SÃO PAULO - Começou o segundo dia do júri de Elize Matsunaga, acusada de matar e esquartejar o ex-marido, Marcos Kitano Matsunaga, herdeiro da Yoki, em 2012. O delegado Mauro Gomes Dias, que atuou na investigação e chegou a interrogar a ré na época, depõe neste momento no Fórum Criminal da Barra Funda, na zona oeste da capital. Ele entrou no plenário às 9h54.
Primeiro dia. Sentada no banco dos réus, Elize chorou no primeiro dia de júri. Lembrava muito pouco a jovem bonita, que aparecia no catálogo de um site de acompanhantes, ou a mulher que se casou com um dos empresários mais ricos de São Paulo. Parecia mais velha do que seus 34 anos.
Com os braços tensos e os dedos agitados, a impressão era de estar acuada. Olhava para baixo. Como se a postura tentasse dizer o contrário do que já confessou à polícia e à Justiça: foi ela quem matou e esquartejou em sete partes o ex-marido.
Em um dos júris mais aguardados dos últimos tempos, o fórum foi tomado por estudantes de Direito. No primeiro dia de julgamento, nenhuma informação bombástica. Acusação e defesa tentaram ordenar, cada qual à sua maneira, as primeiras peças do quebra-cabeça sobre o que aconteceu no dia 19 de maio de 2012, um sábado. Para o Ministério Público Estadual (MPE), um crime premeditado, cruel e motivado por vingança e um seguro de vida de R$ 600 mil. Para os advogados de Elize, uma reação às humilhações e violências impostas pelo marido da ré.
Elize chorou antes mesmo da entrada da primeira testemunha no plenário. Ao longo do dia, o lenço que segurava nas mãos foi usado para enxugar as lágrimas em pelo menos cinco oportunidades. Ela vestia um terninho preto, camisa azul e sapatilhas. O cabelo loiro, mal amarrado, caía sobre o ombro direito. Nervosa, bebeu água com açúcar antes de os jurados terminarem a leitura das peças do processo.
Convocada pela assistência de acusação, a babá Amonir Hercília dos Santos, que trabalhou por cerca de dois meses no apartamento dos Matsunaga e cuidava da filha do casal aos fins de semana, foi a primeira a testemunhar. Entrou no plenário às 12h32 e falou por pouco mais de uma hora. Em vários momentos, alegou não lembrar dos fatos e teve a fala confrontada com declarações que fez anteriormente.
Apesar do pouco tempo de serviço na casa, Amonir é considerada uma testemunha importante porque esteve no tríplex do casal na manhã após o assassinato. Segundo as investigações, ela cuidou da filha dos Matsunaga no mesmo momento em que Elize esquartejava o marido em um quarto de baixo. Aos jurados, a babá disse que Elize não mostrou nenhum comportamento anormal naquele dia. "Ela me recebeu de pijama, era um dia de trabalho como outro." Para a promotoria, um sinal da frieza da ré.
A testemunha, no entanto, deixou claro ter pouco contato com a intimidade do casal. Após questionamento do promotor José Carlos Cosenzo, disse nunca ter presenciado brigas e que a patroa era uma pessoa reservada. "Mas a senhora ouviu o Marcos gritando com a Dona Elize alguma vez?", questionou. "Não, nunca."
Ao fim do seu depoimento, os advogados de defesa perguntaram se Elize era uma "boa mãe". "Sim, cuidava bem da criança", respondeu a babá. Nesse momento, Elize desatou a chorar.
Medo. Na volta do almoço, às 15h30, foi a vez de Mauriceia José Gonçalves dos Santos, a babá fixa da criança e mãe de Amonir. Foi ela quem acompanhou Elize na viagem ao Paraná, pouco antes do assassinato. Segundo a acusação, a viagem teria sido planejada para flagrar a traição do marido, que ficou em São Paulo.
Mauriceia confirmou que, durante a viagem, Elize trocou telefonemas com o detetive particular Willian Coelho de Oliveira, contratado pela ré para filmar a infidelidade de Marcos. A babá também informou que Elize parou em um armazém para comprar uma serra elétrica horas antes de Marcos ser morto.
A pedido da testemunha, o depoimento foi prestado sem a presença de Elize. "Fiquei com medo porque ela deve achar ruim eu ter falado da serra", afirmou. Em depoimentos anteriores, a babá já havia dito: "Se ela fez isso com o marido, imagina comigo".
O instrumento de corte teria sido transportado dentro da única mala levada na viagem. Na noite do crime, Mauriceia foi dispensada pela patroa após perguntar se precisaria guardar a serra. "Pode deixar que amanhã sua filha arruma", teria dito Elize na ocasião. Amonir negou que tenha encontrado a serra no dia seguinte. Disse apenas que achou as roupas da crianças jogadas sobre a cama.
Segundo Mauriceia, Elize era tratada por Marcos "como uma princesa", até poucos meses antes do crime. Depois, é que viriam as brigas diárias. "Eu não ouvia as discussões. Quando começava, pegava a baixinha e descia pro playground."
Nervosa, a babá passou mal durante o depoimento e precisou receber atendimento médico. Quando voltou ao plenário, houve bate-boca entre a defesa, que reclamou das interrupções do promotor, e acusação. "Gente minha não serra os outros em pedaços", disse Cosenzo. "Você precisa respeitar o direito de ampla defesa", rebateu a advogada Roselle Roglio. O juiz Adilson Paukoski Simoni suspendeu o julgamento por dez minutos.
Apesar de não informar detalhes sobre a intimidade do casal, as babás serviram para a promotoria tentar mostrar que Marcos não agia de forma violenta com Elize e até demonstrava arrependido após discussões. A promotoria também explorou a reação da ré, que teria demonstrado certa frieza, na época em que o marido era dado como desaparecido. Já para a defesa, os relatos demonstram que Elize era vítima de violência e humilhação, e cometeu os crimes em um momento de calor.
Detetive. A última testemunha ouvida foi o detetive Oliveira, pago por Elize para seguir o marido enquanto ela estava no Paraná. Ele filmou a traição de Marcos, flagrado em companhia de uma morena em dois restaurantes e um flat. "Avisei tudo a ela em tempo real, por telefone", disse.
Segundo ele, a reação de Elize foi típica de quem descobre uma traição. "Ela ficou bastante chorosa, nada diferente das minhas outras clientes", declarou. "Só me causou estranheza quando propus localizá-lo, e ela negou."
Oliveira relatou que Elize só assistiu às imagens da traição na segunda-feira, portanto depois de cometer o crime. Também disse que, antes de contratá-lo, ela tinha já certeza de que era traída. "Ela me passou uns três, quatro nomes de mulheres."
Na última pergunta, foi questionado por um jurado se o trabalho dele havia incentivado o assassinato. Oliveira disse que não. Elize deu início ao mais longo dos choros, que continuou até o plenário ficar vazio.
Conselho de Sentença. O júri de Elize Matsunaga é formado por quatro mulheres e três homens, a maioria com mais de 40 anos. Para a composição do Conselho de Sentença, o MPE vetou três mulheres. A defesa, três homens. A acusação negou que tenha feito as escolhas sob a hipótese de que mulheres poderiam aceitar a traição como justificativa do crime. "Foi coincidência", disse o advogado Luiz Flávio D'urso.
A defesa abriu mão de duas testemunhas: o reverendo Renè Henrique Gotz Licht e o delegado Jorge Carrasco, que era diretor do Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) na época do homicídio.
Elize é julgada por homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, meio cruel e impossibilidade de defesa da vítima), além de destruição e ocultação de cadáver. Ao todo, 20 testemunhas serão ouvidas.