Homenageado pelo setor de biodiesel, nesta quinta-feira, 2, em São Paulo, no primeiro dia do julgamento do mensalão em Brasília, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu o legado do seu governo ao País e disse que o Brasil não é "pequeno". Em seu discurso, no auditório de um hotel da Vila Mariana, zona sul da capital, fez ataques indiretos a adversários políticos e criticou a imprensa. "Aqueles que achavam que o Brasil era pequeno, não sabia fazer coisas, era cachorro vira-lata, perderam. Esse País chegou a um patamar que ele nunca tinha vivido", afirmou a uma plateia de empresários, dirigentes de cooperativas e políticos, na maioria ligados ao PT.
O presidente compareceu à homenagem, organizada pela União Brasileira de Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabrio) e Associação dos Produtores de Biodiesel do Brasil (Aprobio), com as feições marcadas pelo tratamento de um câncer na laringe, que o deixou com uma pronunciada papada no pescoço. Na chegada, esquivou-se dos jornalistas e das perguntas sobre o julgamento em Brasília. Os repórteres foram mantidos à distância por um cordão de isolamento. Na saída, não teve como evitar a abordagem e, perguntado se iria assistir ao julgamento, disse que não. "Tenho mais coisa para fazer do que isso. Quem tem de assistir são os advogados." Quando um repórter quis saber por que não assistiria, retrucou: "Porque estou trabalhando, meu filho!"
Apesar de aparência fatigada e da voz ainda rouca, Lula exibiu bom humor e falou durante meia hora. Acabou fazendo coro aos antecessores que, durante uma hora e meia, se revezaram ao microfone elogiando seu governo. "Esse País é grande, é de respeito e está tão bom que vamos ganhar a Olimpíada no futebol", predisse. Depois de criticar a imprensa, que teria considerado eleitoreiros programas como o bolsa-família e o Luz para Todos, disse que havia criado "uma Argentina" de novos consumidores. "40 milhões elevaram de classe social, esse é o milagre desse País", afirmou. Lula brincou com a própria doença, dizendo que tinha mais "papo" do que quando era presidente e, caso remédios e drenagem não resolvessem, iria ceder a papada para fazer biodiesel.
Ele disse ter se preocupado em não passar uma imagem de pessoa doente, por isso vestira terno e gravata. Respondendo a um empresário que havia sugerido sua volta ao Palácio do Planalto, ele disse que, apesar de ter gente que achava que, com o câncer, ele ia parar, estava "inteiraço" para ajudar a Dilma a ser eleita mais uma vez. Sugerindo sua proximidade com a presidente, Lula revelou ter falado com ela por telefone, na quarta-feira, 1, e reclamou de a ligação ter caído três vezes. O ex-presidente destacou a posição que o Brasil ocupa no cenário internacional, com a Europa em crise e os Estados Unidos num clima de incerteza. "Nós não temos incerteza", afirmou. "A matriz energética criada pelo novo combustível é um degrau para que a gente continue a se desenvolver."
Desagravo. O evento em homenagem ao ex-presidente, que reuniu ex-ministros, como Miguel Jorge (Indústria e Comércio ), e Miguel Rosseto (Desenvolvimento Agrário), políticos como o governador de Sergipe, Marcelo Déda (PT) e o ex-governador do Mato Grosso e atual senador e Blairo Maggi (PR), os presidentes nacional e paulista do PT, respectivamente Rui Falcão e Edinho Silva, além de deputados, acabou tendo um tom de desagravo em razão da coincidência com o início do julgamento do principal escândalo político do governo Lula. "O senhor liderou um novo país", disse Rossetto, em seu discurso, acrescentando: "É o melhor Brasil da história desse país." Juan Diego Ferrés, conselheiro da Ubrabrio, sugeriu trocar o slogan "nunca antes na história desse país" para "nunca antes na história do mundo".
Um político de expressão nacional e amigo pessoal de Lula revelou ao Estado que o ex-presidente está muito preocupado com o papel da imprensa no processo dos 38 réus do mensalão. Segundo ele, o ex-presidente acredita que a pressão da mídia pode ter influência no julgamento. "O Lula acha que uma parte da imprensa já condenou os acusados e faz pressão para que os ministros também condenem." O governador Marcelo Déda não acredita que esse tipo de pressão irá funcionar. "O julgamento da sociedade ao impacto do escândalo do chamado mensalão já foi feito." Depois das homenagens, Lula almoçou com os convidados e se dirigiu, à tarde, para o instituto que leva seu nome, no bairro Ipiranga. Ele ainda manteve reuniões com o governador do Sergipe e com o publicitário e marqueteiro João Santana.