A Câmara Municipal de São Paulo aprovou nesta sexta-feira, 20, uma série de alterações no mapa de zoneamento de quadras e endereços específicos da cidade, em bairros como Cidade Jardim, Santana, Alto de Pinheiros e outros. Grande parte das mudanças retira restrições e traz parâmetros mais flexíveis, como a liberação de prédios em um trecho de vizinhança antes restrito a casas.
Como o Estadão antecipou, essas mudanças foram incluídas como emendas a um projeto de lei de seis anos atrás, resgatado pelos vereadores no mês passado. O texto original não fazia mudanças na prática, pois sua proposta inicial já está em vigor desde o começo do ano, após a revisão da Lei de Zoneamento.
A criticada emenda da criticada mudança na Vila Nova Conceição (Ruas João Lourenço, Domingos Leme, Professor Filadelfo Azevedo e Caçununga) foi retirada e não submetida a voto. Outras três também não foram apreciadas, que envolviam bairros como Itaquera e São Mateus.
Foram 41 votos favoráveis e 10 contrários ao projeto de lei. As emendas foram votadas em bloco, com 41 a favor, dois contra e uma abstenção. A sessão ocorreu na véspera do recesso do Legislativo, de forma híbrida, com grande parte dos vereadores presentes de forma virtual. O projeto irá para sanção do prefeito Ricardo Nunes (MDB), que poderá mantê-lo integralmente ou vetá-lo em parte ou por completo.
Ao todo, foram aprovadas 34 emendas, algumas veiculadas no mesmo dia da votação final. O Nunes afirmou na quinta-feira, 19, que há “grande chance” de vetos a mudanças no zoneamento e que isso já foi avisado aos vereadores. Em abril, contudo, parte de vetos a outras alterações na mesma lei foram derrubados pela Câmara em votação no plenário, de modo que as mudanças entraram em vigor.
O pacotão de projetos com votação nesta sexta envolve também alterações no Plano Diretor e em outras normas urbanísticas da capital. Como o Estadão revelou, a nova versão da proposta que facilita a expansão de um aterro sanitário incluiu o fim do limite de barulho no entorno de shows e grandes eventos na cidade e a prorrogação da anistia a imóveis irregulares por mais um ano, dentre outros pontos. Esse projeto também foi aprovado.
Com emendas e textos substitutivos divulgados a dias e horas da votação, a maratona de projetos é criticada por parte dos especialistas. Isso porque reúne alterações significativas na legislação municipal veiculadas a dias da deliberação final e, também, porque parte das propostas está inserida em projetos inicialmente de mudanças pontuais. Em anos anteriores, essa prática deu margem para judicializações, com o entendimento de que seriam “jabutis”.
Na tribuna, o vereador Celso Giannazi (PSOL) chamou de “dia triste na Câmara Municipal” e classificou as mudanças como retrocessos. A discussão do projeto foi na quarta-feira, 18. Nesta sexta, a manifestação foi aberta apenas para lideranças de partidos (os demais não se manifestaram no palanque).
O líder do governo, Fabio Riva (MDB), destacou que a Prefeitura não tem compromisso de sanção e fará análise “com rigor” das propostas. “Serão analisadas com a cautela de praxe, tecnicamente”, completou.
Procurada, a presidência da Câmara não se manifestou. O Legislativo tem destacado que a apresentação de emendas e substitutivos é prerrogativa dos vereadores. Além disso, diz que ao menos grande parte dessas propostas foi publicada no Diário Oficial.
A pauta reúne projetos enviados pela gestão Nunes, assim como antigos projetos de lei de vereadores (alguns de seis anos atrás), com alterações apresentadas ou em discussão. A reta final das votações também é a despedida do presidente da Câmara, Milton Leite (União Brasil). O vereador tem conseguido conciliar a aprovação de diversos projetos do Executivo nos últimos anos, até mesmo com votos de parte da oposição. Por enquanto, é incerto o nome de quem o substituirá.

A depender da nova classificação, com as atividades e tipos de construções permitidos, um novo zoneamento tem impacto também no valor do imóvel e interesse do mercado. Essa lei é uma das mais importantes da cidade e ligada a grande parte da verticalização e outras transformações evidentes nos últimos anos.
Veja abaixo algumas das principais mudanças propostas nas emendas:
Cidade Jardim
Outra emenda de Marlon Luz propõe transformar a ZCOR de uma quadra da Avenida Alcides Sangirardi, nas imediações da Marginal do Pinheiros, na Cidade Jardim, em Zona Mista (ZM). Enquanto o atual zoneamento é voltado a ser um “cinturão” comercial de baixa estatura no entorno de uma área antes restrita a casas, a nova proposta prevê aval a mais tipos de usos e construções de até 28 metros de altura.
A justificativa faz referência à extinção de diversas quadras de ZER naquele entorno, cuja mudança havia sido vetada por Nunes, mas depois foi derrubada pelos vereadores, estando em vigor desde abril.
Além disso, horas antes da votação, mais uma emenda do vereador para aquele entorno foi apresentada. A proposta é voltada a quadras da Avenida das Acácias, da Rua Taques Alvim e da Rua Jaguanambi, que deixariam de ser Zona Exclusivamente Residencial (ZER) e passariam a ser Zona Corredor (ZCOR). Dessa forma, passaria de uma área restrita a casas, para liberar alguns tipos de estabelecimentos comerciais e de serviços de baixa estatura (até cerca de 10 metros).
Como o Estadão revelou, há ao menos uma incorporadora com planos para a região. Além disso, essa mudança no zoneamento — que abrange o entorno do Jockey Clube — tem sido questionada por uma associação local.
Alto de Pinheiros
Outras propostas mudam duas Zona Corredor do distrito Alto de Pinheiros, que passariam de ZCOR-2 para ZCOR-3, a qual permite mais tipos de comércios e serviços e de maior porte. As emendas envolvem imóveis específicos da Avenida Professor Fonseca Rodrigues, número 2026, e um único imóvel da Avenida Queiroz Filho, no nº 923, na divisa com a Vila Leopoldina.
A primeira proposta é do vereador Marlon Luz, enquanto a segunda é de Rinaldi Digilio (União Brasil), também não reeleito para o próximo mandato. Ambos apresentaram a mesma justificativa: os imóveis seriam “maiores do que a média da região” e têm localização de fácil acesso e próxima da Marginal do Pinheiros.
Na revisão do zoneamento, diversas quadras do distrito também passaram por alteração, em que corredores do cinturão comercial foram transformados em Zona de Centralidade, que permite prédios de até 48 metros. Como o Estadão mostrou, a alteração facilita a construção de um megatemplo no entorno, mas foi suspensa liminarmente pela Justiça.
Santana
Emenda do vereador Marcelo Messias (MDB) propõe mudanças em 24 quadras da Avenida Braz Leme, em Santana, na zona norte, perto do Campo de Marte. Proposta semelhante havia sido aprovada pelos vereadores em julho, mas foi depois vetada por Nunes, em janeiro.
A emenda altera o zoneamento de Zona Eixo de Estruturação da Transformação Metropolitana Previsto (ZEMP) para Zona de Centralidade (ZC). Dessa forma, a altura máxima de novas construções aumentaria de 28 metros para 48 metros.
Embora a proposta agora fixe padrões mais flexíveis, a classificação atual já tende a fixar parâmetros ainda maiores. Isso porque o ZEMP está vinculado à elaboração do Plano de Intervenção Urbana (PIU) que Arco Tietê, o qual prevê obras de infraestrutura para aquele entorno e a definição de novas regras para cada quadra.
À época, o veto da Prefeitura destaca que alterações nos padrões daquele entorno dependem do futuro PIU. Também destacou que a “mudança de zoneamento proposta não é oportuna, devendo ser realizada no bojo, e como resultado, do planejamento técnico específico em curso”.
Na emenda, o vereador justifica que a população já fez passeata contra a implantação de possível corredor de ônibus no entorno. Também diz que “a referida avenida possui o canteiro central com maior quantidade de árvores da região”.
Vila Andrade
Há também uma emenda que prevê a retomada de trechos de zona restrita a casas (ZER) de quatro quadras nas Ruas Conto Popular, Jaime Costa e General Pereira da Cunha, no distrito Vila Andrade. Esses endereços haviam perdido esse zoneamento em 2016, quando se tornaram Zona Mista (ZM), o que permite mais usos e edifícios de até 28 metros.
A proposta de mudança para um zoneamento mais restritivo (permite apenas casas) é do vereador Rubinho Nunes (União Brasil), presidente da Comissão de Política Urbana da Câmara. Na emenda, justifica que “os imóveis compreendidos pelas quadras indicadas fazem parte de loteamento residencial caracterizado como tal até os dias atuais”.