Atribui-se a Mark Zuckerberg, CEO da Meta, a frase “avance rápido e quebre coisas”, que viria a simbolizar o espírito da empresa de inovar velozmente, mesmo que isso chacoalhasse as estruturas e viesse a causar certos erros e incompreensões pelo caminho.
As redes sociais, como as detidas pela Meta, revolucionaram a forma pela qual nos comunicamos, transformando atividades privadas em performances públicas em busca de engajamento. Ao mesmo tempo, a customização em massa do que se vê nas redes criou fraturas no sentimento de realidade compartilhada, acelerando a formação de bolhas e o espalhamento de campanhas de desinformação.
Regulador e regulado, vez ou outra, se olham no espelho. No ímpeto de combater os danos causados pela ascensão das redes sociais, governantes, legisladores e juízes também correm o risco de avançar rápido e quebrar coisas, além de reproduzir dinâmicas típicas das redes.

Pelo mundo afora se vê autoridades correndo para se manifestar online sobre cada novidade tecnológica, anunciando medidas de ocasião. Existe uma linha que divide o ímpeto de prestar contas e a busca por exposição com frases irônicas, indiretas ou memes. Tudo em nome do engajamento.
O debate sobre regulação das redes acontece nas redes. E é aqui que o Brasil possui uma trajetória única, aliando sua posição de vanguarda nas discussões sobre regulação e governança da Internet, com as experiências recentes de eleições cada vez mais digitais (que trazem a tecnologia para o centro dos debates), a invasão de prédios públicos e um cabo-de-guerra entre o dono de uma rede social e as autoridades nacionais.
Nenhum país possui essa bagagem para desempacotar. Por isso é até natural que os Três Poderes da República estejam, cada qual do seu jeito, buscando responder aos anseios derivados desse cenário. Mas vale calibrar as expectativas e compreender exatamente o que cada autoridade pode e deve fazer, bem como as consequências de cada solução.
No Poder Executivo são estudadas propostas para municiar o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) com mais ferramentas para supervisionar a atuação das empresas de tecnologia. A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) também vem se dedicando cada vez mais ao tema. As duas vertentes podem ser aliadas, já que o controle antitruste beneficia o livre mercado, aumentando a concorrência e o poder de escolha do consumidor.
No Congresso Nacional, o debate sobre uma proposta legislativa para regular as redes sociais e combater a desinformação (PL 2630/2020) acabou procurando tratar de tantos temas que tornou difícil a formação de consenso.
O Brasil fez história quando, em 2014, aprovou o chamado Marco Civil da Internet, uma lei federal que protege a privacidade e os dados pessoais, a liberdade de expressão nas redes e dispõe sobre a responsabilidade das plataformas.
De lá para cá, a lei deveria ter sido complementada de forma a acompanhar as transformações mais impactantes das tecnologias digitais. Criar estímulos para que as plataformas façam uma moderação de conteúdo transparente, informativa e coerente é uma delas. Na ausência de uma decisão sobre o assunto no Congresso, sobrou para o Supremo Tribunal Federal.
O STF deve, no julgamento de duas ações sobre o regime de responsabilidade civil das plataformas digitais, impor alterações na forma como o tema foi previsto no Marco Civil. Resta saber qual solução vai sair do Supremo, já que os três votos proferidos até o momento apresentam divergências importantes.
O ministro Toffoli propugnou por uma responsabilidade automática das plataformas na medida em que um conteúdo danoso foi publicado (responsabilidade objetiva). A lista de conteúdos incluiria elementos tão diversos como terrorismo e infração a direitos autorais. O ministro Barroso apontou para a existência de um dever de cuidado por parte das empresas, que seria avaliado como um todo e não a partir de cada caso específico.
O ministro Fux, por sua vez, aventou um regime de responsabilidade a partir da falha em remover conteúdos após notificação (responsabilidade subjetiva), inclusive para danos à honra. Essa medida, caso aprovada, faria com que autoridades retratadas em matérias na imprensa e demais investigados pudessem ter conteúdos removidos das redes mediante simples notificação, impactando severamente a liberdade de expressão.
O senso de urgência em regular as redes sociais é palpável. Talvez as autoridades possam fazer melhor do que avançar rápido e quebrar coisas se escutarem uma outra frase, dita não por Mark Zuckerberg, mas por um de seus ídolos. Fascinado com a cultura clássica, Zuckerberg já se revelou fã do imperador Augusto. A ele é atribuída a frase “apressa-te devagar” (festina lente). Parece contraditório, mas a lição é clara: urgência e prudência andam lado a lado. Se os dois imperativos forem observados é até possível avançar sem quebrar o que é mais precioso.