Atualizada às 23h04
BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva prestou um depoimento sigiloso nesta quarta-feira, 16, em Brasília. A oitiva, de cerca de duas horas, ocorreu durante a manhã no prédio da Procuradoria-Geral de Justiça Militar, ramo do Ministério Público da União que apura crimes militares.
O edifício fica no Setor de Embaixadas Norte, local ermo de Brasília. A presença do ex-presidente causou estranheza aos funcionários do órgão, cuja atuação nada tem a ver com investigações em curso envolvendo o nome de Lula ou pessoas de seu entorno.
O ex-presidente foi visto no local por empregados do prédio entre 10h e 12h. A Diretoria-Geral da Procuradoria-Geral de Justiça Militar informou ao “Estado” ter recebido um telefonema do Ministério Público Federal (MPF) na véspera, entre as 19h e 20h, solicitando o uso de uma sala no segundo andar para um “atendimento”. Os servidores do órgão souberam que se tratava de uma oitiva do petista quando o ex-presidente desceu do carro e se dirigiu à sala.
Conforme fonte do governo com acesso às investigações da Operação Lava Jato , Lula foi ouvido como “informante” sobre o esquema de corrupção na Petrobrás. O ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou depoimento dele em inquérito que apura formação de quadrilha por políticos de PP, PT e PMDB para desviar recursos da estatal. Nem o MPF nem a defesa do ex-presidente confirmaram oficialmente, no entanto, sobre qual caso ele falou. O petista tem depoimentos pendentes em ao menos mais duas investigações.
A PF emitiu intimação para Lula depor nesta quinta-feira, 17, em sua sede, em Brasília, sobre suposto esquema de compra de medidas provisórias em seu governo, investigado na Operação Zelotes. Questionada, a Procuradoria da República no Distrito Federal, no entanto, informou que o depoimento desta quarta não foi uma antecipação e, portanto, não está relacionado a esse caso. O Instituto Lula explicou que o ex-presidente não recebeu notificação e, por isso, “não há previsão” de que ele fale.
O filho de Lula, Luís Cláudio Lula da Silva, é investigado na Zelotes porque recebeu R$ 2,5 milhões de um lobista suspeito de atuar no governo Lula e no Congresso para “comprar” MPs, como revelou o Estado em outubro. Os investigadores sustentam que o pagamento pode estar relacionado à edição das normas pelo governo, que concediam incentivos fiscais a montadoras de veículos.
O Ministério da Justiça da Itália também requereu em setembro, mediante carta rogatória ao governo brasileiro, que Lula fosse ouvido sobre sua suposta relação com um empresário italiano. Trata-se de Valter Lavitola, operador de negócios do ex-primeiro ministro da Itália Silvio Berlusconi. Atualmente, ele cumpre pena em Nápoles após ser condenado por tentar extorquir Berlusconi em 5 milhões de euros .
O pedido para que Lula fosse ouvido é baseado numa carta enviada por Lavitola a Berlusconi em 13 de dezembro de 2011. Nela, comenta sobre uma concessão para exploração de madeira na Amazônia que teria adquirido. No texto, o ex-presidente Lula é citado em como tendo atuado para favorecê-lo em uma disputa legal quando vendia parte da concessão para uma segunda empresa, de nacionalidade chinesa. “Ele (Lula) só conseguiu obter da direção da companhia compradora que, com uma sentença da corte arbitral, venha a impor a ales um acordo comigo”, escreveu. Lavitola comenta, no entanto, que naquele momento Lula não estaria colaborando mais.
Na rogatória, as autoridades italianas requerem a oitiva de Lula para esclarecer sobre a suposta relação com Lavitola, além da eventual influência do ex-presidente nas tratativas para a exploração de madeira e sua interferência na disputa legal.
O ex-presidente é investigado pelo MPF em outro inquérito por suposto tráfico de influência em outros países para favorecer a Odebrecht. Porém, Lula já foi ouvido a respeito em outubro. Na ocasião, a oitiva também ocorreu em local secreto.
A Procuradoria-Geral da República e o STF não se pronunciaram.
Procurado, o advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, não respondeu aos telefonemas do Estado. O Instituto Lula informou que não se pronunciaria sobre o conteúdo do depoimento desta quarta.
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