casos mais recentes entre inúmeros.
Inês Pedrosa dirige a editora feminista Sibila. Entre as autoras publicadas por ela está a ativista Joumana Haddad, que recentemente concorreu a uma cadeira no Parlamento libanês – e denunciou o machismo no ensaio Eu Matei Sherazade. “No caso das mulheres, é comum que sejam criticadas pela postura e o que fazem com o próprio corpo, não por suas decisões políticas”, diz Inês Pedrosa.
Até o episódio da festa, Sanna Marin era elogiada por sua habilidade em manejar uma coalizão de quatro partidos, pela gestão exemplar da pandemia e pelos avanços na agenda ambiental. Para Inês Pedrosa, as críticas que a primeira-ministra da Finlândia recebeu podem ter relação com o pedido de entrada do país na Otan – que gerou agitação na esquerda europeia, em que uma minoria barulhenta apoia Putin.
Sanna Marin foi acusada de não possuir postura de chefe de Estado. É uma crítica descabida, pois as imagens vazadas eram de eventos privados – quando há tantos chefes de Estado que envergonham seus países em público, um dia sim e outro também. Sanna Marin fez um teste para mostrar que não estava sob efeito de drogas e pediu desculpas pelo que aconteceu.
Se há uma crítica que cabe no caso dela, é apenas esta: assim como os milhares de mulheres que postaram suas imagens sob a hashtag #solidaritywithsanna, a primeira-ministra finlandesa não tem motivo algum para pedir desculpas.
Para saber mais
Mini-podcast com Inês Pedrosa
Reportagem do Estadão sobre Sanna Marin
Reportagem do The Washington Post sobre o movimento #solidaritywithsanna