Uma emenda que permite a construção de prédios em vizinhanças hoje restritas a casas foi novamente apresentada na Câmara Municipal de São Paulo nesta terça-feira, 10. A proposta é semelhante a uma outra feita cinco meses atrás e alvo de críticas de associações de bairro. Posteriormente, acabou vetada pela gestão Ricardo Nunes (MDB).
A expectativa é de que a votação ocorra na semana que vem. Semelhante à proposta vetada em julho, a mudança flexibilizaria a legislação de modo a liberar outros tipos de construções e usos (como comércios e serviços) em vizinhanças hoje restritas a casas, as Zonas Exclusivamente Residenciais (ZERs).
Além disso, remove o trecho da lei que impede prédios altos nessas vizinhanças, de modo que poderiam se tornar “eixo de verticalização” (áreas perto de metrô, trem e corredor de ônibus, com incentivos para construção de edifícios).
A emenda é de autoria do vereador Isac Félix (PL), o mesmo que propôs outras alterações em ZERs em projetos de lei neste ano e no ano passado. Procurado pela reportagem, não se manifestou até o momento. Félix também foi o parlamentar que propôs a liberação de um megatemplo evangélico em Alto de Pinheiros, proposta barrada por liminar na Justiça.
A emenda é proposta para o projeto de alteração no Plano Diretor, da gestão Ricardo Nunes (MDB), voltado originalmente a facilitar a expansão de um aterro na zona leste.
Na prática, a emenda não faria uma mudança automática em todas as ZERs. Para tanto, é preciso que essas zonas sejam alteradas no mapa da Lei de Zoneamento — que também está em discussão na Câmara, por meio de outro projeto, o qual também deve receber emendas e texto substitutivo até a aprovação final, em meio a uma maratona de votações.
Dentre as ZERs perto de metrô e trem, estão trechos dos distritos Alto de Pinheiros, na zona oeste, e Morumbi, na sul. Esse tipo de zoneamento também está em mais vizinhanças da cidade, como no chamado “Brooklin Velho” e na Chácara Flora, na região sul, no City Lapa e Pacaembu, na oeste, e em parte da vizinhança do Horto Florestal, na norte, dentre outras.
Em julho, na justificativa da emenda, o vereador havia mencionado o Estatuto da Cidade e defendido a “universalização do acesso aos benefícios e às comodidades da vida urbana por parte de todos os cidadãos, seja pela oferta e uso dos serviços, equipamentos e infraestruturas públicas”. Ao vetá-la, a Prefeitura apontou que fazia “profunda alteração” no Plano Diretor.
Embora a lei atual fale na manutenção dos padrões restritivos em ZERs, algumas mudanças foram feitas no último ano em trechos pontuais. Entre os exemplos, estão quadras do entorno do Jockey Clube, na Cidade Jardim, e cerca de 14 lotes do Pacaembu.
O zoneamento e o Plano Diretor fixam regras de diversos aspectos do dia a dia — como limite de barulho, altura máxima das construções e tipos de comércios permitidos. Também delimitam onde ocorrerão as principais transformações, como por meio de incentivos a mais apartamentos perto de metrô e a indicação de novos parques. As duas leis passaram por revisão no ano passado e “revisão da revisão” em julho.
No geral, a classificação como ZER envolve áreas valorizadas pelo mercado imobiliário, de classes média e alta na cidade. Enquanto o limite de altura em uma zona desse tipo é de 10 metros, não há gabarito máximo em um eixo de verticalização, por exemplo.
Dentre as quadras que poderiam ser mais impactadas pela emenda, pela proximidade com eixo de verticalização, estão entornos das Estações São Paulo-Morumbi e Vila Sônia, da Linha 4-Amarela, da Estação Sumaré, da Linha 2-Verde, e da Estação Cidade Universitária (em Alto de Pinheiros), da Linha 9-Esmeralda.
Também poderia incidir futuramente sobre vizinhanças onde há expectativa de obras de metrô, monotrilho e trem, como da possível Estação Cerro Corá, da expansão da Linha 2-Verde à oeste, e da Estação Indianópolis, da Linha 20-Rosa.
Especialistas ouvidos pelo Estadão avaliam que alterações nas zonas exclusivamente residenciais estão em desacordo com as diretrizes principais do Plano Diretor. Também consideram que uma mudança dessa magnitude poderia ser discutida na cidade, mas apenas após estudos e discussão em diversas audiências públicas e em órgãos colegiados da Prefeitura. Isto é, não por meio de emenda divulgada há dias da votação.
Além disso, especialistas criticaram a nova rodada de alterações na legislação urbanística meses depois da “revisão da revisão”. Também apontaram o histórico de alterações significativas via emenda e texto substitutivo em projetos originalmente de menor impacto na cidade, o que dificultaria o acompanhamento pela sociedade civil.
Onde ficam as ZERs?
É possível visualizar todas as ZERs paulistanas por meio do mapa interativo do zoneamento desenvolvido pelo Estadão. Elaborado com microdados disponibilizados pela Prefeitura, permite a busca por endereço e a seleção por tipos específicos de zona. Confira abaixo: