Campo de Marte tem histórico de acidentes de avião: qual vai ser o futuro do aeroporto?

Ao menos 127 voos saídos do aeródromo da zona norte de São Paulo tiveram acidentes e incidentes na última década; ministério diz que ‘não há, no momento, qualquer tratativa para desativação’

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Foto do author Priscila Mengue
Atualização:

A queda de um avião de pequeno porte na Avenida Marquês de São Vicente na manhã desta sexta-feira, 7, voltou a chamar a atenção para o histórico de ocorrências do Aeroporto do Campo de Marte. O aeródromo fica localizado em Santana, na região norte da cidade de São Paulo, com casas, prédios e estabelecimentos de comércios e serviços no seu entorno.

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Estima-se que o acidente ocorreu cerca de um minuto após a decolagem, com duas mortes confirmadas. A Associação Brasileira de Aviação Geral (Abag) tem reiterado que casos como esse seriam raros e a operação do Campo de Marte é segura e importante para a capital paulista (confira mais sobre o posicionamento ao longo do texto).

Dados do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) apontam 127 ocorrências em voos com origem no aeródromo nos últimos dez anos, das quais:

  • 20 foram acidentes;
  • 11 incidentes graves;
  • 96 incidentes.

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No mesmo período, foram registradas 140 ocorrências com destino ao Campo de Marte, das quais:

  • 21 acidentes;
  • 9 incidentes graves
  • 110 incidentes.

Em alguns casos, como em treinamentos, o local era a origem e o destino do voo. De acordo com a Força Aérea Brasileira (FAB), um incidente afeta a segurança, mas não tem danos substanciais ou feridos graves. Já o acidente é quando ocorre danos substanciais à aeronave, registro de feridos graves ou mortes.

O balanço inclui ocorrências com pequenos aviões e helicópteros registradas na capital paulista e, também, em outros municípios, a depender da fase do voo em que ocorreram. Uma parte envolve a área do Campo de Marte e seu entorno, como casos em que a aeronave invadiu a Avenida Braz Leme — uma das principais vias da vizinhança — e alguns registros de colisões e quedas contra casas, com vítimas fatais.

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Avião caiu sobre residência nas imediações do Campo de Marte em 2018 Foto: Alex Silva/Estadão - 30/11/2018

A discussão sobre a desativação do aeroporto da capital paulista ocorre há décadas. Além de táxi aéreo e aviação executiva, também recebe atividades de treinamento e instrução de pilotos. Procurado pelo Estadão, o Ministério de Portos e Aeroportos, por meio da Secretaria Nacional de Aviação Civil, informou que “não há, no momento, qualquer tratativa para desativação do Aeroporto de Campo de Marte”.

Não há qualquer previsão de que ocorrerá uma desativação futura: em 2023, o aeródromo foi concedido pela União à Pax Aeroportos (ligada ao Grupo XP) por 30 anos, até março de 2053.

A concessionária afirmou, em nota, que opera “em rigorosa conformidade com as normas e regulamentos das autoridades aeronáuticas, responsáveis também por aprovações de voos, licenciamento e fiscalização das aeronaves”. Afirmou ainda que “os investimentos previstos no contrato de concessão estão sendo executados”. Até o fim deste ano, a previsão é de que R$ 115 milhões sejam investidos em obras de modernização da infraestrutura do aeroporto.

Recentemente, a Prefeitura assinou um contrato de concessão para a criação de um parque municipal em uma área verde junto ao aeroporto, resultante de um acordo com o governo federal. Também foi anunciada a construção de um museu aeroespacial em outra parte do espaço, assim como as Forças Armadas seguem com a obra de um colégio militar.

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De acordo com dados do Cenipa, foram registradas um total de 26 mortes nos 20 acidentes de voos com origem no Campo de Marta em uma década. Os casos envolviam aviões (13 ao todo) e helicópteros (sete). Já, entre os voos com esse destino, foram 12 óbitos em 21 acidentes, dos quais 14 com aviões e sete com helicópteros (relembre os principais acidentes mais abaixo).

Um dos casos recentes de maior repercussão ocorreu em novembro de 2018, quando uma aeronave com destino a Jundiaí, no interior paulista, caiu logo após decolar, atingindo uma residência nas imediações da Avenida Braz Leme, a metros do aeroporto, com o óbito do piloto e do copiloto. Casas vizinhas e carros estacionados também foram afetados.

Outra ocorrência ainda mais grave foi registrada em março de 2016, quando outro avião com destino ao Rio de Janeiro não ganhou altura na decolagem e colidiu contra uma casa, a 370 metros da cabeceira da pista. O piloto e os seis passageiros morreram. Quatro veículos ficaram carbonizados.

As ocorrências no Campo de Marte ocorreram em diferentes fases da operação das aeronaves, como durante o voo, o taxiamento, a decolagem, o pouso e a aproximação. Entre as ocorrências, a maioria envolveu falha ou mau funcionamento do sistema ou do controle da aeronave e colisões com aves.

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No ano passado, o País registrou 175 acidentes, 44 deles com registro de mortes. A última década teve 5.906 incidentes, 687 incidentes graves e 1.579 acidentes.

Concessão conjunta com Jacarepaguá estima aumento de 40% em passageiros

No estudo de viabilidade da concessão, a previsão era de que o bloco formado por Campo de Marte e Jacarepaguá aumentasse em 40% o número de passageiros. A projeção é de que vá de 0,5 milhão de passageiros anuais, então estimados para 2023, para 0,7 milhão, em 2052. Para tanto, são exigidas algumas intervenções obrigatórias.

Hoje, o Campo de Marte opera das 6h às 23h. No ano passado, o aeroporto recebeu de 4,2 mil a 5,5 mil voos por mês, a depender do período do ano. Foi o 14º aeródromo mais movimentado do País em 2023 (à frente de diversas capitais, como Fortaleza, Belém e Florianópolis), com 59,2 mil voos, dos quais 30 mil foram pequenos aviões e 22,6 mil eram helicópteros.

Há anos, diferentes prefeitos, como Gilberto Kassab (PSD), Fernando Haddad (PT) e João Doria (então no PSDB), dentre outros, tentaram acordos com a União pela posse definitiva do terreno e a desativação do aeroporto. Um dos maiores impasses foi a dificuldade de absorção da demanda por outros terminais.

A recente concessão prevê, inclusive, a remodelação do espaço e outras intervenções de infraestrutura, como a reforma da pista e do terminal de passageiros. A concessionária assumiu o aeroporto (junto ao de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro) em junho de 2023.

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CEO da Abag, Flavio Pires classifica como muito raros o número de acidentes envolvendo o Campo de Marte e a aviação brasileira em geral, utilizando como comparativo o volume muito maior de casos com outros meios de transporte. “As pessoas que não conhecem se assustam, mas a aviação é muito segura”, diz.

Para ele, o debate sobre a desativação está superado, “coisa do passado”, por causa do acordo entre Prefeitura e União e da concessão. Também avalia que as intervenções previstas (que devem facilitar pousos e decolagens em diferentes condições climáticas) podem ampliar a variedade de modelos que vão operar no Campo de Marte. “Vai ser um aeroporto espetacular, e dotado dos dispositivos de segurança que a tecnologia permite”, defende. “Não poderia ficar sem esse aeroporto. Imagina se tudo fosse parque?”, completa.

Além disso, ele considera que restrições durante as obras em Congonhas devem gerar um “êxodo” de uma parte das aeronaves para o aeródromo da zona norte. “Seria o caminho natural. Está em São Paulo. As outras opções (como São Roque e Jundiaí) estão a mais de 1h30 (de carro), é uma dificuldade adicional”, explica.

Confira algumas das principais ocorrências envolvendo o Campo de Marte na última década

Julho de 2020

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Aeronave vinda de Ubatuba precisou arremeter durante o pouso, mas, sem ganhar altura suficiente, colidiu contra árvores localizadas no final da pista. Na sequência, bateu contra o solo na Avenida Braz Leme. O piloto morreu.

Julho de 2019

Avião de pequeno porte que decolou de Bragança Paulista com destino ao Campo de Marte caiu sobre uma área rural, atingindo parcialmente uma casa, em Atibaia, também no interior. O voo era de treinamento, com dois pilotos a bordo, que não sobreviveram. A aeronave ficou destruída.

Novembro de 2018

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Aeronave com destino a Jundiaí, no interior paulista, caiu logo após decolar, atingindo uma residência nas imediações da Avenida Braz Leme, com o óbito do piloto e do copiloto. Casas vizinhas e carros estacionados também foram afetados. Entre os feridos, estavam pedestres que passavam pelo local e pessoas que estavam dentro das residências atingidas pela aeronave. Ao menos seis pessoas foram levadas a hospitais da cidade.

Julho de 2018

Avião de pequeno porte vindo de Videira, em Santa Catarina, caiu quando se aproximava do aeroporto paulistano. Colidiu, então, contra o solo, o que resultou na morte do piloto. Os seis passageiros ficaram feridos, parte deles precisou ser retirada das ferragens.

Março de 2016

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Avião com destino ao Rio de Janeiro não ganhou altura na decolagem e colidiu contra uma casa, a 370 metros da cabeceira da pista. O piloto e os seis passageiros morreram. Quatro veículos também ficaram carbonizados.

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