BRASÍLIA – Em reunião tensa do Diretório Nacional, nesta segunda-feira, 17, o PT decidiu retomar a eleição direta, com voto dos filiados, para escolha dos presidentes do partido no âmbito nacional, estadual e municipal. Depois de muita discussão, e até bate-boca, a cúpula petista também resolveu suspender, para as eleições de 2026, duas regras que vigoravam na sigla: o limite de três mandatos consecutivos na Executiva Nacional e também em cargos públicos eletivos, como o de deputados. Como o mandato de senador é maior (oito anos), a regra vetava o terceiro mandato seguido.

Os limites impostos serviam para incentivar a renovação partidária, obrigando os mais experientes a ceder espaço para novas lideranças. Mas conveniências políticas deram o tom da proposta, que acabou aprovada.
As mudanças foram uma vitória da tendência Construindo um Novo Brasil (CNB), corrente majoritária do PT, que conta com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente do partido, Gleisi Hoffmann.
Embora a eleição direta para definir o comando do PT conste de seu estatuto, há anos a prática não era adotada. A suspensão ocorreu na esteira de denúncias de fraude e até compra de votos. Em 2017, Gleisi foi eleita por outro modelo, em um Congresso do partido, e reconduzida ao cargo da mesma forma. A volta da eleição da cúpula petista com voto dos filiados foi aprovada nesta segunda-feira por um placar de 61 votos a favor e 24 contra.
As deliberações tiveram debate acirrado entre a CNB, considerada moderada, e as correntes mais à esquerda. Os deputados Reginaldo Lopes e Zeca Dirceu, integrantes da ala majoritária, e o diretor da Fundação Perseu Abramo Valter Pomar, da Articulação de Esquerda, foram contra as alterações.
A proposta de liberar as reeleições de parlamentares e integrantes da Executiva Nacional teve abstenção de Pomar, que bateu boca com o secretário de Comunicação, Jilmar Tatto.
Pomar criticou o fato de a reunião ter sido convocada para debater o regulamento do PED, e não outro assunto, e observou que uma alteração no estatuto para permitir a reeleição de parlamentares e dirigentes partidários só seria válida se arrebatasse ao menos dois terços dos votos.
Gleisi não aceitou a questão de ordem e Tatto afirmou que o estatuto do PT não previa a exigência de maioria qualificada para aprovar mudanças. Pomar rebateu e disse que, de acordo com o estatuto, essas alterações só poderiam ser feitas por um Congresso convocado com essa finalidade.
Por 46 votos contra 31, o Diretório Nacional decidiu votar todas as propostas, o que esquentou a discussão. Em um artigo publicado mais cedo em seu blog, Pomar já havia chamado a ideia de permitir as reeleições de dirigentes da Executiva e também de parlamentares, após três mandatos consecutivos, de “jabuti da CNB”.
“Qual seria a lógica por trás da proposta de adotar a vitaliciedade para dirigentes? Teremos eternos presidentes, eternos secretários-gerais, eternos tesoureiros?“, questionou o dirigente da Articulação de Esquerda no texto. Durante a discussão com Tatto, ele ameaçou até mesmo levar a questão à Justiça.
Não é só o processo de eleição interna do partido, porém, que tem provocado racha entre petistas, inclusive na CNB, a corrente majoritária da legenda. Como mostrou o Estadão, divergências sobre os rumos do governo e do PT se agravaram neste ano.
A disputa promete ficar mais intensa após pesquisa Datafolha indicar que a aprovação de Lula despencou. Além disso, a crise ocorre justamente no momento em que Gleisi está prestes a deixar o comando da sigla para assumir um ministério no Palácio do Planalto.
Setores do PT avaliam que o governo precisa dar uma “guinada à esquerda” para se reaproximar dos eleitores perdidos, que se desencantaram com Lula 3, como os pobres, os moradores do Nordeste e as mulheres. A ideia é defendida até mesmo por uma ala da CNB, que pretende insistir em mudanças na política econômica levada a cabo pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.