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Labirintos da Política

Opinião|Por que o governo Lula não consegue se aproximar dos evangélicos?

Arrogância, tentativa de imposição das pautas identitárias e desconhecimento da religião, além da falta de interlocutores, são apontados por eles para justificar o distanciamento

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Foto do author Monica  Gugliano

O tema já é recorrente. Pesquisa vai, pesquisa vem, e o governo não consegue engatar um diálogo, por menor que seja, com os evangélicos e se aproximar desse eleitorado. Na semana passada a Quaest divulgou que a desaprovação do governo Lula 3 entre evangélicos continua aumentando, chegando a 62%. E não foi só isso. Análise da mesma Quaest, registrou uma piora na avaliação do governo entre evangélicos que teria sido influenciada pela declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que comparou as ações de Israel em Gaza ao que Hitler fez contra os judeus durante a Segunda Guerra. A fala foi considerada exagerada por 60% dos entrevistados e 69% dos adeptos ao segmento religioso.

O resultado disso é que enquanto o ex-presidente Jair Bolsonaro mantém uma considerável influência no setor que, até hoje, se sente representado pelo ex-capitão, e, especialmente pela mulher dele, Michelle, persiste a desconfiança com o Partido dos Trabalhadores e com o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante reunião ministerial realizada na manhã da segunda-feira, 18. FOTO: WILTON JUNIOR/ESTADÃO Foto: Wilton Junior

Por que? Podem ser enumeradas dezenas de razões. Entretanto algumas são os pilares desse distanciamento. O governo, dizem lideranças do grupo, não conseguiu ter um interlocutor que pudesse conversar e entender as necessidades e angústias de quem, como eles mesmos argumentam, viu a igreja evangélica tomar o lugar do Estado, auxiliando uma população carente de emprego, de escolas, de postos de saúde etc que o governo federal tem ignorado.

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E, pior do que não ter um canal de diálogo, é a sensação relatada por muitos evangélicos de que muitos interlocutores os procuram com uma certa soberba, como se quisessem ser “gurus dos costumes” e tentando impor as pautas identitárias. O evangélico – aliás como nenhum de nós – não quer ser doutrinado.

“Percebe-se uma arrogância, um ar de superioridade, como se fôssemos um povo não civilizado”, diz o pastor Alexandre Gonçalves, de Santa Catarina. Além disso, essas pessoas, acrescenta ele, não conhecem os códigos, os sinais e acaba que nem eles compreendem o grupo e, o grupo, estranha a postura e a linguagem com que são procurados.

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Em uma entrevista recente para a TV Brasil, a deputada e presidente do PT, Gleisi Hoffmann, não poderia ter sido mais infeliz ao tratar do tema. Ao encerrar uma frase simplesmente afirmou: “pastores muitas vezes mentem… e esses vão para o inferno mesmo!”

Em dezembro passado, o governo lançou a campanha “O Brasil é Um Só Povo”. Nos comerciais, há trechos de vídeos em que atores comemoram as iniciativas do governo com frases típicas, por exemplo, do público evangélico, como “Ô, Glória”, “Graças a Deus” e “Graças alcançada, Senhor”. Outra demonstração da tentativa de aproximação foi percebida em viagem do presidente ao Espírito Santo no mesmo mês, quando Lula falou diretamente aos evangélicos.

“Se preparem, porque a gente vai provar que o que resolve o problema de um povo não é a instigação ao ódio, utilizando a boa-fé do povo evangélico para mentir, para dizer que a gente ia fechar igreja, que a gente ia fazer banheiro unissex. Eles têm que saber de uma coisa: se tem um cara nesse país que acredita em Deus, é esse que está vos falando aqui”, destacou.

Ontem, no discurso que fez na reunião ministerial, Lula criticou o uso da religião como instrumento político e referindo-se indiretamente a Bolsonaro afirmou: “A gente não pode compreender a religião sendo manipulada de forma vil e baixa, como está sendo neste País”. Acontece que a maior parte dos evangélicos não se sente manipulado nem usado pelos bolsonaristas que manifestam uma identidade em comum e falam a mesma língua quando necessário.

E se sentem usados pela esquerda que, na opinião de líderes religiosos, busca impor seus conceitos morais, suas ideias sobre a família, o aborto, o uso de drogas, a união entre pessoas do mesmo sexo e outros. “E aí me perguntam: como vamos conquistar o voto evangélico?” diz Gonçalves, ele mesmo respondendo: “Com as mesmas coisas que toda a população quer. Nós não somos diferentes, queremos uma vida digna e melhor para nosso povo”.

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Outro equívoco é que as autoridades estão acostumadas a tratar com as lideranças midiáticas e desprezam os líderes das comunidades locais. O pastor que está em sua pequena igreja tentando resolver o problema de quem não conseguiu pagar o aluguel, está sem emprego ou com problemas com os filhos, como diz Gonçalves, nunca recebe a visita de uma autoridade ou de um representante do governo para conversar sobre os problemas do dia a dia.

Por fim, o desconhecimento do governo sobre os evangélicos é a gota d’agua que entorna esse caldo. “O governo sequer parece entender que os evangélicos não são um bloco monolítico. São muitos grupos que eles precisam conhecer e só assim vão conseguir dialogar”, observa Gonçalves.

Opinião por Monica Gugliano

É repórter de Política do Estadão. Escreve às terças-feiras

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