Macri alega que só dirigiu offshore no papel

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Por Rodrigo Cavalheiro CORRESPONDENTE e BUENOS AIRES

O presidente argentino Mauricio Macri argumentou, por meio de seu porta-voz, que sua participação numa empresa montada na Bahamas entre 1998 e 2009 e revelada neste domingo, 3, "foi circunstancial e ele só cobriu formalmente o cargo na direção". O líder argentino está entre centenas de políticos que aparecem como clientes da empresa panamenha Mossack Fonseca, especializada em abrir companhias em paraísos fiscais.

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Coube ao porta-voz Ivan Pavlovsky explicar ao Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (CIJI) a ligação entre o presidente e a Fleg Trading Ltda, na qual aparecem ainda como diretores o pai e o irmão do presidente, Franco e Mariano. "Essa sociedade tinha como objetivo participar em outras sociedades não financeiras, como investidora ou holding no Brasil. Esteve vinculada ao grupo empresarial da família. Por isso, o senhor Mauricio Macri foi designado ocasionalmente como diretor, sem participação acionária".

Quando a Fleg foi desfeita, em 2009, Macri era prefeito de Buenos Aires. Seu pai construiu uma das maiores fortunas do país e consolidou o sobrenome como símbolo do empresariado nos anos 80 e 90. Franco teve desavenças com o filho quando Mauricio, vítima de um sequestro em 1991, deixou o negócio da família, primeiro para dirigir o Boca Juniors e depois para ser deputado e prefeito. A reconciliação entre os dois ocorreu quando Macri estava prestes a tornar-se presidente, no ano passado. Franco chegou a defender a vitória do kirchnerista Daniel Scioli. Um assessor direto de Macri disse ao Estado que o presidente "figura como diretor, mas nunca soube que estava na empresa e por isso nunca teve lucro".

Macri elegeu-­se prefeito da capital argentina em 2007 e venceu a disputa para presidente em novembro com o compromisso de abrir a economia e combater a corrupção. Nas declarações de bens de 2007 e 2008, quando era prefeito, Macri não revelou sua conexão com a Fleg. O fato de não ser acionista é a justificativa oficial para nunca ter declarado essa participação no imposto de renda. Em nota divulgada no fim do dia, a presidência argentina acrescentou que Macri "nunca teve nem tem participação no capital dessa empresa". Segundo a presidência, a Fleg Tranding apareceu na declaração fiscal do pai do presidente.

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No ano passado, Macri afirmou que deixaria a gestão de sua fortuna para governar o país. Ele declarou antes da eleição ter um patrimônio de 52 milhões de pesos (R$ 12,5 milhões), um aumento de 26% em relação a 2014. Nos últimos anos, para desassociar sua imagem do sobrenome da família, que o impedia de conquistar votos entre os mais pobres, Macri manteve em público um estilo estilo de vida distante da ostentação e exigiu o mesmo de seus ministros.

Embora no exterior a aparição de Macri tenha alcançado grande repercussão, na Argentina foi tratada com cautela. Os principais canais de TV deram pouco espaço ao caso. O C5N, ligado ao kirchnerismo, foi o que deu maior destaque, mas em tom cauteloso. O dono do veículo de comunicação, Cristóbal López, conhecido por sua ascensão nos governos de Cristina Kirchner (2007-2015), é acusado de sonegação e teve parte de seus bens bloqueados este ano. O caso ocupou a manchete dos principais portais, que em geral mencionavam o presidente "entre centenas de argentinos".

Outros envolvidos. Segundo apuração do CIJI, a Mossack teve 570 clientes argentinos, entre eles 28 considerados VIPs. Entre os ligados a Macri está Néstor Grindetti, que foi seu secretário de Fazenda em Buenos Aires e hoje é prefeito de Lanús, na região metropolitana. Ao jornal 'La Nación', que publicou os documentos na Argentina, a defesa do político disse que ele nunca fez investimentos financeiros ou imobiliários com a empresa à qual aparecia ligado. Dos funcionários kirchneristas, o mais conhecido é Daniel Muñoz, secretário particular do ex-presidente Néstor Kirchner (2003-2007), morto em 2010. Ao 'La Nación', ele argumentou que sua função na empresa Gold Black era "figurativa". 

A figura mais conhecida entre os mencionados pela investigação é o jogador Lionel Messi, ligado agora a oito empresas em paraísos fiscais. O atacante do Barcelona enfrenta acusações de sonegação de 4,1 milhões de euros na Justiça espanhola. O julgamento será em maio.

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